Barriga de aluguel: brasileira diz como é e quanto custa ter filho nos EUA

Durante quase dez anos, Taíse Rayes, 44, enfrentou uma batalha para realizar o sonho da maternidade. Saudável e sem nenhum diagnóstico de infertilidade, ela passou por um caminho árduo: mais de 13 fertilizações in vitro (FIV), tentativas com embriões doados, óvulos doados, esperma doado e fila de adoção. Nenhuma porta parecia se abrir, mas o desejo de ser mãe sempre seguiu forte.

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Depois de tantas tentativas frustradas de gestação, na adoção indireta (quando uma mãe deseja doar o filho para alguém), Taíse viu seu marido, Marcelo Rayes, receber a dura resposta de uma juíza da Vara da Infância e da Juventude: "Se o seu processo cair na minha vara, tiro a criança de vocês na hora".

Para Taíse e o marido, ambos advogados, aquela frase foi um divisor de águas. "Ficamos traumatizados, revoltados, tristes. Decidimos abandonar a ideia da adoção. Mas foi aí que tudo começou a mudar", relembra.

Paulo Gustavo como inspiração e fertilização internacional

Thales e Paulo Gustavo tiveram dois filhos juntos, os gêmeos Gael e Romeu, de 2 anos
Thales e Paulo Gustavo tiveram dois filhos juntos, os gêmeos Gael e Romeu, de 2 anos Imagem: Reprodução/Instagram

Por acaso, durante um almoço rotineiro, Taíse viu uma reportagem sobre o ator Paulo Gustavo ter se tornado pai por meio da gestação por substituição, popularmente chamada de barriga de aluguel, nos Estados Unidos. A ideia, distante da realidade brasileira, despertou inquietação. "Até então essa questão não fazia parte da nossa cultura, não era uma possibilidade real para nós", conta.

Por curiosidade, a advogada pesquisou e encontrou uma agência especializada em barriga de aluguel. Ela descobriu que não é um procedimento simples ou rápido, mas burocrático, que exige paciência, planejamento e um grande investimento -tanto emocional quanto financeiro. Os custos de uma barriga de aluguel dependem de diferentes fatores, como o número de tentativas ou o país onde é feita mas, para ter uma noção, ficam em torno de 50 a 120 mil dólares.

Taíse e o marido deram início ao processo, que começou em Los Angeles, onde ambos colheram o material genético. Os embriões foram fertilizados na Índia, em um laboratório especializado e, só depois, retornaram aos Estados Unidos para que a candidata à gestação pudesse ser escolhida. "Entrevistamos três mulheres antes de definir quem carregaria o nosso filho," conta.

Passo a passo da barriga de aluguel

Primeiro ultrassom 3D de Arthur: a ansiedade só aumentava
Primeiro ultrassom 3D de Arthur: a ansiedade só aumentava Imagem: Arquivo Pessoal

O processo incluía avaliações e condições como: já ter filhos, estar emocionalmente estável e em boas condições de saúde. Uma vez definida, a primeira tentativa foi feita com um embrião feminino, algo que fugiu do que havia sido acordado anteriormente.

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Acontece que, como assinado por Taíse e o marido, eram previstos dois embriões fertilizados, mas a escolhida ficou receosa e só autorizou a implementação de um, que acabou não dando certo. "Ela ficou arrasada. Me disse que só então conseguia entender a dor que eu sentia há anos", lembra.

Para a advogada, o receio e o trauma já eram muito grandes. "Me lembrou das minhas tentativas no Brasil. Teve uma vez em que estava tudo pronto para fazer a transferência do embrião e, horas antes, a moça do laboratório me ligou contando que, quando foram descongelar meus embriões e nenhum sobreviveu."

Depois de um respiro, Taíse concordou em seguir com a segunda tentativa via barriga de aluguel. Dessa vez, transfeririam dois embriões - dos quatro restantes que tinham. Dos dois, um vingou.

Gravidez confirmada, mas ainda existiam preocupações. "A gente fica pensando: será que ela está se alimentando bem? Está seguindo os cuidados médicos direitinho?", conta. O contato era frequente, mas o acompanhamento médico nos Estados Unidos é diferente do Brasil. "Aqui saímos do ultrassom com as imagens do bebê. Lá, se está tudo bem, não há imagem. Se enviam uma foto, é porque há algo errado. Isso me deixava aflita", relembra.

Taíse acompanhou cada etapa como podia, até quando o bebê completou seis meses de gestação, e ela e o marido viajaram para os Estados Unidos para vê-lo em um ultrassom 3D. "Foi muito emocionante ver o rostinho dele pela primeira vez. Esse foi um exame que, mesmo com tudo bem, pude ter a foto para mim".

Instinto materno e as leis do Tennessee

O pequeno Arthur fez mãe e barriga de aluguel quebrarem regras por puro amor
O pequeno Arthur fez mãe e barriga de aluguel quebrarem regras por puro amor Imagem: Arquivo Pessoal
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Taíse se hospedou na cidade de Chattanooga, no estado do Tennessee, à espera do parto. E foi em uma manhã de agosto de 2019 que ela recebeu a mensagem da escolhida: "Estou indo para o hospital". Taíse chegou a tempo de acompanhar tudo.

Cortei o cordão umbilical, foi tudo muito rápido. Se eu atrasasse 10 minutos, teria perdido o momento. Chorei tanto que o médico ficou assustado e perguntou: 'Quem é essa pessoa?'. A irmã dela respondeu: 'É a mãe'.Taíse Rayes, advogada

Arthur nasceu saudável e, seguindo o contrato assinado, a gestante poderia ficar com o bebê por até uma hora após o parto. Depois disso, qualquer contato era proibido. Porém, a puérpera tinha alguns pedidos: ela queria que seu filho mais velho conhecesse o bebê, e que suas amigas pudessem vê-lo. Taíse, se sentindo grata, topou ambas situações.

Nos dias seguintes, a advogada e mãe de Arthur também resolveu seguir seu instinto: apesar de não estar em contrato, passou a buscar o leite materno na casa da gestante para alimentar o bebê - e pagava por isso. Por garantia, sempre ia sozinha. "Todo mundo perguntava se eu não queria tentar amamentar. Mas eu já tinha tomado hormônios por dez anos, não queria mais um desafio", explica.

Foi aí que o recém-nascido apresentou sinais de refluxo, precisava de um medicamento recomendado pelo pediatra que estava no Brasil, mas que só poderia ser vendido com receita médica. Sem saber a quem recorrer nos EUA, pediu ajuda à mulher que pariu Arthur. "Ela disse que o filho dela também tinha refluxo e que tinha o remédio em casa. Me ofereceu e pediu o meu endereço."

Naquele momento, Taíse ficou mais dividida e insegura. Isso porque, as leis para barriga de aluguel nos EUA mudam de estado para estado e, onde elas estavam, mesmo com exames de DNA e um contrato detalhado, a gestante precisava confirmar diante do juiz que entregava voluntariamente o bebê.

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O registro no hospital é feito no nome da mulher que deu à luz, e é como se a considerassem legalmente "mãe", mesmo que não haja vínculo genético com o recém-nascido. Nessas situações, os pais biológicos têm de "adotar" os seus próprios filhos após o nascimento. E isso é feito em duas audiências, uma no início para protocolar o pedido, e outra ao final, quando o bebê veio ao mundo. Taíse temia que a escolhida para ser a barriga de seu filho se apegasse ao bebê.

Eu tinha medo mesmo. E se ela visse Arthur e mudasse de ideia? É por isso que costumam proibir esse contato. Mas, ao mesmo tempo, não podia deixar meu filho sofrendo e ela oferecia ajuda.Taíse Rayes, advogada

Ainda assim, de comum acordo, a puérpera foi até sua casa, pegou o bebê no colo, trocou a fralda, entregou o remédio e se despediu.. A mulher ofereceu ainda uma cadeirinha de bebê para ajudar a acalmar Arthur. Deu tudo certo.

Dias depois, chegou o momento mais esperado: a audiência final para oficializar a filiação. O tribunal, com um cenário imponente, parecia cena de filme, contou Taíse, que já não conseguia entender mais o inglês, e só focava na resposta que seria dada: sim ou não. "Ela afirmou com todas as letras: 'Sim, é o filho deles. Eu recebi para fazer isso'. O juiz bateu o martelo: 'It's done', 'está feito'. Foi um alívio imenso, o bater de martelo mais importante da minha vida", recorda a advogada

Um serviço pago não exclui a gratidão

A barriga de aluguel ou gestação por substituição é uma alternativa viabilizada por uma técnica de reprodução assistida que permite a parentalidade a indivíduos ou casais que não conseguem conceber ou gestar por conta própria. Tecnicamente, é um acordo legal em que uma mulher escolhida (chamada portadora gestacional ou barriga de aluguel mesmo) concorda em gestar e parir um bebê para outra pessoa ou casal, os futuros pais.

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É um serviço pago, regulamentado em alguns países, ainda que de forma diferente - e que, portanto, remunera a portadora gestacional pelo serviço.

"É um contrato burocrático, mas é emocional. Antes de voltar ao Brasil quis deixar algo especial para a mulher que carregou meu filho. Fui ao shopping e comprei um colar de ouro com um coraçãozinho. Queria que ela tivesse algo para lembrar desse momento tão especial." Na despedida, a advogada sentiu na pele o poder do momento, entregou o presente, agradeceu e ambas se abraçaram.

Foi emocionante. Hoje, olhando para trás, vejo que a família e amigas dela foram as únicas visitas que recebi na maternidade. Quem celebrou comigo foi a rede de apoio da pessoa que fez isso dar certo para gente.Taíse Rayes, advogada

Hoje, a advogada e o marido publicaram o livro "Por uma Chance", que conta toda essa jornada, e está disponível na Amazon em versão digital. "Queremos que nosso filho saiba o quanto foi desejado e o que passamos para tê-lo", diz. Além disso, desejam levantar um debate sobre a adoção no Brasil. "Muitos casais desistem porque o processo é burocrático demais. Enquanto isso, crianças crescem em abrigos. Queremos chamar a atenção dos legisladores para mudar essa realidade", defende.

3 comentários

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Astrogildo Candido da Costa

Seria bom se esse serviço fosse legalizado no Brasil. Há tantas pessoas querendo ter filhos e tantas mulheres que poderiam ganhar um bom dinheiro com isso, se quisessem ajudar essas pessoas. Todos sairiam ganhando.

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Elias Coelho Macedo

120 mil dólares, ou seja, quase 700 mil reais. Dá para ganhar uma grana legal, poderia ser legalizado aqui e tirar muita mulher pobre da favela.

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Walmir Francisco Sanches

Negocio da china $$$$$...

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