Mangueira alfineta Bolsonaro e fundamentalismo cristão, mas não empolga
Resumo da notícia
- Com enredo "A Verdade vos Fará Livre", Mangueira contou e atualizou história de Cristo
- Escola criticou fundamentalismo cristão e alfinetou Jair Bolsonaro na letra do samba
- Bastidores do desfile, que não empolgou, teve Witzel vaiado e alegoria emperrada
Terceira escola a entrar hoje na Sapucaí, a Mangueira defendeu o título conquistado em 2019 com uma mensagem forte, que esbarrou na política. O samba-enredo "A Verdade vos Fará Livre" narrou a trajetória de Jesus Cristo, transportando a figura sagrada para contemporaneidade e fazendo uma crítica nada velada ao presidente Jair Bolsonaro e a ideologia política que ele representa.
Com diversas referências a Jesus, que na visão da escola era uma pessoa "da gente", mostrado com rosto negro, sangue índio e corpo de mulher, a Mangueira fez um desfile visualmente elaborado e engajado, criticando a opressão e os "profetas da intolerância". Até o fundamentalismo cristão entrou na mira. "Não tem futuro sem partilha nem messias de arma na mão", cantaram os integrantes, em alusão ao discurso armamentista do presidente da República.
O título do enredo, aliás, é uma das citações bíblicas prediletas de Bolsonaro, que é apoiado pela bancada evangélica no Congresso e pela parcela mais conservadora da população, inspirada no evangelho de João. Comandada pelo carnavalesco Leandro Vieira, a agremiação levou 19 alas 5 carros alegóricos, 3 tripés e 4.000 componentes para a Sapucaí.
Rainha acorrentada
A rainha de bateria Evelyn Bastos veio como uma versão feminina de Jesus, com coroa de espinhos, acorrentada e usando vestido roxo. À frente dos ritmistas, ela não sambou. Emocionada, afirmou ao UOL antes do desfile ter se preparado psicologicamente durante um mês. "Infelizmente nossa dança ainda é visto como sexual. Para nós, é cultural. A luta é grande. [Desfilar sem sambar] é a maior experiência da minha vida."
Comissão de frente inventiva
Retratado como pobre e com apóstolos negros, Jesus apareceu primeiro numa comissão de frente inventiva, com os integrantes usando cubos como elementos cênicos. Eles serviram de mesa para a santa ceia e revelaram a maquete de uma favela, onde Cristo viveria se tivesse nascido hoje, na versão da escola.
Samba não pegou?
É tradicão no Carnaval: onde a Mangueira vai o povo vai atrás. O desfile da escola mais popular do Carnaval carioca costuma levantar o público na avenida. Mas este ano não foi exatamente o que aconteceu. Falando de Jesus, abordando política, direitos de minorias e com uma paradinha "funkeada", o samba acabou não pegando como em outros anos e como dirigentes imaginaram que aconteceria.
Marrom Maria
Como de costume, Alcione foi um dos destaques em um dos carros alegóricos da Mangueira, desta vez representando Maria, com vestido rosa e túnica verde. Outro famoso a interpretar personagem bíblico foi o ator Humberto Carrão, que viveu um Jesus combativo, de cabelos curtos e inconformado com a forma que a fé é vendida à população.
Isto a Globo não mostrou
Durante o esquenta, integrantes da escola agradeceram nominalmente o apoio do governador Wilson Witzel (PSC), que estava no sambódromo. Isso imediatamente motivou vaias nas arquibancadas do setor 1 da Sapucaí. O setor, no início da avenida, era um dos mais animados com a escola, com a plateia agitando bandeiras e entoando o samba.
Isto a Globo não mostrou 2
O segundo carro da Mangueira, a alegoria "O Templo Transformado", teve problemas e emperrou antes de entrar na avenida. Com o veículo apresentando problemas em duas rodas, a escola armou uma correria e viu um buraco na concentração se abrir, precisando fazer grande esforço para tirá-lo do lugar. No final, tudo deu certo, e a evolução não foi prejudicada.
Samba-enredo
"A Verdade vos Fará Livre"
Compositores Manu da Cuíca e Luiz Carlos Máximo
Intérprete Marquinho Art'Samba
Eu sou da Estação Primeira de Nazaré
Rosto negro, sangue índio, corpo de mulher
Moleque pelintra do buraco quente
Meu nome é Jesus da gente
Nasci de peito aberto, de punho cerrado
Meu pai carpinteiro desempregado
Minha mãe é Maria das Dores Brasil
Enxugo o suor de quem desce e sobe ladeira
Me encontro no amor que não encontra fronteira
Procura por mim nas fileiras contra a opressão
E no olhar da porta-bandeira pro seu pavilhão
Eu tô que tô dependurado
Em cordéis e corcovados
Mas será que todo povo entendeu o meu recado?
Porque de novo cravejaram o meu corpo
Os profetas da intolerância
Sem saber que a esperança
Brilha mais que a escuridão
Favela, pega a visão
Não tem futuro sem partilha
Nem messias de arma na mão
Favela, pega a visão
Eu faço fé na minha gente
Que é semente do seu chão
Do céu deu pra ouvir
O desabafo sincopado da cidade
Quarei tambor, da cruz fiz esplendor
E num domingo verde e rosa
Ressurgi pro cordão da liberdade
Mangueira
Samba que o samba é uma reza
Se alguém por acaso despreza
Teme a força que ele tem
Mangueira
Vão te inventar mil pecados
Mas eu estou do seu lado
E do lado do samba também
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