Tony Marlon

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Opinião

Por que jogadores brasileiros permanecem em campo em casos de racismo?

No último sábado, o zagueiro Léo, do Athletico-PR, ainda estava em campo buscando mudar a decisão do juiz sobre a sua expulsão no clássico paranaense, quando um torcedor do Coritiba passou a fazer ataques racistas contra ele.

No Brasil, a certeza da impunidade é tão grande que o crime está gravado. Pelo ângulo da filmagem, aparenta ter sido pela própria pessoa. Parou nas redes sociais. Mas só resulta em dor, nada mais. Até quando?

Ao fim da partida, o capitão do Athletico-PR, de 28 anos, disse ser inadmissível o que aconteceu. É e sempre foi. Mas, pela repetição dos casos, ano após ano, e pelas respostas das pessoas e autoridades ligadas ao futebol e de fora dele, é só mais um caso isolado que acontece semana sim, semana também. O Brasil é um país que finge que não é com ele.

"Quem grita ofensa racista comete crime, mas quem escuta e finge que nada aconteceu também tem culpa. O silêncio alimenta o racismo, e isso precisa acabar", disse Léo em entrevista. Vale para quem está ao redor de quem comete o crime. E vale para jogadores, clubes, federações, patrocinadores e a CBF. A bola está com vocês. Nada?

O que muitas pessoas esperam dos profissionais do futebol, no mínimo, foi o que o time feminino do Grêmio fez ano passado, em partida contra o River Plate pela Ladies Cup.

Quando uma jogadora do clube argentino imitou um macaco em direção a uma gandula, o Grêmio se recusou a continuar o jogo, deixou o gramado. Em entrevista ao canal SporTV na época, a técnica Thaissan Passos foi ao ponto: "Para a gente, não tem condições nenhuma de jogo".

Mas Léo foi expulso perto dos 30 minutos do primeiro tempo, no Estádio Couto Pereira. E a partida seguiu até o apito final.

E se os clubes se retirassem do campo ao saberem o que aconteceu? Contassem à torcida que foi por isso que largaram tudo? E se os capitães se juntassem numa coletiva e dissessem: de agora em diante, nunca mais. Não contem com a gente para sustentar a dor, ao vivo.

O gesto chamaria alguma atenção do país, do mundo. Quem deve e pode fazer alguma coisa para que essa violência pare de uma vez por todas, com certeza, começaria a se mexer em minutos.

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Se tem uma coisa que quem está sentado no poder tem medo é de perder o lugar na cadeira. Uma propaganda negativa ajuda um bocado nisso, e disso a gente sabe.

Marcelo Carvalho é do Observatório da Discriminação Racial no Futebol. Uma proposta importante que busca há alguns anos convidar todo mundo que se relaciona com o negócio futebol no Brasil a se juntar na luta contra o que aconteceu ao Léo.

"A gente tem tudo para punir quem comete esse crime. Mas quando cai na justiça, não acontece. Estamos vendo vários casos de racismo fora do futebol em que o judiciário está absolvendo os acusados", destaca Marcelo. "Isso dá a certeza de que nada vai acontecer, a sensação de impunidade", diz.

O Observatório faz um trabalho em muitas frentes. Com jogadores, clubes, federações. Patrocinadores. Solta anualmente um estudo detalhando os casos de racismo no futebol brasileiro, por todo país. E o que aconteceu com eles, depois que deixam de ser notícia nos jornais.

Para Marcelo, "precisamos fazer com que a sociedade entenda a gravidade do racismo". E que as pessoas, todas elas, estejam comprometidas em lutar contra este crime.

Estamos ainda nesse degrau. Essa conversa é sobre todo mundo, é com todo mundo. O caminho é longo. Coisas como todo mundo abandonar o campo em um jogo? Parecem distantes no horizonte. Mas é preciso continuar falando do assunto. Não existe outra opção.

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"Infelizmente a gente percebe que este não é um debate entre os jogadores. Só olharmos o caso do Vini Jr, que, sozinho, tem se mobilizado para atitudes mais práticas, como sair do campo, e a gente vê que outros jogadores dizem, inclusive, que ele está errado", diz Marcelo.

Mas não está. Até quando tantos outros jogadores seguirão se indignando por meio de suas assessorias de imprensa?

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Texto em que o autor apresenta e defende suas ideias e opiniões, a partir da interpretação de fatos e dados.

** Este texto não reflete, necessariamente, a opinião do UOL.

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