'Armadilha', novo filme de M. Night Shyamalan, é uma verdadeira cilada!
"Armadilha" segue um padrão ingrato de parte dos filmes de M. Night Shyamalan. O thriller com Josh Hartnett parte de uma ideia genuinamente intrigante, dispõe as peças no tabuleiro com certa habilidade, mas derrapa desastrosamente na linha de chegada. Existe paixão e compromisso no trabalho do cineasta, o que deixa o resultado caótico ainda mais frustrante.
Essa repetição aos poucos vai minando a confiança na habilidade de Night em criar espetáculos surpreendentes, sua marca registrada desde que derrubou nosso queixo coletivo com "O Sexto Sentido". O suspense com Bruce Willis, porém, já completou seus 25 anos, e talvez seja o momento de arriscar um território que não dependa de alguma reviravolta mirabolante.
A verdade é que "Armadilha" bem que tenta, sem sucesso, ser esse filme. A trama acompanha o bombeiro Cooper Adams (Hartnett), que leva sua filha pré-adolescente ao show de sua cantora pop favorita, a estrela Lady Raven (Saleka Shyamalan, filha do diretor, que ganha aqui um empurrão paterno). O evento, contudo, é uma armadilha do FBI para capturar um serial killer: o próprio Cooper, que agora precisa dar um jeito de escapar.
A revelação, claro, não causa nenhum espanto, já que a identidade do personagem de Hartnett foi escancarada desde o primeiro trailer. "Armadilha" se supera, porém, ao se apresentar como um suspense sem uma gota de suspense. Não existem riscos, não há tensão e toda arquitetura da trama, ambientada quase que por completo dentro de um estádio, flerta com conveniências e coincidências que destroem sua credibilidade.
Desde o primeiro momento, Cooper age na arena como se fosse invisível. Ele agride pessoas aleatórias para criar distrações sem muita consequência, entra sem ninguém questionar em uma reunião de policiais e agentes federais e tem o plano do FBI entregue de bandeja por um vendedor de camisetas (!), que conta a um estranho e sem pestanejar todos os detalhes da caçada pelo serial killer.
Nem vou entrar no mérito de o show de Lady Raven parecer interminável (o filme é basicamente o registro ao vivo da performance de Saleka) e Cooper sair e entrar do meio da multidão em uma dúzia de ocasiões, deixando sua filha sozinha sem pensar duas vezes. Basta dizer que, quando a trama entra em seu terço final, o tsunami de absurdos aproxima o tom de "Armadilha" da paródia e da comédia involuntária.
Nada disso, vale ressaltar, abala o compromisso de Josh Hartnett com o personagem. Experimentando uma espécie de renascimento no mainstream desde que ressurgiu ano passado em "Oppenheimer", o ator traz aqui uma performance regrada, trazendo simpatia a um assassino capaz de atos inomináveis. O resto do elenco, o que inclui uma Alison Pill apagada e o próprio Shyamalan mais canastrão do que nunca, é perfeitamente esquecível.
No fim das contas, "Armadilha" é M. Night Shyamalan em modo passivo, indisposto a correr riscos ou arriscar caminhos mais ousados. Essa inércia resulta em seu filme mais enfadonho, uma tolice presa em uma trama prosaica que pertence a uma série policial barata, e não ao cineasta que redefiniu nossa percepção de suspense.
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