Topo

Olhar Olímpico

Candidato ao COB, Hélio Meirelles critica teto de gastos administrativos

Hélio Meirelles, candidato a presidente do COB - Divulgação
Hélio Meirelles, candidato a presidente do COB Imagem: Divulgação

06/10/2020 12h00

Faltavam dois dias para o fim do prazo de inscrições de chapa quando um grupo de cinco confederações bateu o martelo e decidiu que não apoiaria nenhuma das três chapas que, naquele momento, concorriam pela presidência e vice-presidência do Comitê Olímpico do Brasil (COB). Lançariam Hélio Meirelles Cardoso para presidente e, diante de negativas de ex-atletas mulheres convidadas, o medalhista olímpico Robson Caetano para vice.

Um mês depois, Meirelles, que é presidente da Confederação Brasileira de Pentatlo Moderno desde 2002, segue tendo o apoio público apenas daquelas quatro entidades que compõem um mesmo grupo político desde 2016. Mesmo assim, ele diz que manterá a candidatura até a votação, amanhã cedo, no Rio. O blog noticiou ontem que o grupo, que tende a ser eliminado no primeiro turno, apoiará Rafael Westrupp em um eventual segundo turno.

Representante do que pode ser descrito como baixo clero do movimento olímpico, de confederações sem patrocinadores privados e com poucas medalhas olímpicas somadas, Meirelles ataca o teto de 25% de gastos nas atividades meio. "Não posso ter área de marketing, advocacia, auditoria constante, porque não tem dinheiro", afirma.

Meirelles conversou com o Olhar Olímpico por cerca de uma hora, na última sexta-feira (2), por vídeo chamada. Naquela mesma tarde, a reportagem também entrevistou Paulo Wanderley, por ligação telefônica. A entrevista com o candidato à reeleição pode ser lida nesse link.

O terceiro candidato desse pleito, Rafael Westrupp, presidente da Confederação Brasileira de Tênis, não aceitou gravar entrevista, abrindo mão de responder sobre a interferência política citada por Wanderley, sobre o processo eleitoral a toque de caixa para se garantir por mais quatro anos na CBT, e sobre como pretende viabilizar a promessa de colocar o COB para ocupar o Parque Olímpico. As perguntas sem resposta estão publicadas neste texto.

+ Acompanhe o que mais importante acontece no esporte olímpico pelos perfis do Olhar Olímpico no Twitter e no Instagram. Segue lá! +

Além das questões específicas a cada um dos candidatos, o Olhar Olímpico fez seis perguntas padronizadas, sobre assuntos objetivos, como o pagamento de salário para os membros da Comissão de Atletas. Essas perguntas são as últimas da entrevista abaixo:

Olhar Olímpico - O que te faz querer ser presidente?

Hélio Meirelles - A vontade não nasceu de agora. Nasceu há quatro anos, quando cinco confederações tentaram inscrever uma chapa na eleição do COB. Naquela época, o estatuto era draconiano. Dez confederações, de 30, precisavam endossar uma chapa e o candidato precisava ter cinco anos no cargo. Não foi possível fazer essa chapa, então continuamos juntos, conversando, dialogando. Propusemos medidas de melhoria já na gestão Paulo Wanderley. Chegando no processo eleitoral, conversamos com as três chapas, tentando compartilhamento de gestão. Queríamos indicar o vice. Nenhuma das chapas concordou com essa proposta. Nosso grupo tem cinco presidentes de alta competência, mas a escolha recaiu sobre meu nome e procuramos depois o Robson. Decidimos que teríamos um atleta como vice. Tínhamos uma lista com cinco mulheres, ex-atletas, tínhamos preferência pelas mulheres, mas nenhuma aceitou. Voltamos aos homens e o Robson foi o escolhido.

Vocês chegaram a estar próximos do Rafael Westrupp, no mesmo grupo político. Por que racharam?

O grupo embrião foram essas cinco: pentatlo, tênis de mesa, remo, tiro esportivo e levantamento de peso. Nós que começamos a elaborar o programa de trabalho para oferecer ao Paulo. Não queríamos que acontecesse agora o que aconteceu em 2016, quando não houve debate sobre programa. Ainda em março, abril, oferecemos essa plataforma, mas não pensávamos em candidatura. Ao longo do tempo fomos incorporando presidentes interessados numa contribuição técnica sem almejar candidatura, mas o grupo foi crescendo e chegou um momento que o grupo achou que tínhamos condições de lançar candidatura. Alguns presidentes tinham uma opinião, nosso grupo tinha outra, e achamos melhor dividir.

Vocês negociam uma composição com Rafael ou Paulo no caso de um eventual segundo turno?

A nossa campanha é um pouco massacrada. Nós saímos depois tendo que compor uma série de detalhes, principalmente em relação ao Robson, que não conhecíamos. Nossa chapa, embora ela tenha dois corredores, eu e ele, teve que ajustar muitas coisas antes de entrarmos em campo. Nós estamos focando a nossa candidatura. Não avaliamos como vai ser nosso comportamento no dia 7. O que combinamos é que essa conversa vai acontecer a partir do dia 5. [NR: a entrevista foi realizada no dia 2, sexta. Na manhã do dia 5, ontem, os grupos de Hélio e de Rafael já haviam chegado a um acordo. Hélio nega.]

O senhor está há quase 20 anos no comando da Confederação de Pentatlo Moderno. Após esse tempo, o pentatlo só está em cinco estados do país e não tem um patrocinador privado. O senhor tem responsabilidade sobre isso?

Claro. Sou presidente, tenho responsabilidade. Tem vários aspectos fundamentais. O primeiro é a dificuldade em relação à Lei Piva. As federações não têm dinheiro, o dinheiro é descentralizado. Como a confederação não tem recurso privado, a federação também não tem, então a confederação é responsável por uma série de despesas. O pentatlo é muito confuso, muito complicado. A confederação não tem condições de ter 10 cavalos em cada estado. Ficamos dependendo de parcerias nas principais capitais para alugar cavalo e dar treinamento. Com recurso da Lei Piva a gente não consegue alimentar mais locais interessados em treinamento, o custo é muito alto. Por isso não temos uma abrangência. Com relação ao recurso privado, é também um problema que as confederações pequenas têm. Para nós, o problema é bem maior porque não temos muito praticantes. Mesmo quando tínhamos a Yane Marques, foi tentado patrocínio com o Banco do Brasil que não deu certo por diversos motivos. A questão do patrocínio é geral para todas as confederações. Aquele limite de 25% é mortal.

Como assim?

Não tenho nada contra colocar exigências para a gestão ser isso, ser aquilo, ouvidoria, não sou contra. O caminho é esse. Mas tem um problema. Ninguém faz conta de quanto custa isso. Em setembro do ano passado estive na Câmara dos Deputados para apresentar nosso planejamento para Tóquio e levei no final a lista de atividades meio que eu tenho que cumprir com 25% dos repasses. É impossível. Não posso ter área de marketing, advocacia, auditoria constante, porque não tem dinheiro.

Dentro desse teto de 25% entra o salário do presidente. A confederação de pentatlo tem R$ 60 mil por mês para atividade meio. Mesmo sendo pouco, os presidentes de confederação costumam ficar com até R$ 23 mil. Não está aí o gargalo?

Estamos de acordo com a lei. Não acho justo que as pessoas tenham essa responsabilidade de tocar uma confederação sem ter uma remuneração. O valor da minha remuneração é da ordem de 16 mil reais, não vejo um absurdo em relação a isso. A remuneração foi colocada para que você tenha pessoas gabaritadas, interessadas na administração da confederação. Quando foram colocadas várias responsabilidades sobre a confederação, a remuneração veio como contrapartida.

O senhor tem criticado a falta de transparência do COB. Mas eu não consegui identificar, nos documentos da confederação, como foi feita a divisão dos recursos para as federações estaduais. Por que como presidente do COB o senhor faria diferente?

É totalmente diferente da questão do COB porque eu estou manuseando 2,8 milhões. O meu plano está lá no site. No COB são 300 milhões de reais. Quando eu falo em transparência é que o COB não coloca as verbas extra que o conselho decide durante o ano para cada confederação. Um dos presidentes que apoia a chapa conseguiu essa informação. Eu fiquei estarrecido. [ele se refere às doações de mais de R$ 1 milhão, em recursos privados do COB, para as confederações de desportos aquáticos e basquete]. Esse repasse meu para as federações está dentro da parte do COB, é um projeto aprovado pelo COB. Eu não tenho liberdade para decidir para quem vou mandar dinheiro. Não é aberto porque os valores são irrisórios. São R$ 30 mil, R$ 20 mil.

O senhor promete que, se eleito, uma mulher será chefe de missão em Paris-2024. Mas seu candidato a vice já foi acusado de agredir uma mulher. Não é contraditório?

Aí a pergunta tem que ser para ele. Eu escolhi ele, mas não fiquei identificando a questão pessoal dele. Esse incidente na vida dele não foi motivo de o nome dele ser vetado pelo Conselho de Ética. Entendo que ele está apto a participar do pleito eleitoral.

Há reclamação, nos bastidores, de que o Paulo Wanderley estaria usando prestações de contas das confederações como uma forma de pressionar para ser reeleito. Existe queixa no seu grupo?

Da nossa parte, não. O que há é que de vez em quando alguém relata que foi procurado para conversar sobre acordo no segundo turno. Mas não identificamos nenhuma atitude que possa ser configurada como pressão.

Quando a Yane Marques se preparava para brigar por medalha olímpica, o investimento feito pelo COB foi direto nela, alijando a confederação. O modelo deu certo, gerou medalha. Com o senhor como presidente do COB, esse modelo seria mantido?

Eu tenho dito que a confederação preparou durante muitos anos uma atleta excelente. Nisso, méritos da confederação de ter preparado. Para ser medalhista havia necessidade de haver investimento muito maior, que a confederação não poderia fazer. O resultado foi que tivemos uma medalhista olímpica. Eu não tenho arrependimento em relação ao investimento ter sido feito pelo COB para formar a Yane. Fui pragmático em relação ao que estava acontecendo. Esse modelo tem várias críticas, o COB assumir responsabilidade integral de colocar um atleta a ponto de ser medalhista, esse modelo é muito contestado.

O senhor tem criticado a atual gestão do COB por perder protagonismo. Disse que, em uma eventual gestão sua, o COB vai deixar de ficar como avestruz, com a cabeça no buraco. Quando o governo federal recentemente cancelou o edital do Bolsa Atleta, como o senhor e confederação se portaram?

Quando tem qualquer decisão política em relação ao esporte, evitamos tomar medidas isoladas, chegar um presidente e bater na porta. Tivemos dois exemplos recentes, a questão da Lei 1376 (em 2018), que sumiu o dinheiro do esporte, as confederações se uniram, e agora no PL 2.824 houve outra união. Nós procuramos atuar de uma forma conjunta. Não há medida isolada, porque isso só complica.

O senhor citou exemplo de dois projetos que impactam diretamente as finanças das confederações. Houve, de fato, união. Mas e quando o afetado é o atleta? E por isso cito o cancelamento do Bolsa Atleta. O senhor liderou algum movimento, mesmo que no grupo dos presidentes de confederação?

Eu fiquei aguardando e estou aguardando uma movimentação do grupo de confederações para resolver o problema. Esse é o comportamento recomendado. Não fui voluntarioso. Nesse assunto das bolsas, que deve ser refletido no início do ano que vem, podemos também, certamente iremos, ter uma movimentação no momento adequado. Por enquanto a decisão foi aguardar.

O grupo do senhor votou contra o aumento para 12 atletas com direito a voto na assembleia do COB. O senhor já explicou que não estava pessoalmente presente naquela assembleia, que o voto da confederação foi dado por outra pessoa. Mas todos do seu grupo votaram contra a proposta. Falando como grupo, o grupo se arrepende?

A proposta que foi levada na assembleia seguinte, de aumentar então para 19 atletas na comissão, foi levantada por um dos representantes do nosso grupo, pelo presidente da confederação de tiro. Saiu do nosso grupo a proposta conciliadora. Vamos olhar para frente. Para nós, esse fato foi superado. Não temos que ter nenhum resquício, nenhuma mágoa. Temos uma campanha direcionada à comissão de atletas, para compartilhar a gestão conosco. Foi um fato que aconteceu no passado.

Abaixo, sete perguntas objetivas feitas tanto a Paulo Wanderley quanto a Hélio Meirelles.

O senhor defende o pagamento de salário aos membros da Comissão de Atletas?

Acho que é um pleito muito justo dos atletas. Há um mês o COB aprovou a concessão de jeton [remuneração por reunião] para os membros dos poderes do COB. É um avanço em termos de remunerar quem dá seu tempo. Como o COB avançou nisso, acho que é mais do que justo. Quanto eu não sei.

Em uma eventual reeleição, o número de funcionários do COB vai aumentar ou diminuir na comparação com agora?

Vou estudar. Não posso tomar decisão agora

O governo anunciou apoio aos Jogos Escolares organizados pela Confederação Brasileira do Desporto Escolar. O COB, que vem organizando os Jogos Escolares nas últimas décadas, vai seguir realizando seu próprio evento?

Não tem sentido isso. Não vou destinar recursos se a CBDE tem recursos para isso.

O conselho de administração será presidido pelo senhor?

Não. Nossa proposta, que vamos submeter para a assembleia, já está definida no programa, é que o presidente do conselho não seja o do comitê. Mas a decisão passa pela assembleia.

O senhor vai aumentar ou reduzir o repasse às confederações? Em quantos pontos percentuais?

Essa questão é um ajuste que precisamos fazer. Para as pequenas é insuficiente para ter uma gestão. Vamos ter que decidir o orçamento de 2021 agora. Não sei quem vai ser o presidente em novembro. O Paulo pode querer ir até o final do ano.

A eleição da CACOB deveria ter sido adiada?

Ali tem argumentos dos dois lados. O estatuto tinha que ser preservado, mas as principais entidades adiaram. Todo mundo prorrogou a eleição para o ano que vem. É uma análise jurídica. Poderia ter havido uma negociação melhor. Não fui o autor da ação, não sei que conversa eles tiveram antes de procurar a Justiça.