Você analisou o freio da língua do bebê? Pequeno detalhe ajuda a amamentar
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Após o parto, o bebê é colocado em seus braços e você precisa, de uma hora para outra, entender o que aquele pacotinho está precisando e como ajudar. É claro que é uma construção de vínculo e comunicação, é claro que você já leu dezenas de livros sobre o que está por vir, mas tem alguns desafios que são mais discretos. Por exemplo: dificuldade para amamentar sabemos que é comum, mas você sabe que checar o freio da língua do seu recém-nascido deveria ser comum também?
"Levei um susto. Simplesmente chegou um cara paramentado no quarto da maternidade dizendo que iam levar minha filha para fazer um corte na língua", conta a empreendedora Priscila Narvaes, de 40 anos, mãe de Letícia, hoje com 7 anos.
Em choque, sem saber do que se tratava, Priscila preferiu esperar e entender melhor a situação. No dia seguinte, após conversar com a pediatra, a mãe de Letícia compreendeu que se tratava de uma anquiloglossia (também conhecida por língua presa ou freio curto), então permitiu e acompanhou a intervenção -que além de ajudar o bebê ajudou seu seio na amamentação.
A verdade é que meu peito já estava começando a doer e eu não sabia o porquê, porque já sabia como funcionava a amamentação, era minha segunda gravidez. Mas aí entendi que doía por conta desse freio.Priscila Narvaes, 40, empreendedora
A consultora de amamentação Viviane Buon Campos explica que a condição pode dificultar a sucção do bebê, levando a problemas como dor nos seios da mãe, baixa produção de leite e ganho de peso inadequado do recém-nascido.

Mas nada de se assustar: o freio da língua curto é uma condição relativamente comum, que ocorre quando o freio lingual - membrana que conecta a língua ao assoalho da boca - é menor do que o normal, restringindo seus movimentos. Isso pode impactar não só a amamentação como, mais tarde, a mastigação, deglutição, respiração, fala e até o desenvolvimento orofacial da criança.
Por isso, apesar de não ser nada grave, o freio curto não só pode, como deve ser percebido o quanto antes. O "pique" ou corte no freio (chamado de frenectomia lingual) deve ser feito por um profissional especializado, como odontopediatra, otorrinolaringologista ou cirurgião pediátrico, e com os devidos cuidados. "Se não for bem realizado nos primeiros dias de vida, pode ser necessário refazê-lo no futuro", alerta Viviane.
Segundo a odontopediatra Natália Valli, às vezes é preciso refazer o procedimento por motivos como a própria cicatrização do bebê, pois cada um tem uma. "É preciso verificar como está a pega na amamentação, e tudo depende do resultado final do procedimento".
Letícia mamou até os dez meses, mas aos 3 anos apresentava atraso na fala e passou a ter o acompanhamento de uma fonoaudiologista. "Quando ela estava com cinco anos, a fono sugeriu que a gente a levasse em uma odontopediatra. Novamente foi indicado soltar a base da língua, em um procedimento mais chatinho", conta a mãe.
Depois de um ano, Lelê, como é carinhosamente chamada, teve alta da fono e hoje, aos 7 anos, fala sem nenhuma dificuldade.
Mas precisa mesmo cortar?

No Brasil, uma lei federal tornou obrigatória a triagem neonatal da anquiloglossia em neonatos, ou seja, todas as maternidades e hospitais do país devem avaliar o freio (ou frênulo) lingual.
Não há consenso sobre qual protocolo de avaliação seja mais adequado, mas um deles é o Protocolo Bristol, que avalia a aparência da ponta da língua, a fixação do frênulo, a elevação da língua e a projeção da língua - e cada item recebe uma pontuação.
Há ainda o teste da linguinha, realizado por um profissional da saúde capacitado, que eleva a língua do bebê para verificar se ela está "presa". Além disso, se observa o bebê chorando e sugando.
O procedimento é simples. O maior risco é uma reação alérgica ao anestésico, por isso é essencial que o cirurgião utilize produtos adequados para bebês.Natália Valli, odontopediatra
A otorrinolaringologista explica que o ideal é que os profissionais capacitados verifiquem o grau da anquiloglossia e que, junto com essa graduação, façam o teste da linguinha para que o otorrino ou odontopediatra confirme a necessidade do procedimento. A consultora de amamentação pode ajudar, pois o ideal é entender se esse bebê é realmente sintomático, ou seja, que apresenta sintomas (dificuldades) por conta do freio curto.
Se ele for sintomático, a solução é o procedimento, que pode ser feito no centro cirúrgico, na maternidade, ou em um consultório, com sedação ou anestesia local. Pode respirar tranquilamente, não é para doer, e seu recém-nascido volta para o peito assim que acaba.
A frenectomia lingual é considerada um procedimento rápido e seguro. Pode ser feita com bisturi, tesoura ou laser, sendo este último uma opção que reduz sangramentos e facilita a cicatrização.
Além disso, o pós-operatório exige atenção. "Fatores como uso de chupeta, mamadeira e a forma como a amamentação é conduzida interferem na cicatrização e no resultado final", complementa a especialista.
A médica reforça que o procedimento pode ser realizado em qualquer idade, desde o período neonatal até a vida adulta, mas que - preferencialmente, ocorre nos primeiros dias de vida para evitar problemas futuros.
Segundo a otorrinolaringologista Sofia Borges, é essencial que, sob suspeita de freio curto, se o procedimento não for realizado na maternidade, o pediatra encaminhe a criança para avaliação especializada. "Quanto mais cedo o problema for tratado, mais simples é o procedimento e menores são as chances de complicações futuras", enfatiza.
Como saber se meu bebê precisa do "pique" no freio?
"A língua tem que estar mais grudadinha no céu da boca, para que o maxilar cresça corretamente? Ela digamos assim, coordena o crescimento da face," explica a odontopediatra. A mãe não consegue perceber, mas a dificuldade na amamentação é o maior indício.
Soluços, engasgos constantes e falta de ganho de peso são outros fatores que ajudam a detectar, caso isso não tenha acontecido ainda. Passada a fase da amamentação, vem os indícios da fala, como a dificuldade de pronunciar alguns fonemas.
Embora muitas vezes negligenciado, o freio lingual curto pode afetar diversos aspectos da vida além da amamentação, da fala e desenvolvimento orofacial - interferindo, por exemplo, na saúde bucal, na mastigação e até na vida social e afetiva na fase adulta. Além disso, a língua tem um papel fundamental na higiene bucal, ajudando a remover resíduos entre os dentes. Uma anquiloglossia não tratada pode aumentar o risco de doenças gengivais.
O caso de Letícia reforça a importância do acompanhamento profissional e da informação para os pais. Afinal, o freio lingual curto é um detalhe pequeno, que pode até assustar as mães que não foram informadas sobre, mas que pode ser resolvido de forma simples e fazer uma grande diferença na qualidade de vida da criança.
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