Francisco, um papa preocupado com o excesso de telas

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Vira e mexe e eu trago a este espaço pessoas e organizações que têm problematizado o uso excessivo do celular ou das redes sociais, especialmente por crianças e adolescentes. Pouco antes de sua passagem, o papa Francisco, uma das principais lideranças de fé no mundo, fez o mesmo. Não foi a primeira vez. Problematizar é trazer um assunto para o debate, querer conversar sobre ele. E isso é bom.
No começo do seu último mês de vida, Francisco pediu que as pessoas "olhassem menos para as telas e se olhassem mais nos olhos uns dos outros". Alertou que as relações estavam se transformando em simples contatos. Na nossa roda de amizades, quantas pessoas correm para o celular ao menor sinal de pausa da conversa? A preocupação de Francisco, que é a preocupação de tanta gente ao redor do mundo, apareceu outras diversas vezes em discursos e orações.
Em sua mensagem especial para o Dia Mundial da Juventude, em 2017, alertou: "Nas redes sociais, vemos rostos de jovens aparecendo em muitas imagens retratando eventos mais ou menos reais, mas não sabemos o quanto disso tudo é realmente 'história', uma experiência que pode ser comunicada, dotada de propósito e significado". Completou pedindo que as pessoas "não se deixem levar por essa falsa imagem da realidade". Pronto, um dos grandes problemas do nosso tempo é justamente este.
O que está numa rede social não é a realidade, é a nossa interpretação dela. Muitas vezes, editada. E edição é: escolher o que fica de fora, escolher o que ganha destaque. Escolher: a cor, o ângulo, o jeito de contar uma história. E o jeito de contar uma história induz o olhar. No fim, é o que fica: somos um monte de gente longe de quem está perto, perto de quem está longe, buscando entender um mundo cada vez mais complexo não pelo que acontece nele, mas pelas interpretações que as redes sociais nos entregam, todos os dias.
"Não permitir", Francisco chamou a atenção, "que algoritmos limitem ou condicionem respeito pela dignidade humana, ou excluam compaixão, piedade, perdão e, acima de tudo, a esperança de que as pessoas são capazes de mudar".
Em tempos de grandes plataformas na mão de meia dúzia dos mesmos de sempre, que a gente até pode dizer que não, mas que levam o nosso olhar coletivo para lá e para cá, alguns seres humanos vão se transformando em menos seres humanos que os outros. Por conta de uns códigos. É assim que a gente se desumaniza, a conta gotas: primeiro o outro some do nosso olhar, depois das nossas palavras, até desaparecer da imaginação.
Quem não existe como gente dentro de nós, não é reconhecido humano quando cruza o nosso caminho. É nisso que Francisco pedia ao mundo para prestar atenção.
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