Cris Guterres

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Opinião

Afroluxo: o verdadeiro luxo é criar experiências que acolham e representem

O mercado de luxo no Brasil, e no mundo, ainda carrega um paradoxo inquietante: alimenta-se da criatividade negra, mas rejeita a presença negra. Um setor que consome estética, ritmo e simbologia da cultura negra, mas que hesita diante do corpo quando ele atravessa a porta da frente como consumidor. Mas em um cenário onde muitas empresas ainda resistem a rever esse modelo excludente, o Grupo L'Oréal no Brasil tem se destacado por fazer justamente o contrário: assumir o compromisso de transformar esse mercado por dentro.

Por muito tempo, o que foi considerado sofisticado, exclusivo, desejável, foi construído sob um olhar eurocentrado. Luxo era o que imitava a Europa. Negritude era o que precisava ser contida, escondida. Mas essa lógica tem sido confrontada e o conceito de Afroluxo surge como resposta: uma forma de afirmar que potência, sofisticação e ancestralidade também caminham com a pele preta.

No último dia 7 de maio, o Grupo L'Oréal no Brasil foi reconhecido com o Prêmio Sim à Igualdade Racial 2025, na categoria Empregabilidade e Comprometimento Racial — uma premiação organizada pelo ID_BR (Instituto Identidades do Brasil), que destaca empresas e lideranças que promovem a equidade racial de forma efetiva. A escolha da L'Oréal reflete um compromisso consistente com a inclusão de profissionais negros e indígenas em diferentes níveis hierárquicos e com ações que vão além da retórica, promovendo mudanças concretas na cultura corporativa e na experiência do consumidor.

Cris Guterres e Eduardo Paiva, diretor de Diversidade, Equidade e Inclusão do Grupo L'Oréal no Brasil
Cris Guterres e Eduardo Paiva, diretor de Diversidade, Equidade e Inclusão do Grupo L'Oréal no Brasil Imagem: Luis Madaleno

Nesse mesmo evento, dedicado à valorização da presença negra nos espaços de prestígio, o conceito de Afroluxo se firmou não apenas como linguagem estética, mas como uma ferramenta poderosa de inclusão. Durante a cerimônia, conversei com personalidades negras como Djonga, Gaby Amarantos, Ítalo Silva, Majur, entre outras vozes potentes, sobre o que significa Afroluxo, e todas foram enfáticas: Afroluxo é pertencimento com dignidade. É ocupar espaços de prestígio sem precisar deixar a identidade no cabide. É desfilar com a cabeça erguida, com orgulho das próprias raízes, sabendo que luxo também é carregar uma história, uma estética e uma vivência que o mercado tentou apagar. É estar presente não apenas como consumidor, mas como criador, referência e protagonista.

É nesse contexto que o Grupo L'Oréal no Brasil tem se relacionado com o conceito de Afroluxo, saindo do discurso e partindo para a prática. Em parceria com o MOVER e a Black Sisters in Law, o grupo lançou o Código de Defesa e Inclusão do Consumidor Negro, um conjunto de propostas que busca transformar a experiência de pessoas negras no varejo de luxo. O lançamento aconteceu justamente durante o evento do ID_BR — e não por acaso. Num tempo em que tantas empresas silenciam sobre equidade racial, a L'Oréal fez o que se espera de quem se diz aliado: agiu.

Durante a comemoração, Eduardo Paiva, diretor de Diversidade, Equidade e Inclusão do Grupo L'Oréal no Brasil afirmou: "É um trabalho coletivo de muitos anos. Hoje é dia de celebrar uma trajetória e reforçar nosso compromisso com um futuro em que a igualdade racial seja ponto de partida. Celebramos a beleza brasileira com a certeza de que seguiremos transformando e movendo barreiras".

A importância desse gesto se apoia em dados que revelam o tamanho da desigualdade: segundo a pesquisa Racismo no Varejo de Beleza de Luxo, 90% dos consumidores negros das classes A e B já vivenciaram situações de racismo nesse setor. Mais da metade desistiu da compra após a experiência. Atualmente, 37% dos brasileiros das classes A e B se autodeclaram pretos ou pardos, e esse grupo já movimenta cerca de 40% do PIB nacional.

Ainda assim, o corpo negro continua sendo alvo de vigilância, interrogação silenciosa e atendimentos marcados por desconfiança. O mercado de luxo, historicamente associado à branquitude, mostra resistência em reconhecer sujeitos negros como consumidores legítimos.

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Como afirmou Grada Kilomba, "ser sujeito é ser ouvido". E há espaços onde a voz negra ainda é silenciada antes mesmo de se manifestar.

Repensar o setor de luxo exige mais do que campanhas publicitárias inclusivas. Requer mudanças estruturais: mais profissionais negros em cargos de liderança, mais produtos que respeitem a diversidade de corpos e peles, mais políticas internas orientadas pela equidade. Exige que o "exclusivo" não seja, na prática, sinônimo de exclusão.

O reconhecimento da L'Oréal é um marco importante, mas também um lembrete: há caminhos possíveis, e necessários, para construir um mercado mais justo, mais coerente com a realidade do país e mais alinhado com as expectativas de uma nova geração de consumidores.

Porque o verdadeiro luxo está em criar experiências que acolham, respeitem e representem, e não em repetir estruturas que historicamente negaram acesso.

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Texto em que o autor apresenta e defende suas ideias e opiniões, a partir da interpretação de fatos e dados.

** Este texto não reflete, necessariamente, a opinião do UOL.

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