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Saúde

Sintomas, prevenção e tratamentos para uma vida melhor


'No ápice da pandemia, tive todos os sintomas de covid. Era câncer raro'

Thiago Monteiro, 29, teve leucemia em 2020 - Arquivo pessoal
Thiago Monteiro, 29, teve leucemia em 2020 Imagem: Arquivo pessoal

De VivaBem, em São Paulo

29/03/2023 04h00

Era agosto de 2020 quando Thiago Monteiro, 29, suspeitou que estava com coronavírus. Naquela época, não existia vacina e a doença ainda era muito recente. Em fase de isolamento social, as pessoas eram aconselhadas a permanecer em casa, principalmente se os sintomas eram leves.

Thiago, que é coordenador de uma empresa de tecnologia no Rio de Janeiro, dormia com ventilador ligado e, ao acordar, estava totalmente suado. "Apareceram, depois, sintomas respiratórios, como tosse, febre. Mais tarde, parecia que uma chave tinha virado: fiquei mal", lembra.

Quando voltou para a casa, achou que ia passar, mas o dia seguinte foi ainda pior. Além dos sintomas acima, ele começou a sentir uma dor muito forte do lado direito da barriga. Assim que chegou ao hospital, o médico pediu exames, entre eles, um hemograma, que analisa as células sanguíneas.

"Em questão de 30 minutos, saiu o resultado e tinha algo de diferente", conta. O médico fez diversas perguntas a Thiago, principalmente sobre hematomas ou caroços na pele. "Ele comentou que talvez fosse um quadro de leucemia, mas, para isso, eu precisava ser internado."

Cheguei no hospital pela manhã, achando que seria covid e ficaria afastado por um tempo. Acabei ficando internado 4 dias e saí com diagnóstico e tratamento de leucemia. Thiago Monteiro

Thiago Monteiro, 29 - Arquivo pessoal - Arquivo pessoal
Thiago descobriu leucemia em 2020
Imagem: Arquivo pessoal

Thiago estava com leucemia mieloide crônica, também conhecida pela sigla LMC, um tipo de câncer considerado raro que afeta a produção do sangue e a medula óssea. A doença é mais comum após 50 anos e, normalmente, não dá sintomas.

"Neste tipo de leucemia, há um acúmulo exagerado de algumas células maduras como os granulócitos. Mas, para dizer que é LMC, é preciso ter o cromossomo Philadelphia [anormalidade genética nos glóbulos brancos]", explica Mariana Serpa, médica do Centro de Oncologia do Hospital Sírio-Libanês (SP).

Quando a doença causa manifestações, os principais sintomas são:

  • Anemia
  • Cansaço e mal-estar
  • Dor no lado esquerdo do abdome, devido ao aumento do baço
  • Suor excessivo, principalmente à noite
  • Perda de peso
  • Sangramento fácil, hematomas e hemorragias nasais

Doença progrediu para fase mais grave

Após o diagnóstico, Thiago começou o tratamento com um medicamento por via oral, todos os dias —sem quimioterapia ou radioterapia. Ele seguia com o acompanhamento mensal para ver se o remédio estava funcionando ou se havia alguma alteração da doença.

Até então, ele conta que conseguia levar a rotina normalmente, sem grandes impactos. Mas quase 1 ano depois disso, a vida dele passou por uma outra mudança: a doença avançou e se transformou em uma leucemia linfoide aguda.

Tive uma embolia pulmonar e, ao fazer o exame, percebemos o avanço da doença. Aí sim entendi o que era leucemia 'de verdade' e todo o tratamento. Thiago Monteiro

Por que isso acontece?

Thiago Monteiro - Arquivo pessoal - Arquivo pessoal
Thiago durante tratamento do câncer
Imagem: Arquivo pessoal

Quando o paciente não responde ao tratamento da leucemia mieloide crônica, a célula tronco fica geneticamente instável, podendo adquirir novas alterações genéticas.

"Ocorre um 'bug' e ela não consegue produzir mais nada. Com isso, há um acúmulo de blastos [unidades celulares imaturas]. Essa é a fase aguda da doença, muito mais intensa", diz a médica.

Diferente da LMC, esse tipo de leucemia é mais agressivo e costuma atingir mais crianças do que adultos —por isso, mais uma vez, o quadro de Thiago era considerado raro. Os sintomas são parecidos com os da leucemia mieloide crônica, veja:

  • Anemia
  • Perda de peso
  • Dor óssea
  • Febre
  • Sangramentos pelo corpo, como nariz, gengiva, pelas fezes ou vômito
  • Manchas roxas pelo corpo e pintas vermelhas
  • Infecções frequentes
  • Tontura
  • Falta de ar

"Achei que ia morrer"

Foi um susto quando Thiago descobriu o "novo" diagnóstico, pois a única forma de tratar a LLA é com transplante de medula óssea. Mas antes disso, o paciente precisa passar pela quimioterapia e radioterapia.

Neste período, não reagia bem à quimioterapia. Fui parar na UTI porque tive uma infecção grave. Naquele dia, a equipe médica achou que ia me perder. Passei por alguns momentos que pensava ser o fim. Thiago Monteiro

Thiago Monteiro, 29 - Arquivo pessoal - Arquivo pessoal
Thiago ao lado do namorado Nicholas
Imagem: Arquivo pessoal

Superado o problema, Thiago seguiu com o tratamento. No total, foram 8 sessões de quimioterapia. Enquanto isso, ele ainda procurava por um doador. Com três irmãos, apenas um deles foi compatível. "O meu irmão mais medroso, que foge dos médicos, era minha última opção, mas foi totalmente compatível", conta.

Quando decidiu passar pelo procedimento, começou a se questionar. "Estava ciente que muitas coisas poderiam acontecer, inclusive a morte", diz. "Conversei com a psicóloga, com minha mãe, meus médicos, busquei outras opiniões e decidi encarar."

Em agosto de 2022, Thiago passou pelo transplante de medula. Foram 45 dias internado, principalmente por complicações.

Uma semana depois, estava esgotado, tanto psicologicamente quanto fisicamente. Só falava que queria descansar. Thiago Monteiro

Quando mais uma semana passou, ele começou a sentir as melhoras. Voltou a comer, fazer fisioterapia e enxergar as coisas de outra forma, com mais ânimo.

Depois de mais uma cirurgia para tratar uma sinusite "pesada", ele se recuperou e voltou para casa. "Foi aquela coisa: vi todos os meus amigos, mas precisava tomar cuidado, sem contato próximo. Ficava isolado, usando máscara, e sem sair de casa. Só em dezembro me permiti fazer algumas coisas".

Como funciona o transplante de medula óssea?

  • O primeiro passo envolve testes de compatibilidade, para analisar amostras de sangue do doador e de quem vai receber.
  • A ideia é buscar a melhor compatibilidade possível para evitar rejeição da medula e outras complicações.
  • A partir disto, o doador é submetido a um procedimento feito em centro cirúrgico, com anestesia.
  • São realizadas múltiplas punções, com agulhas, nos ossos posteriores da bacia e é aspirada a medula.
  • O paciente, então, recebe a medula sadia como se fosse uma transfusão de sangue.
  • Uma vez na corrente sanguínea, as células da nova medula circulam e vão se alojar na medula óssea, onde se desenvolvem.

Vida nem tão normal, mas muito melhor

Thiago Monteiro, 29 - Arquivo pessoal - Arquivo pessoal
Thiago voltou a ter uma rotina que considera perto do normal
Imagem: Arquivo pessoal

No momento, a doença está controlada e Thiago segue tomando o imunossupressor, medicamento que evita a rejeição do organismo após transplante. Ele faz acompanhamento com o médico, além de exames específicos de controle, e tenta levar uma vida normal.

"Falamos em 'vida normal', mas na teoria, não é tão normal ir ao hospital de 15 em 15 dias, fazer exame de punção na medula óssea. Mas comparado com o que passei no último ano, em momentos que quis desistir, estou levando uma vida muito melhor", explica o jovem.

Por fim, Thiago lembra que, raramente, fazia o hemograma —exame que os médicos costumam pedir anualmente. "Isso foi determinante. Se eu não tivesse ido ao hospital logo no começo, achando que era uma simples covid, a situação poderia ter sido diferente."