Perrengues e famosas: como é cobrir a concentração das escolas de samba
"A bateria precisa passar." "Traz a musa". "Licença, pessoal". Estas são algumas das frases que eu ouvi repetidas vezes durante a cobertura da concentração das escolas de samba na Marquês de Sapucaí, no Rio de Janeiro, durante o Carnaval. A terceira frase foi, com certeza, a que eu mais ouvi. Afinal, eu era a pessoa que ficava no meio da escola ou na frente das famosas. Ali, o fluxo de pessoas é intenso, a emoção é contagiante e a agilidade das agremiações é de impressionar.
Acompanhei a preparação das 13 escolas Grupo Especial; sete no domingo e seis na segunda. Um sentimento se fez presente nos dois dias de desfile: o nervosismo. Muito mais do que amor, paixão ou emoção, a tensão de fazer a escola passar pelos 700 metros da Sapucaí e chegar à praça da Apoteose sem problemas perceptíveis é unânime. E detalhe: não é um nervosismo que fica só entre os membros das escolas, a repórter aqui sentiu o mesmo.
Perrengue da Grande Rio
A Grande Rio, por exemplo, teve dificuldade para posicionar os destaques no segundo carro alegórico, que demorou a entrar na avenida. Olhei para os lados nessa hora e a apreensão era geral. Membros da diretoria da União da Ilha e da Portela, próximas escolas a desfilar no domingo, observavam atentamente a tentativa da Grande Rio de colocar o carro na Sapucaí. A escola conseguiu, e o alívio foi geral.
Como se organiza a concentração
A credencial para acompanhar a concentração limitava minha passagem até a entrada na avenida: a linha (imaginária) que separava o asfalto do espaço para o desfile. A concentração tem duas ruas nas quais as escolas se organizam: a dos Correios (à direita da Sapucaí) e a do Balança (à esquerda).
Parece óbvio que as escolas tenham dois lados para se organizar, até porque não cabe todo mundo em uma rua só, né? Pois é, mas para mim não foi tão óbvio, não. Demorei um pouco para entender como tudo funcionava. Mas "um pouco" na Sapucaí é quase o mesmo que nada, o tempo lá parece que funciona de outro jeito, então aprendi rapidinho.
'Inception' de Portelas
No domingo, tive um desafio: tocar com a bateria da Portela, a escola do meu coração. Afinal, meu sobrenome é Portela. A ideia era que um membro da bateria me ensinasse a tocar qualquer instrumento. Lá fui eu atrás do mestre da Portela, Nilo Sérgio. Conversei com ele, mostrei minha credencial e quando disse que meu sobrenome era Portela, ele falou: "Nossa, arrepiei". Ele me disse para ficar por ali, mas não sabia ao certo se eu conseguiria tocar porque o fluxo da escola é rápido.
Deu ruim
Meu desafio era difícil, mas eu não tinha noção do quanto. Antes mesmo de uma escola terminar o desfile, a bateria da próxima entra na avenida e se posiciona. Mas claro, sem fazer barulho. Fiquei ao lado do mestre o tempo inteiro e, de vez em quando, olhava para ele com uma expressão do tipo: "Eu estou aqui, hein?" Infelizmente, não consegui tocar. A bateria entrou, olhei para o mestre, mas dessa vez ele não me viu. Tudo bem, vi a Portela bem de pertinho, já valeu.
Famosas em profusão
Em certos momentos, eu me senti num verdadeiro desfile de celebridades regadas a brilho, penas e seguranças. Paolla Oliveira, Sabrina Sato, Viviane Araújo, Gracyanne Barbosa, Aline Riscado, Nicole Bahls, Luísa Sonza não andavam sem ao menos três ou quatro homens altíssimos em volta delas.
Engolida pela bateria
Como escrevi no começo do texto, eu era a pessoa que ficava no meio da escola ou na frente das famosas. Por isso, sempre ouvia que precisava dar licença para alguém passar. Por exemplo, na segunda, quando percebi, estava dentro da Furiosa, a bateria do Salgueiro. Mas, calma, antes de a escola entrar na avenida. Posso dizer que esse foi um dos auges da cobertura. A bateria é impressionante. "A senhora não pode ficar aqui, tem como ir um pouco para trás?", perguntou um dos seguranças da Liesa, a Liga das Escolas de Samba do Rio. Claramente, a pergunta foi para mim.
No cantinho com Maria Rita
Vamos a outros dois auges, fico arrepiada só de lembrar. Enquanto caminhava pela concentração, ali naquele espacinho onde eu ficava, no limite entre o asfalto e a entrada da Sapucaí, encontrei Maria Rita. Maria Rita é como uma entidade na minha família. Então, quando a vi, fui correndo atrás dela. Comecei perguntando como funcionava a preparação dela para o Carnaval. Antes mesmo de responder, mais um segurança pedindo licença, então lá fomos nós para um cantinho. Maria Rita é simpatia pura, respondeu às perguntas e logo foi para o lugar dela na escola.
Elza rainha do coração
Próximo auge: Elza Soares. Elza por si só é um auge, não precisa de nada mais. Ela foi homenageada pela Mocidade Independente de Padre Miguel. O samba-enredo "Elza Deusa Soares" é o meu preferido do Carnaval 2020, não só pela beleza e emoção, mas pela simplicidade: decorei o refrão em 15 minutos de apresentação. Elza desfilou na última ala da escola, assistiu ao desfile em cima de um destaque, ali daquele lugar que eu já mencionei para vocês: no limite entre o asfalto e a entrada da Sapucaí. E eu assisti ao desfile do lado da Elza; foi aí que a mágica aconteceu. Subi no destaque e por cerca de 1 minuto conversei sobre a sensação de ouvir um samba-enredo sobre ela. "'Tá' muito bonito, a escola está bonita. Eu estou muito emocionada", desabafou Elza Soares numa espécie de trono. Pronto, esse foi o auge.
Faria de novo?
Em dois dias de concentração, andei cerca de 14 km. Pés cansados, joelhos inchados e sono acumulado. Andaria mais 14 km se necessário, a emoção de ver escolas de samba tão de pertinho é incomparável.
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