Falta de repasses faz Mocidade, Mangueira e São Clemente cancelarem ensaios
![Desfile da Beija-Flor, campeã do Carnaval 2018 do Rio de Janeiro - Clever Felix/Brazil Photo Press/Folhapress](https://conteudo.imguol.com.br/c/entretenimento/b9/2018/02/14/desfile-da-beija-flor-campea-do-carnaval-2018-do-rio-de-janeiro-1518636979118_v2_900x506.jpg)
Em uma crise financeira sem precedentes, as escolas de samba do Grupo Especial do Rio de Janeiro vivem dias de incerteza por conta da dificuldade em ter os repasses oficiais e da fuga de patrocinadores. Nos últimos dias, três escolas anunciaram a suspensão provisória de atividades em suas quadras: Mocidade Independente de Padre Miguel, São Clemente e Estação Primeira de Mangueira. A Mocidade foi ainda mais radical e anunciou que não se fará presente na festa de lançamento do CD, na próxima segunda-feira (03), na Cidade do Samba.
Com um relacionamento complicado com o prefeito Marcelo Crivella desde o ano passado, quando o governo municipal resolveu cortar R$ 1 milhão da subvenção de cada escola, a Liesa tem encontrado dificuldades para organizar o próximo desfile. Após várias tentativas, até hoje os dirigentes das escolas ainda não foram atendidos pelo prefeito. A cessão da Passarela do Samba, que normalmente ocorre em setembro, se deu com quase dois meses de atraso - o que prejudicou o cronograma de venda de camarotes e frisas e postergou ainda mais o faturamento das agremiações.
Nos últimos dias, duas notícias agravaram ainda mais a situação. Os supermercados Guanabara, uma das maiores redes da cidade, que tradicionalmente patrocinavam os desfiles e detinham um grande camarote na Sapucaí, anunciaram a sua saída do Carnaval. E a Uber, que no ano passado, via edital da Riotur, complementou as verbas das escolas em R$ 500 mil, informou que não investirá neste ano. Comenta-se que a matriz americana não teria ficado nada satisfeita com as denúncias contra Francisco de Carvalho, presidente da Mangueira, preso recentemente por supostamente ter recebido repasses do ex-governador Sérgio Cabral para financiar o desfile da escola.
O clima na Cidade do Samba é de apreensão e muitos barracões trabalham em um ritmo mais lento ao que normalmente se daria nesta época do ano. Em nota oficial, a Mocidade Independente de Padre Miguel informou o cancelamento de rua do próximo domingo (02) e a sua ausência na festa de segunda-feira. Segundo a nota, "a direção da agremiação julga incoerente integrar festejos mediante tamanha indefinição sobre o repasse de verbas da Prefeitura do Rio de Janeiro para o próximo desfile (...). A Mocidade coloca-se ao lado dos funcionários e colaboradores que lhe prestam serviços, e neste momento passam dificuldades para prover o sustento de suas famílias".
Em sua conta no Facebook, o vice-presidente da escola, Rodrigo Pacheco, justificou o cancelamento do ensaio por conta da situação financeira crítica que a Mocidade vive com os atrasos nos repasses: "Um ensaio de rua, por exemplo, custa aproximadamente R$ 10 mil por data, custos que envolvem aluguel de caminhão de som, segurança, equipamentos de rádio e logística do ensaio. Sendo assim, fica inviável manter os custos, uma vez que a Escola já não recebe repasses há quase 3 meses".
A Mangueira, nesta quinta-feira (29), anunciou a suspensão provisória de suas atividades de quadra. Os ensaios dos dias 1º, 8, 15 e 22 de dezembro estão suspensos. A sede só reabrirá ao público no dia 29, com o tradicional ensaio pré-Réveillon. A justificativa da verde e rosa foi de que " a Mangueira precisa da garantia desses recursos para o planejamento financeiro e o desenvolvimento do seu enredo, cumprindo prazos com fornecedores e toda equipe que brilhantemente desenvolve o espetáculo aclamado na Sapucaí e tão divulgado em todo o mundo".
A São Clemente foi outra escola que anunciou a suspensão dos ensaios. A única atividade prevista para o mês é a realização de um evento no dia 9 de dezembro no Clube Guanabara. Como as coirmãs, informou que "como melhor forma de organizar as finanças atuais, retomaremos os ensaios a partir de janeiro".
A situação, sui generis, mostra o quanto as escolas de samba do Rio de Janeiro encontram-se reféns de uma realidade financeira que não se justifica mais, seja pela crise econômica, pela retração dos investimentos públicos e privados e, sobretudo, pela falta de credibilidade que os últimos atos da Liesa trouxe para a festa. O cancelamento dos rebaixamentos nos Carnavais de 2017 e 2018 foram extremamente danosos para a imagem da liga.
A virada de mesa do último Carnaval, por sinal, traz uma particularidade: a manutenção da Acadêmicos do Grande Rio se deu por conta da gama de patrocinadores que a escola traria para o desfile, além da força de seu tradicional camarote. Como ironia, na semana passada a escola anunciou o fim de seu espaço na avenida. Acabou sendo vitimada pela consequência que o desrespeito ao regulamento trouxe para o Carnaval das escolas de samba.
Há muito divorciadas da vida do carioca comum, com uma visão de marketing ultrapassada e ainda extremamente dependentes de verbas oficiais, as escolas de samba cariocas precisam encontrar um novo caminho. Mesmo reconhecendo a necessidade de manter as contas em dia, é sempre preocupante vermos entidades culturais deixando de abrir suas portas. Neste momento de crise, um dos caminhos para a superação é voltar a abrir pontes com a população. Sem reconquistar a simpatia popular e sem buscar soluções criativas para sua subsistência, alinhadas à realidade das redes sociais e das novas mídias, as escolas de samba estarão condenadas a se tornarem um espetáculo em extinção.
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