Futebol ou faculdade? Filho de Sylvinho une os dois nos EUA e sonha com MLS
Cruzar os Estados Unidos em viagens que entram pelas madrugadas, estudando para uma prova da universidade, depois de mais um jogo na luta para ser jogador profissional.
Essa é a rotina de cada vez mais brasileiros, que buscam no circuito universitário dos EUA um novo caminho para suas carreiras no futebol. (O futebol "nosso", diga-se, e não o futebol americano, que tem nas universidades a base de sua formação de atletas profissionais).
Tiago Campos, meio-campista da equipe da Gardner-Webb University é um desses casos. Filho de Sylvinho, ex-lateral-esquerdo da seleção brasileira e hoje técnico da Albânia, o jovem de 19 anos está em sua segunda temporada na NCAA, a principal organização dos esportes universitários norte-americanos.
O caminho é diferente do que se imagina quando pensamos em um jogador brasileiro tentando construir uma carreira no exterior, mas tem uma explicação.
"Era uma ótima oportunidade de jogar em um nível bom, com infraestrutura e continuar estudando", afirma Tiago, em conversa com o UOL. Ele jogou nas categorias de base em clubes de Portugal e chegou a ser aprovado em universidades de Madri e Barcelona depois que terminou o segundo grau.
Na hora de ter que decidir entre continuar estudando ou seguir a carreira de jogador, acabou ficando com ambos.
"Ficamos contentes com a decisão que ele tomou com relação ao futuro dele: está em um país em que sabem trabalhar o desenvolvimento de atletas, com uma estrutura extraordinária e estudando", afirma Sylvinho, que vive entre Portugal e Albânia e acompanha à distância a trajetória do filho.
Rota alternativa
Jogar no futebol universitário dos EUA é um caminho que tem se tornado cada vez mais comum para os brasileiros. A equipe da Gardner-Webb University, por exemplo, tem outros seis jogadores do país além de Tiago.
O pacote é tentador: ter uma chance de ser profissional e, ao mesmo tempo, ir somando créditos para sair com um diploma de curso superior.
"É claro que há jogadores de 18 ou 19 anos que estão em times grandes, no Brasil ou fora; nesse caso, é diferente. Mas para quem ainda está procurando uma chance de ser profissional, eu acho um bom caminho. O interesse deles é que você vire profissional e chegue no nível mais alto do futebol daqui", avalia o filho de Sylvinho.
O perfil de brasileiro que desembarca nas universidades norte-americanas costuma ser parecido: jogadores na virada dos 20 anos, que fazem as categorias de base no Brasil e não conseguem chances em grandes clubes, mas recebem bolsas de estudos: recebem descontos na anuidade, além de ter a possibilidade de receber comida e alojamento.
"Eles têm quatro anos para se tornar profissional nos Estados Unidos. Se não der certo, saem da universidade formados, com o diploma de uma universidade americana", explica Tiago.
Poder contar com jogadores brasileiros empolga o técnico inglês Scott Wells, que desde 2022 treina a Gardner-Webb University. "Os brasileiros nos dão habilidade técnica, velocidade, capacidade de mudar os jogos. Eles têm um talento natural e se sentem bem com a posse de bola", avalia.
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Quero receberFoi com a ideia de fazer a ponte entre o talento brasileiro e a estrutura norte-americana que Ricardo Silveira fundou há 19 anos a 2SV Sports & Education, empresa de intercâmbio esportivo-acadêmico que já levou 4 mil atletas do país para as universidades dos Estados Unidos.
"A gente sabe o quão difícil é passar pelo funil da base para o profissional. Às vezes, por vários motivos, não dá certo. Daí temos um atleta que se dedicou durante sete, oito, nove anos da sua vida para o esporte em alto rendimento? por que não usar essa dedicação toda por uma bolsa de estudo nos Estados Unidos?", questiona.
MLS e contabilidade
O caminho mais comum para os egressos das universidades é o futebol local: a MLS tem olheiros em várias partidas do circuito universitário e, em seu draft anual, recruta nomes para suas franquias.
É justamente para na liga norte-americana que Tiago Campos mirou quando decidiu ir estudar e jogar no país. "Os Estados Unidos são o país das oportunidades. Alguns atletas acabam saindo das universidades e jogam na MLS, e isso pra ele é um objetivo", explica Sylvinho.
A rota para a MLS é longa, literalmente: os campeonatos são divididos geograficamente, mas ainda assim as longas distâncias significam horas na estrada. Esse é um dos momentos em que Tiago e os colegas costumam fazer os deveres e trabalhos da universidade.
"A gente tem que manter uma média mínima das notas para poder jogar. Se a média ficar abaixo desse número, o estudante deixa de ficar elegível para a equipe", explica Tiago, que não tem dúvidas ao dizer qual a matéria em que mais sofre. "Contabilidade, sem dúvidas. É a mais difícil. Prefiro marcar um camisa 10", brinca.
Com as notas em dia e as aulas de Contabilidade superadas, Tiago tem crescido na equipe. Em sua segunda temporada, ele tornou-se titular e surpreende a cada o dia o técnico da Gardner-Webb University; não apenas pela qualidade, mas também pela mentalidade competitiva.
"Ele passou de ser um jogador que jogava 15 minutos por partida a ser um titular da nossa equipe. Geralmente um jogador que chega com 18 anos tem que ter paciência para chegar ao time: mas ele desde o início trabalhou para melhorar todos os dias e ganhar espaço", afirma o treinador Scott Wells.
"Quando ele chegou aqui, o que eu quis foi dar a ele uma oportunidade de criar uma identidade própria. Sei que em muitos lugares ele era conhecido por causa do pai, mas eu quis que ele crescesse por si mesmo", conclui.
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