Roberto Sadovski

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Opinião

Smashing Pumpkins fecha show com Bowie e celebra tempo que teima em existir

Não é comum os Smashing Pumpkins encerrarem os shows com um bis. Geralmente —e foi essa a regra na atual turnê, "The World Is a Vampire"— a banda liderada por Billy Corgan cumpre o setlist, despede-se e adios. Não foi sem surpresa, portanto, ver o grupo retomar o palco neste domingo (3) chuvoso em São Paulo para encerrar sua festa com uma versão improvisada e sensacional de "Ziggy Stardust", clássico de David Bowie. Queixos foram ao chão.

Foi um presente para o público que lotou o Espaço Unimed e uma despedida bacana para um show impecável. Claro que o Smashing Pumpkins versão 2024 é bem diferente da turma que, em maio de 1991, bons quatro meses antes de o Nirvana mudar o jogo com "Nevermind", ajudou a abrir as portas do rock alternativo (rótulos, eu sei...) para o mainstream com "Gish".

Eles ainda trazem uma paulada sonora definitivamente esquisita, mas hoje estão confortáveis como veteranos no cenário efêmero da música. Talvez "sobreviventes" seja um termo mais adequado. "Gish" foi seguido de "Siamese Dream", e quando "Mellon Collie e the Infinite Sadness" foi lançado em 1995, os Pumpkins passaram a lotar estádios ao redor do mundo.

Ao adotar camadas eletrônicas em seu som com "Adore", o público perdeu o entusiasmo. Quando "MACHINA" foi lançado em 2000, o cenário musical pop do novo milênio, somado a brigas internas e problemas com drogas, causou a fragmentação da banda.

Foi Billy Corgan, na posição de dono da bola, quem aos poucos juntou os cacos até reunir três quartos da formação original —o guitarrista James Iha e o baterista Jimmy Chamberlain —e lançar discos e rodar o mundo. Se o sucesso do final dos anos 1990 nunca se repetiu, álbuns como "Oceania", "Atum" e o recente "Aghori Mhori Mei" mostram que os Pumpkins, Corgan sempre à frente, nunca deixaram de fazer arte em forma de música.

O show teve um pouco de (quase) tudo. A abertura com "The Everlasting Gaze" e "Doomsday Clock" já mostraram que os Pumpkins, ao vivo, não se furtam em aumentar a intensidade e o peso. O cover peculiar de "Zoo Station", do U2 (que tomou neste ano o lugar ocupado por "Once in a Lifetime", do Talking Heads, em 2023), precedeu o hit "Today" —e a partir daí o público estava rendido.

Ao longo de duas horas, o Smashing Pumpkins equilibrou canções pouco conhecidas com sucessos certeiros. "That Which Animates the Spirit" esquentou a turma para a comoção de "Tonight, Tonight"; "Beguiled" colou em "Ava Adore" e "Disarm" (que abusou, no bom sentido, do instrumental pré-gravado); "Sighommi", single de "Aghori Mhori Mei", antecedeu "1979". Faltou qualquer coisa de "Gish"? Faltou, mas não se pode ter tudo.

Longe da personalidade introspectiva e arredia de outrora, Corgan contrastava o visual de vampiro techno com bom humor insuspeito. Ele arrematou dois covers em um trecho acústico ("Landslide", do Fleetwood Mac, gravada pela banda em 1994 na coletânea de lados B "Pisces Iscariot"; e uma bela versão de "Shine On, Harvest Moon", da diva dos anos 1930 Ruth Etting) e ainda achou espaço para trocar piadas de tiozão do pavê com James Iha. A idade fez bem para o espírito.

Outra vantagem da quilometragem da estrada é que o Smashing Pumpkins poucas vezes soou tão bem ao vivo. Não atrapalha, claro, o entusiasmo adicionado pela guitarrista Kiki Wong. Escolhida entre milhares de músicos que atenderam um anúncio para substituir o guitarrista Jeff Schroeder, que deixou a banda em 2023, Kiki fez sua estreia com os Pumpkins, em junho, e teve abertura para mostrar sua personalidade —e habilidade— inquestionáveis.

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Quando o show entrou na reta final com a dupla "Cherub Rock" e "Zero", a viagem no tempo estava completa. Longe de se ancorar em nostalgia, o Smashing Pumpkins triunfa ao se fazer presente, no palco, como músicos excepcionais que não perderam a fibra e o sangue nos olhos para tocar rock —para fazer barulho!

A indústria mudou, as condições para seu sucesso de três décadas atrás talvez sejam impossíveis de ser repetidas. E tudo bem: o que importa é o agora. Toda a engrenagem que sustenta uma banda quando sai em turnê tira uma lasca da espontaneidade que sustenta o rock. É do jogo.

Mas ver o Smashing Pumpkins sair do script, voltar ao palco e mandar um clássico de um de seus heróis recuperou, mesmo que por alguns minutos, o espírito da molecada que começou no circuito underground de Chicago no final dos anos 1980. Do lado de fora, a chuva ainda caia. Quem acompanhou duas horas de euforia musical, contudo, já estava de alma lavada.

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** Este texto não reflete, necessariamente, a opinião do UOL

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