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Anderson Baltar

Portela forma primeira geração de cineastas no seu curso de audiovisual

Turma do projeto "Por Telas", da Portela - Divulgação
Turma do projeto "Por Telas", da Portela Imagem: Divulgação

04/09/2018 16h07

Já estão longe os tempos em que uma escola de samba apenas propiciava a seus frequentadores a oportunidade de diversão, lazer e aprendizado dos mais tradicionais fundamentos do samba. Cada vez mais projetos sociais surgem nas quadras cariocas, propiciando aos moradores das redondezas o acesso ao conhecimento em diversas áreas. A Portela, uma das mais tradicionais escolas cariocas, inovou e, recentemente, formou a primeira turma de seu curso de audiovisual, o "Por Telas". 

Integrado por 22 moradores dos bairros da região de Madureira, Zona Norte do Rio, o curso aconteceu entre maio e agosto na quadra da escola. Duas vezes por semana, das 19h às 22h, os alunos aprenderam todas as etapas da produção de um documentário – do roteiro à edição. O professor foi o cineasta paraibano André da Costa Pinto, com experiência em projetos sociais e seis longas-metragens em seu currículo.

"Sempre pensei que iria formar profissionais. Por isso, trouxemos um curso com qualidade de mercado, para começar a encaminhar essas pessoas para o trabalho. E o resultado foi satisfatório. Temos alunos muito talentosos", atesta.

O curso foi idealizado pela produtora cultural Cecília Rabello. Filha de Paulinho da Viola, ela produziu um show de seu pai juntamente com Marisa Monte para comemorar os 95 anos da escola. O espetáculo, ocorrido em abril, teve parte de sua renda destinada para o custeio do curso. "Não tem preço proporcionar às pessoas a possibilidade de transformar suas vidas com a arte. E dentro de uma escola de samba como a Portela, isso é ainda mais emocionante. É o verdadeiro papel de uma escola", afirma Cecília. 

O "Por Telas" contemplou aulas de roteiro, direção, produção, fotografia, som, montagem, direção de arte e direitos autorais. Em seu primeiro momento, cada aluno escreveu um roteiro e, por votação, três foram selecionados para que virassem curtas. A turma se dividiu em três equipes para fazer os projetos se tornarem realidade. "Mas o mais interessante é que vários alunos se envolveram em mais de um projeto, desempenhando funções diferentes – o que só enriqueceu o aprendizado deles", relata André. 

Três filmes foram produzidos pela turma e serão exibidos, em setembro, na quadra da escola: "Paulo Mais Benjamin de Oliveira do que da Portela: Influências e Legados Culturais de um Sambista Para Sociedade Carioca", de Ruan Lucena; "Procuram-se Mulheres", de Rozzi Brasil; e "Um Craque Esquecido", de Ygor Lioi – este, já integrado à programação do festival Cinefoot, destinado a filmes sobre futebol e que acontecerá neste mês no Rio de Janeiro.

"Eu sempre tive o sonho de fazer este filme, contando a história de meu avô. E o curso da Portela foi a oportunidade perfeita", relata Ygor. "Um Craque Esquecido", conta a história de Paulinho, atacante e meia que, nos anos 1950, destacou-se no Madureira, Botafogo e Fluminense. Campeão Carioca de 1959, Paulinho ficou conhecido como "o ladrão de bolas" e, além de ter jogado ao lado de craques como Telê Santana e Garrincha, foi o primeiro jogador de futebol a obter o passe livre. Professor de história e integrante do Departamento Cultural da Portela, Ygor conseguiu todo o suporte para contar a história de um jogador pouco lembrado hoje em dia. "Tinha a pesquisa pronta e o curso me deu todo o suporte para que o filme fosse realizado e agora ganhe o mundo", festeja. 

Vinicius Bondim integra a equipe de segurança da quadra da Portela há 10 anos e sempre se interessou por cinema. Porém, o preço proibitivo dos cursos de audiovisual – quase sempre localizados na Zona Sul ou Barra da Tijuca – o impedia de ter acesso a este tipo de formação. Aluno do "Por Telas", teve seu roteiro aprovado para ser produzido futuramente pela Canto de Sala, a empresa responsável pelo curso. "O projeto dele tinha uma complexidade e um custo acima do que o curso podia arcar. Mas achamos fantástico e trabalharemos nele em breve", afirma Cecília Rabello.  A experiência motivou Vinicius, que viu o curso como apenas o começo de uma nova carreira. "Quero aprender mais e me especializar nesta área", afirma.

A intenção é criar uma nova turma em breve, desta vez com um foco maior na produção de filmes de ficção. A produtora já trabalha na estruturação do novo projeto e busca patrocinadores no mercado. A despeito da ligação familiar e emocional com a Portela, Cecília Rabello afirma que sonha em estender a iniciativa para outras agremiações cariocas. "Já pensou, daqui a alguns anos, termos um Festival de Cinema das Escolas de Samba?", sonha a produtora. 

Anderson Baltar