Golpe nas redes: Grávidas dizem como fotos acabaram em sites pornôs e fakes

No auge da empolgação em gestar pela primeira vez, Roberta Sellitti, 39, começou a postar fotos grávida. Nada demais, certo? Até que, gestando pela segunda vez, ela encontrou suas fotos grávida sendo usadas de forma indevida na intenet.

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As minhas imagens foram parar em uma conta de Instagram com uma conotação extremamente sexual. Com outras fotos de grávidas seminuas, com a perna aberta, fotos muito sensuais.Roberta Sellitti, 39, mãe de dois

A descoberta foi feita pelo acaso e gerou grande tensão. "Não me lembro ao certo como foi que as achei, se por estar grávida o algoritmo começou a me mostrar mais imagens de gestantes ou se alguém me marcou diretamente... Mas fiquei muito brava, achei um absurdo", desabafa. Em seguida, Roberta, começou a mandar mensagem para o perfil, pedindo para que apagassem as imagens.

As mensagens não eram respondidas e a brasileira, que vive na Austrália há dez anos, não pensou duas vezes: "Mandei mensagem para a Sheylli pedindo para me ajudar a denunciar o perfil, porque sabia do empenho dela contra esse tipo de abuso nas redes sociais", revela.

Sheylli Caleffi, a quem Roberta recorreu, é comunicadora e palestrante conhecida na internet, por desenvolver um trabalho intenso pela erradicação da violência sexual e on-line. Segundo ela, casos de roubos e uso indevido de imagens são muito mais comuns do que imaginamos.

Acontece muito, muitas vezes a pessoa não fica sabendo e, quando descobre, tem vergonha, achando que a culpa foi dela, o que não é verdade, é um crime organizado. Mas postar fotos é tipo de risco que você precisa ter certeza que quer correr, porque não tem como remediar. Mesmo que tirem a imagem do ar, não tem como saber quantas pessoas já acessaram.Sheylli Caleffi

Depois de um tempo, o perfil que publicou imagens de Roberta grávida respondeu alegando que as fotos eram públicas, já que o perfil era de Roberta era aberto - mas passados alguns dias foram apagadas. "Na época eu usava hashtags como 'gravidez' ou 'pregnancy'. Hoje meu perfil é fechado, justamente para ter essa privacidade, porque lá eu posto minha família", conta.

É preciso ter cuidado com todas imagens, até as mais inocentes, suas ou com seus filhos
É preciso ter cuidado com todas imagens, até as mais inocentes, suas ou com seus filhos Imagem: Getty Images | OR Images

Além disso, ainda que não seja simples, é possível conseguir a retirada de conteúdos ou até mesmo de sites apenas na internet "comum" (ou surface web), mas perde-se totalmente o controle quando o conteúdo vai parar da dark web - espaço da internet para o compartilhamento de dados sigilosos por meio de páginas criptografadas (fins legítimos), mas que também abriga atividades ilegais, como tráfico e pornografia.

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Casos vão de fotos em sites pornôs a crimes de identidade ideológica

Em uma rápida pesquisa rede afora, encontramos casos semelhantes ao de Roberta, como o da ex-jogadora da Seleção Brasileira de Baquete, modelo e influenciadora, Ingrid Vasconcelos, que também descobriu fotos suas roubadas e publicadas em sites de prostituição, em 2024.

"Ficaram com medo de me contar porque estou gestante", disse na época, contando que não tinha sido a primeira vez que algo assim aconteceu. As imagens eram de Ingrid antes de engravidar, mas - por terem sido usadas em sites internacionais - a ex-atleta sentiu muita dificuldade em conseguir que os conteúdos fossem apagados.

Com a médica otorrinolaringologista Sofia Borges, a situação foi diferente, mas não menos assustadora.

Por onze meses, eu fui Bianca. Por onze meses, fotos minhas, da minha filha, do meu enteado foram usadas por outra mulher para se passar por mim.Sofia Borges

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A pessoa que usou as fotos de Sofia entrou em um relacionamento à distância com um espanhol, que chegou ao Brasil para fazer surpresa para quem acreditava namorar e foi até o consultório da médica, onde o desconforto e uma grande confusão se deu.

Em 2024, a Human Rights Watch trouxe à tona outra realidade de dar medo: fotos de crianças e adolescentes brasileiros estão sendo usadas para criar ferramentas de inteligência artificial (IA) sem o conhecimento ou consentimento deles e dos responsáveis. As imagens são inseridas em um grande conjunto de dados para treinar as ferramentas e, pior; estas são usadas para criar deep fakes maliciosos (técnica que usa IA e conteúdos verdadeiros, como foto e vídeo, para gerar adulterações realistas).

Como se proteger -e sua família?

É possível viver uma gestação ou compartilhar a alegria da maternidade online sem correr perigo? Sim, desde que haja cautela.

Claro que a principal recomendação é não postar fotos, principalmente de bebês e crianças. Se for postar, evite postar com pouca roupa ou fotos dos pequenos sozinhos. Use imagens com família, amigos, porque é mais difícil de serem usadas. Hoje, com inteligência artificial é mais fácil, mas cuidar do ambiente já ajuda.Sheylli Caleffi, comunicadora, palestrante e ativista pela erradicação da violência sexual e online

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O recomendado é ter um perfil privado. "Tem gente que vai dizer que podem invadir o perfil, mas a probabilidade é muito menor. Mas um cuidado que tem que ter é só adicionar pessoas conhecidas", orienta.

A maternidade é linda e pode ser compartilhada, mas com cautela
A maternidade é linda e pode ser compartilhada, mas com cautela Imagem: Getty Images | Petri Oeschger

Se você não posta nas redes, mas compartilha suas imagens ou dos seus filhos em grupos de familiares e amigos no WhatsApp, atenção também. "Acredito que é melhor ter um perfil privado no Instagram. Se você envia no grupo, precisa contar lá que não quer que enviem as fotos para outras pessoas ou postem nos seus próprios perfis", observa a especialista.

Algo que todas nós podemos fazer ainda é apoiar a regulação das redes. "Elas não têm nem atendimento, se alguém roubar suas fotos a ajuda só vem com advogado, e olhe lá. Porque não tem lei, apesar de acharem que tem. As pessoas acreditam que regulação vai ser uma coisa terrível, mas não, só é preciso ter regras como qualquer outra empresa que funciona no país tem. Sem isso, as famílias são as mais prejudicadas."

Outras dicas importantes:

  • Seu ensaio gestante ficou maravilhoso? Compartilhe apenas algumas imagens em um perfil privado, fechado. Se quiser dificultar ainda mais, poste nos stories, apenas para um grupo de "melhores amigos";
  • O bebê nasceu? Poste só se for fundamental, de preferência com mais pessoas junto, de longe, de costas. Se for postar, nunca de fralda, com pouca roupinha, com perninhas abertas: os pais não veem maldade, mas é preciso aprender a ter um olhar de criminoso. A maldade realmente está no olho de quem vê - e não tem como garantir que quem está vendo é legal, mesmo que seja uma pessoa conhecida;
  • Cresceu um pouco? Evite postar imagens publicamente antes de seu filho ter 13 anos de idade: as redes não são recomendadas para pessoas com menos dessa idade. A criança não sabe dos riscos antes disso (e até depois!), e não tem como consentir;
  • Lembre-se: os pais não são donos da imagem dos filhos, e sim têm obrigação de protegê-los. Hoje já há casos de adultos que processam pais por terem se sentido expostos na infância.

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