"Mineração está em tudo: inclusive no seu celular", diz VP da Vale
Se você der uma rápida olhada ao seu redor neste momento, não importa onde esteja, vai encontrar no mínimo uns dez objetos essenciais para a sua vida - de panelas a canetas, passando pelo chuveiro, aspirador de pó, computador e até a cadeira em que está sentado. Tudo está ali graças a uma atividade polêmica entre ambientalistas: a mineração.
"As pessoas brigam com a mineração, mas não imaginam quantos minerais têm no seu inseparável celular. A mineração é essencial para este mundo que está aqui e não vai desaparecer. Ela precisa, isso sim, ser cada vez melhor e mais responsável. Este é o debate", pontua Malu Paiva, Vice-Presidente Executiva de Sustentabilidade da Vale.
Apesar de o Brasil ser um dos principais produtores de minérios do mundo e a atividade ser uma das bases da economia nacional, as críticas não são à toa. Entre outras questões, a mineração foi responsável por dois dos maiores desastres socioambientais que se tem notícia: o rompimento das barragens do Fundão, em Mariana, e da Mina Córrego do Feijão, em Brumadinho, ambas em Minas Gerais, nos anos de 2015 e 2019 - esta última sob a administração da Vale, que, desde então, vem tentando mostrar seus esforços de reparação e produção mais sustentável.
"Brumadinho foi um grande ponto de inflexão na vida da Vale. Com certeza esta empresa nunca mais foi a mesma", diz Malu.
Na entrevista a seguir, a executiva conta um pouco dos projetos ESG desta gigante, que é hoje a maior produtora de minério de ferro e níquel do mundo, da conservação na Amazônia, dos compromissos firmados e de como a tragédia de Brumadinho veio para abrir os olhos da companhia.
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Ecoa: A mineração é uma atividade economicamente essencial, porém é polêmica do ponto de vista ambiental. Você concorda?
Malu Paiva: As pessoas que brigam com a mineração são as mesmas que são incapazes de viver sem um celular. Você sabe quantos minerais estão presentes no celular? Dezenas. Os minérios são essenciais para o cotidiano de todos nós. Estão em tudo: nas panelas em que cozinhamos, nos fogões, geladeiras, equipamentos aéreos, até nos esportes, nas barras de futebol. Em tudo. Então, um primeiro ponto é que precisamos nos aproximar da sociedade. E o principal debate não é por que existimos e sim como existimos. Devemos fazer uma mineração melhor e não acabar com ela.
Ecoa: Isso é possível?
Malu Paiva: Sem dúvida. Nós somos os primeiros interessados na preservação porque dependemos da natureza. Não temos opção: vamos explorar onde estão os minérios. E precisamos que a área seja preservada, é interesse do nosso negócio. É por isso que investimos tanto em preservação: somos hoje responsáveis pela conservação de 800 mil hectares dentro da Amazônia, em Carajás - isso dá cinco cidades do tamanho de Londres. Usamos menos de 3% do território para produzir 60% do minério de ferro da melhor qualidade que a Vale tem. Então, a conclusão é clara: ao trabalhar de maneira responsável, você preserva o ambiente, gera desenvolvimento, e extrai o melhor produto. A área que a gente preserva é totalmente conservada - e tudo ao redor foi desmatado.
Ecoa: Então vocês estão sozinhos neste trabalho?
Malu Paiva: Ninguém faz nada sozinho. Uma mineração responsável significa honrar nossa presença na Amazônia. Para isso preciso de parcerias. Primeiro, temos parceria com indígenas, os verdadeiros guardiões da floresta. Tem também o ICMBio (Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade). O Fundo Vale já apoiou 35 iniciativas de impacto positivo e participou de quatro redes e alianças pela Amazônia, impactando 17 cadeias produtivas e beneficiando, direta e indiretamente, mais de 41 mil pessoas. Ao longo de 15 anos, a organização já investiu R$ 360 milhões na Amazônia e em outros biomas brasileiros, como o Cerrado, apoiando 120 iniciativas e 340 empreendimentos de impacto que promovem uma economia sustentável, justa e inclusiva. Ainda falando em Amazônia, temos o Instituto Tecnológico Vale Desenvolvimento Sustentável, instituição sem fins lucrativos mantida pela Vale, que atua como centro de pesquisa multidisciplinar. Estamos desenvolvendo, por exemplo, trabalhos com espécies em extinção e melhores mudas de cacau para se tornarem fonte de renda para a região. Tudo isso é parceria.
Ecoa: O que mudou para a Vale desde o desastre de Brumadinho?
Malu Paiva: Acredito que Brumadinho tenha sido um grande ponto de inflexão na vida da Vale. Com certeza esta empresa não é mais a mesma. Eu chamo a atenção para duas grandes transformações: a primeira é todo o trabalho voltado à segurança, que é prioridade absoluta, tudo foi redesenhado a partir daí. E teve o outro lado cultural: Brumadinho disparou uma grande mudança de cultura na empresa, de como atuar a partir daqui. Todos os dias trabalhamos para não ter mais Brumadinhos. Questionamos: será que somos uma empresa que dialoga com comunidades? Será que trabalhamos de maneira integrada, com uma visão melhor da operação? Será que tenho um diálogo aberto e transparente dentro e fora da empresa? Então abrimos para mais parcerias, entendemos que construir junto será melhor para todos.
Ecoa: Estes questionamentos passam também pela sustentabilidade?
Malu Paiva: Claro. As tragédias disparam aprendizados. Todos os eixos da mineração acabam convergindo para uma mineração cada vez mais sustentável. Hoje temos metas ligadas a questões ambientais, sem contar uma maturidade na agenda social muito maior do que antes. A exploração de um minério pode durar décadas em um mesmo lugar: então nosso objetivo é de que forma trabalhamos com a vizinhança para que ela siga gerando renda mesmo quando formos embora. Desenvolvemos um olhar de território, temos um plano de atuação territorial. Além disso, a meta de apoiar 500 mil pessoas a sair da extrema pobreza, com metodologia de Oxford e usada pelo Banco Mundial. Todas estas reflexões vieram depois de Brumadinho. Sabemos que ainda há muito a fazer e nosso plano é seguir em frente.
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