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Beatloko leva golpe e desfila em carro emprestado, mas não desiste do rap

A rapper Cynthia Luz se apresenta no Beatloko - Marcelo Justo/UOL
A rapper Cynthia Luz se apresenta no Beatloko Imagem: Marcelo Justo/UOL

Carol Martins

Colaboração para UOL, em São Paulo

23/02/2020 00h49

Marcado para começar às 14h de sábado (22), o Beatloko só saiu às 17h e terminou às 19h —tempo de encerramento determinado pela Secretaria de Cultura, responsável por organizar a folia de rua.

Dos 100 mil foliões esperados, o bloco registrou 50 mil, segundo representantes da PM consultados durante o evento pela reportagem —a organização, por sua vez, contabiliza pelo menos 80 mil pessoas. O contratante levou um golpe do trio elétrico contratado, no valor de R$ 16 mil, e não apareceu com o carro na avenida Marquês de São Vicente, no bairro da Barra Funda, em São Paulo. Mesmo assim, o DJ Cia, nome importante do rap nacional e um dos responsáveis pela iniciativa, classificou o evento como "perfeito".

"A maior preocupação era o tumulto, o que acaba prejudicando o nosso movimento, ainda mais com as notícias de mortes, brigas, assédio e roubos em outros blocos", disse o produtor musical, conhecido por ser um dos integrantes do grupo de rap paulista RZO.

'É preciso ter estrutura'

Ele espera que, no próximo ano, o bloco tenha mais visibilidade e oportunidades. "Ideia a gente tem, só não tem investimento. Para trazer o Seu Jorge, o Caetano Veloso, para fazer um som com o Rappin' Hood, é preciso ter uma estrutura. Essas pessoas têm a linguagem e falam com o rap. Não posso abusar da amizade porque tem o lance do respeito de um trabalho que essas pessoas construíram."

Desfile do bloco Beatloko em São Paulo - Marelo Justo/ UOL - Marelo Justo/ UOL
Imagem: Marelo Justo/ UOL
As duas horas de festa acabaram contando com menos da metade das apresentações do cronograma --previsto inicialmente para cinco horas. Dos mais de 12 convidados da cena, só puderam se apresentar Haikaiss, Costa Gold, Consciência Humana, SNJ, Ndee Naldinho, Cynthia Luz e Rincon Sapiência, que se revezaram por 15 minutos cada um.

E, durante o percurso, o bloco fazia questão de parar e entoar um "sai do baile" para os poucos inícios de confusão criados entre foliões.

Representantes femininas

Entre as vozes femininas que se apresentaram no bloco estava Cynthia Luz, 26 anos, que vem crescendo como mulher, jovem, branca —ao contrário do cenário predominante masculino e da periferia.

"Nunca tive vida de luxo, sempre na correria. Tem algumas realidades que consigo entender, algumas não, por ser privilegiada em outros sentidos. A minha ideologia fala de amor no geral, no meio onde pessoas estão guerreando o tempo todo", diz.

"O importante é lembrar o nosso propósito e missão acima de todas as coisas como gênero, raça. Me sinto honrada de estar aqui", disse a mineira, que só debutou neste Carnaval por causa da proposta em ter o rap na maior festa do país. "A rua está tendo a oportunidade de falar uma linguagem que muitas pessoas não associam ao Carnaval."

Outra mulher a se apresentar foi a rapper Cris, integrante do grupo SNJ, atuante do movimento hip-hop desde 1995.

Rap é compromisso

Um dos maiores —e antigos— nomes da cena hip hop nacional, Ndee Naldinho, 51 anos, precisou enxugar o repertório para duas músicas. Escolheu dois clássicos da década de 1990: "Essa é a Lei" e "O Quinto Vigia".

"São ritmos mais acelerados, que combinam com o Carnaval", disse o rapper, que fez questão de participar de mais uma edição do Beatloko, bloco que ficou conhecido por unir gerações de cantores renomados com novos talentos.

"O rap antigo é mais comprometido com o lado social, diferente da maioria dos jovens artistas."

Golpe de R$ 16 mil

Foi por pouco que o primeiro bloco de rap do Carnaval de rua de São Paulo deixou de realizar sua quarta edição. O contratante levou um golpe do trio elétrico contratado.

"Soube da notícia quando cheguei do Rio, hoje, depois de estrear o bloco na cidade [no Museu de Arte Moderna, no Parque do Flamengo], e achei que ia direto conhecer o trio", disse o DJ Cia, idealizador do Beatloko.

Ele afirmou à reportagem do UOL que não prestará queixa na delegacia. "São intermediários que alugam os carros. Às vezes é o mesmo carro com outra pessoa. Delegacia não vai adiantar muito. Vamos atrás da pessoa, tentar achá-la. Foi dinheiro do bolso sem patrocínio de ninguém."

O contratempo não abalou a organização, que conseguiu a ajuda de outro bloco, que desfilava nos arredores da região oeste da cidade, emprestando o trio elétrico para receber convidados e atrações, e atender os fãs que aguardavam em frente ao Fórum Trabalhista Ruy Barbosa.

Errata: este conteúdo foi atualizado
Diferentemente do publicado na versão original do texto, Cynthia Luz não foi a única mulher a se apresentar no bloco Beatloko. A rapper Cris SNJ também subiu ao trio para cantar.

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