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'Me arrependi de tentar mudar tudo rápido', diz herdeiro da Beija-Flor

Gabriel David - Reprodução/Instagram
Gabriel David Imagem: Reprodução/Instagram

18/02/2020 12h25

Gabriel David, de 22 anos, tem se mostrado a cada temporada um porta-voz da autocrítica que o Carnaval do Rio de Janeiro precisará fazer se quiser seguir como uma das festas populares mais importantes do mundo. Herdeiro da Beija-Flor de Nilópolis, filho do patrono Anísio Abraão David, o jovem é uma promessa no comando de escolas de samba, cada vez mais carentes de quadros dispostos a continuar lutando para que o espetáculo tenha a visibilidade que merece.

Não à toa, ele tem travado sucessivas quedas de braço na tentativa de atualizar o modelo de negócios da Liga das Escolas de Samba do Rio (Liesa). Em 2018, por exemplo, tentou unir as agremiações com a expertise do Rock in Rio — e não obteve sucesso. Depois dos desfiles da última temporada, posicionou a Beija-Flor como uma das maiores críticas à tentativa de mais uma virada de mesa no resultado, encampada pela Imperatriz Leopoldinense. A força da azul e branco, junto a outras escolas, fez diferença: a mudança no rebaixamento não ocorreu e, pela primeira vez em muito tempo, foi possível acreditar que a festa pode resgatar alguma credibilidade diante do público. Há três anos, Gabriel tem apostado em um projeto próprio, tocado em sociedade com a promoter Carol Sampaio, cheio de potencial para atrair atenções e investimentos: o Nosso Camarote, que em pouco tempo se transformou no espaço VIP mais badalado do Sambódromo e provou que o jovem administrador tem razão quando diz que é possível modificar o Carnaval de dentro para fora.

A disposição de Gabriel para enxergar o que há de errado nos bastidores da Liesa se voltou para ele próprio depois do Carnaval passado: com o pior resultado da história recente da Beija-Flor — um sofrido 11º lugar — e a repercussão de suas declarações, que prometiam o contrário, o dirigente precisou reavaliar os caminhos percorridos em busca de desfiles mais atuais e inovadores.

Hoje, às vésperas de um desfile decisivo para a escola fundada por sua família, Gabriel revela à Coluna do Leo Dias que se arrependeu de tentar mudar "muito rápido" e ao mesmo tempo a Liesa e a Beija-Flor e conta como passou a agir diante da própria pressão por revolucionar a Avenida.

COLUNA DO LEO DIAS - Sua relação com os bastidores da Liesa mudou? Antes, você costumava dar declarações que batiam de frente com posições adotadas pelos dirigentes da liga.

GABRIEL DAVID - No início, tudo me revoltava muito. Eu queria mudar tudo e queria que isso acontecesse muito rápido. Mas percebi que preciso olhar para as coisas e entender porque elas são como são. Há pessoas que doaram suas vidas para que tudo seja estruturado dessa maneira. E elas não caíram de paraquedas no Carnaval.

Acredita que seus pedidos por mudanças tenham sido ouvidos nos últimos anos? Você se arrepende por ter comprado essa briga?

Já circulei com vários projetos dentro da Liga. Há várias possibilidades para ela: pode aumentar sua estrutura, terceirizar serviços, atuar em parcerias. Mas isso tudo não cabe só a mim. Hoje, mais do que nunca, o Conselho da Liesa sabe que ela precisa mudar. Não é preciso mais falar sobre isso de maneira tão radical. Até me arrependi de ter tentado mudar tudo muito rápido, mas não é algo que me atrapalhe hoje. Hoje, consigo ver a luz no fim do túnel. Quando comecei a falar muito sobre a necessidade de mudanças, houve uma rejeição muito grande. Uma mudança precisa ser planejada e executada gradualmente.

A saída para o Carnaval passa por ouvir mais as demandas do público das quadras das escolas e da Sapucaí?

O público é muito importante para a festa e a as escolas tentam ouvi-lo. Mas há muita coisa envolvida que as pessoas nem sempre estão vendo e não entendem como é. Carnaval envolve muita política, muita gente e muitos interesses.

Apesar da sensação de que tudo demora para mudar na Liesa, os desfiles deste ano estão com os ingressos esgotados, o que não acontecia desde 2016. Seu camarote também está sold-out. A que você atribui esse sucesso de vendas?

Viemos de três carnavais de superação que fizeram com que as pessoas comprassem o barulho das escolas de samba. O início do fim deste mandato do prefeito (Marcelo Crivella), e a possível saída dele, assim como a chegada do governador (Wilson Witzel), que demonstrou apoio à festa, também contribuíram para uma melhora no cenário.

Você também buscou transformar a Beija-Flor. No ano passado, esse movimento não foi bem aceito pelos jurados diante da mistura da comemoração dos 70 anos da escola com o universo das fábulas. Como ficou o último Carnaval para você?

Tenho dito que vivi o céu e o inferno nos últimos dois anos. Vivemos um campeonato e depois a pior colocação recente da escola. Pensei que podíamos fazer o que quiséssemos no Carnaval da Beija-Flor, mas hoje vejo que não é assim.

Isso quer dizer que a Beija-Flor virá mais tradicional este ano?

Este ano, viremos mais tradicionais, mantendo a tentativa de inovar. Será uma Beija-Flor luxuosa e grande, mas não como nos anos 1980 e 1990: é uma escola do ano de 2020.

Alexandre Louzada e Cid Carvalho, carnavalescos da Beija-Flor este ano, têm anos de carreira. Você tem trabalhado em conjunto com eles?

O Alexandre é um dos artistas menos vaidosos, que ama muito aquilo que faz. Assim como o Cid. Temos constantes trocas de ideias e eles estão muito livres nesta tentativa de criar um desfile campeão. Nós também apostamos na força de outros quesitos para conquistar esse objetivo.

Leo Dias