Vitória da Meta: TikTok fora dos EUA é recado maior que o 'cortes secretas'
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Enquanto o ano começa para valer depois do carnaval no Brasil, Mark Zuckerberg, CEO da Meta, mal esperou a ressaca do réveillon passar para dar aquela sacudida no mundo. A decisão de acabar com a checagem de fatos e flexibilizar a moderação de posts sobre gênero e imigração é um legítimo caso de fome com a vontade de comer. Ainda mais diante do histórico de farpas trocadas com Donald Trump, novo presidente americano.
- A fome: acaricia o novo ocupante da Casa Branca, que vai tão pouco com a cara de Mark que já o ameaçou de prisão, e azeita a relação com os republicanos, que, ocupando postos chave em órgãos federais, decidirão a sobrevivência da Meta a partir de 2025.
- A vontade de comer: aumenta o engajamento, um quesito em que as redes da Meta vêm sendo superados pelo TikTok.
Os efeitos de tudo isso, porém, ainda estão por vir. Agora, o que deve mesmo estar colocando um sorriso no rosto de Zuckerberg é o que está para ocorrer daqui a dois dias: se não rolar nada digno de uma reviravolta de cinema, o TikTok será banido dos EUA. E a mensagem aqui é mais direta do que falar em "cortes secretas na América Latina" para cutucar o STF: quando alinhados, os interesses da Casa Branca e da Meta são desastrosos para inimigos em potencial. Mesmo os mais poderosos.
Marcelo Träsel, professor e pesquisador da UFRGS (Universidade Federal do Rio Grande do Sul)
O que rolou?
Vence no domingo (19) o prazo para o TikTok ser vendido pela Bytedance ou ser banido dos EUA. O veto foi costurado por uma rara comunhão entre rivais e baseado em motivos caros aos norte-americanos. Isso porque:
- Se hoje lambe as feridas do aplicativo de olho no eleitorado jovem, o próprio Trump chegou a proibir, ainda em 2020, o TikTok no país. Só que...
- ... O app derrubou o decreto na Justiça com base no princípio constitucional da liberdade de expressão. Longe de encerrar o caso, porém...
- ... Tanto é que o deputado republicano Mike Gallagher propôs uma lei desenhada para barrar o TikTok, foi endossado por democratas e viu o texto assinado por Joe Biden. Sem muitas evidências...
- ... Ele transformou em regra um temor para lá de presente na sociedade americana: um serviço popular controlado por estrangeiros ameaçando a segurança nacional. Não é primeira vez, já que...
- ... As mesmas preocupações criaram o clima para o embargo mundial à Huawei promovido pelos norte-americanos e seguido por seus aliados. Agora, no entanto...
- ... A decisão beneficia diretamente o feudo das redes sociais de Zuckerberg.
Marcelo Träsel, professor e pesquisador da UFRGS (Universidade Federal do Rio Grande do Sul)
Por que é importante
A Meta criou um império após anos lutando contra rivais norte-americanos. Até que surgiu TikTok, o furo na estratégia de Zuckerberg. A rede dispensa a conexão com conhecidos para exibir conteúdo. Prende qualquer um em uma cascata incessante e viciante de vídeos apelativos. Faz decolar o que é leve e cai no gosto da galera. Mas freia os assuntos chatos. E atrai jovens como ninguém.
Adolescentes passam de duas a três vezes mais tempo no TikTok do que no Instagram, mostram dados coletados por pesquisadores da Meta compilados nos chamados "Facebook Papers", série de documentos vazados pela delatora Frances Haugen.
Se nada mudar, a partir de domingo (19) o TikTok deixará de ser oferecido nas lojas de aplicativo. Ainda poderá funcionar nos celulares de quem o baixou. Isso até novos sistemas operacionais requerem uma nova versão do app que não será oferecida. E Zuckerberg ganhará em dólar com isso. Na avaliação de Träsel, a verba publicitária destinada ao app chinês deve ser revertida para Meta e Alphabet.

Não é bem assim, mas tá quase lá
Para o pesquisador, os EUA não estão de todo errados ao agir de forma recíproca e banir o TikTok. Afinal, as plataformas norte-americanas não funcionam na China. Só tem um problema.
A questão é que China é uma ditadura, e os Estados Unidos são um país democrático, que valoriza a liberdade empresarial e a iniciativa privada. Realmente é possível a China ajustar os algoritmos para manipular a opinião pública. Eles deviam estar mais preocupados com a Rússia do que com a China
Marcelo Träsel
Durante as eleições de 2016, a agência de espionagem russa foi flagrada usando o Facebook para interferir na corrida presidencial, vencida por Trump.
O TikTok não caiu sem lutar. Em ação parecida à do Google no Brasil contra o "PL das Fake News", o app convidou seus usuários a ligar para congressistas para reclamar sobre o banimento. Teve deputado que não conseguiu trabalhar. Fora isso, a Bytedance, dona do TikTok, gastou em 2024 o valor recorde de US$ 8 milhões em lobby.
O esforço do outro lado foi maior e começou antes. Já em 2022, a Meta foi flagrada gastando dinheiro para detratar o TikTok. Segundo reportagem do jornal "Washington Post", a firma de Zuckerberg pagou à maior consultoria republicana para tocar uma campanha contra o app chinês.
Em 2024, a Meta destinou a maior verba de sua história para fazer lobby junto a deputados e senadores. Ainda sem contar o dinheiro do último trimestre, não informado, foram US$ 18,8 milhões, segundo informações do Senado dos EUA. Não é possível saber quanto dessa grana abasteceu a campanha contra o TikTok, mas a verba foi gasta com "discussões sobre cibersegurança", "segurança de dados" e "integridade de plataformas".
Se a fala sobre as "cortes secretas da América Latina" foi encarada como ameaça ao STF, que parece inclinado a responsabilizar as redes pelo conteúdo publicado nelas, o banimento do TikTok dos EUA é fato bem concreto. É o que acontece quando Meta e Casa Branca tabelam em campo. E armas não faltam, diz Träsel.
Só em dinheiro para lobby já aumenta bastante o poder de fogo da Meta. E ainda tem o poder de fogo do Departamento de Estado dos EUA, que por meio de acordos comerciais, pode fazer muito em favor de Meta, Google e outras plataformas
Marcelo Träsel
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