Homem fica com a pele cinza, e caso misterioso intriga os médicos

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Um paciente de 84 anos com pele cinza-azulada tem intrigado médicos do Hospital Príncipe de Gales, em Hong Kong. Eles ainda não identificaram a fonte da alteração de cor do senhor —o caso foi relatado no dia 8 de janeiro no periódico científico The New England Journal of Medicine.
O que aconteceu
O idoso chegou ao hospital porque tinha dificuldades para urinar. Segundo os médicos Tin Yan Lee e Wan Hang Lau, o homem sofria de hiperplasia prostática benigna —o aumento da próstata que frequentemente acomete homens de mais de 40 anos e causa justamente a dificuldade para fazer xixi. Além disso, ele tinha uma lesão aguda no rim devido a uma obstrução do trato urinário.
Ao examinarem o paciente, os médicos encontraram outro curioso sintoma: pele, olhos e unhas acinzentados. A alteração de coloração não era novidade; o homem já havia apresentado as primeiras alterações de tonalidade da pele cinco anos antes. Durante este período, a única medicação que ele tomava era a finasterida, usada para o tratamento do aumento da próstata e, frequentemente, para combater a calvície masculina.

Exames de sangue apontaram o culpado pela mudança de cor: o excesso de prata no organismo do homem. Seu corpo continha 423 nmol/litro de prata, enquanto o normal seria menos do que 10 nmol/litro. Ou seja, o idoso tinha mais de 40 vezes a quantidade máxima do metal que um ser humano poderia tolerar de maneira segura.
Seu corpo estava "transbordando" prata, literalmente. Os médicos encontraram grãos enferrujados da prata sob a pele do paciente, nas membranas das suas glândulas de suor, vasos sanguíneos e fibras da derme, a camada intermediária da pele. Por isso, o homem foi diagnosticado com uma doença chamada argiria.
A origem do mistério
Argiria é a exposição sistêmica à prata que causa o escurecimento irreversível da pele. As mudanças de tom geralmente são mais notáveis em áreas expostas ao sol, explicam os médicos no estudo de caso, porque a luz do sol catalisa a redução da prata —uma reação química similar àquela que acontece na revelação de filmes fotográficos— e produz partículas tão pequenas de prata que funcionam como um pigmento que "tinge" a pele.

O paciente trabalhava como garçom havia décadas e não sofreu nenhuma exposição significativa à prata em sua vida de que se tenha notícia. Ele não usava produtos que continham prata em sua composição, como a prata coloidal, um suplemento controverso indicado para cicatrizar feridas. Outros moradores de seu prédio não tiveram alterações do tom de pele que pudessem indicar uma intoxicação ambiental acidental.
Após a alta, idoso foi encaminhado para investigação toxicológica. Mas a fonte da prata à que ele foi exposto jamais foi encontrada.
O que é a argiria?
A argiria é a doença resultante da intoxicação pela prata, conhecida dos médicos pelo menos desde o século 19, como revela um artigo da London Medical Gazette de 1843. Historicamente, ela foi detectada em artesãos e garimpeiros que tinham contato próximo e cotidiano com o metal, mas em alguns casos a prata também foi absorvida de medicações que continham o elemento por causa de suas propriedades antimicrobianas.
Considerada até o momento como "não fatal", a argiria causa, em primeiro lugar, a mudança de cor da pele. Estudos investigam desde os anos 1970 sua potencial ligação com falência renal e perda de visão noturna, mas ainda não há conclusão definitiva da comunidade científica.

O americano Paul Karason é o caso mais famoso de argiria e ficou conhecido como "Papai Smurf" por causa da cor azulada de sua pele. Ele ingeriu prata por anos em experimentos caseiros para curar doenças e teria vivido cerca de 15 anos com sua nova aparência. Paul morreu de um infarto em 2013 aos 62 anos e a causa não era "imediatamente conhecida", segundo sua ex-esposa ao programa "Today" da rede NBC, mas ele teria sofrido de problemas cardíacos por anos.
No Brasil, a Anvisa não indica que a prata coloidal possa ser ingerida ou utilizada terapeuticamente. O produto é comercializado com a indicação de "uso externo", justamente porque não há evidências concretas de benefícios associados ao seu uso como remédio ou suplemento. No entanto, a substância é aplicada para limpeza e desinfecção de áreas hospitalares desde 2021. O FDA, a Anvisa dos EUA, também não considerada a prata coloidal segura ou eficiente para tratar doenças.
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