Por que somos péssimos em prever o futuro da tecnologia?

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Nesta semana topei com uma imagem curiosa circulando nas redes. Era um recorte de revista com a foto do prêmio Nobel de Economia Paul Krugman, acompanhada de uma previsão feita em 1998: "Por volta de 2005, ficará claro que o impacto da Internet na economia não foi maior do que o da máquina de fax."
Até fiz um fact-check para ver se não era fake news. Não era. Mais de 20 anos após a controversa declaração, o próprio Paul Krugman escreveu, em 2023, uma coluna no NY Times reconhecendo seu erro ao prever que a Internet perderia força, embora, no mesmo artigo, tenha argumentado que o impacto econômico ainda era superestimado.
Ele não está sozinho no hall de previsões ruins. Até mesmo pessoas imersas no cenário tecnológico falham em entender as tendências e dinâmicas do processo de inovação. Vou dar outros exemplos.
Antes do lançamento do iPhone, o então CEO da Microsoft, Steve Ballmer, soltou o seu pitaco sobre o produto da concorrente: "Não há chance de o iPhone conseguir uma participação de mercado significativa. Nenhuma chance."
Errou rude, como diz o povo na Internet.
E que tal Steve Chen, cofundador do Youtube, que em 2005 expressava preocupações sobre a viabilidade de longo prazo de sua empresa: "Simplesmente não há tantos vídeos que eu queira assistir."
Eu poderia escrever esta coluna apenas com citações de projeções furadas de pesquisadores especialistas - inclusive, as minhas. E você, querido leitor, provavelmente também tenha as suas. Mas o que quero mesmo é encontrar possíveis respostas para a pergunta que fica: por que somos tão ruins em prever os desdobramentos da tecnologia?
Há vários fatores que explicam esse fenômeno, alguns restritos à tecnologia e outros que mostram as limitações do lado humano.
A tecnologia por si só é de uma natureza imprevisível. O seu desenvolvimento não segue um progresso estável e linear. Pequenas "sacadas" trazem mudanças profundas e difíceis de serem antecipadas. É o efeito borboleta na tecnologia.
E nisso entra o nosso viés de status quo e a falta de imaginação que está virando quase uma epidemia. Tendemos a subestimar mudanças mais radicais porque nossa mente está presa no presente e passado. Pensamos o futuro com base no que conhecemos. É como se nossa imaginação estivesse ancorada nas situações familiares, sem muito espaço para extrapolar limites e visualizar efeitos em cascata de uma nova tecnologia.
É preciso sensibilidade, soltar a imaginação para pensar nos possíveis cenários futuros que uma inovação pode desenrolar. É por isso que, para este quesito, conversar com artistas pode trazer mais descobertas do que falar com economistas.
Falhamos em entender o comportamento humano
Outro desafio é que muitas análises estudam um produto de forma isolada e falham em entender que a tecnologia está sempre inserida em um contexto social. Novos comportamentos emergem a partir da relação das pessoas com artefatos tecnológicos.
Steve Ballmer errou nas suas previsões do iPhone porque fez uma análise simplista do produto, mas não conseguiu entender e antecipar a mudança de comportamento que uma loja com milhares de aplicativos em um único dispositivo poderia causar nas pessoas.
O salto surpreendente que a IA deu nos últimos anos com o ChatGPT é outro exemplo. Embora a OpenAI tenha introduzido inovações para construir o seu chatbot, a grande "sacada" foi ter disponibilizado o serviço para qualquer indivíduo usar.
Milhares de pessoas ao redor do mundo começaram a usar o chatbot para tantas atividades diferentes que essa situação trouxe evidências que procurávamos de que a IA generativa pode executar muito bem diversas tarefas. Até 2022, tudo isso não passava de uma hipótese, mas hoje é evidente que a IA está mudando radicalmente a forma como as pessoas criam e consomem informação.
Antes, muitos pesquisadores previram que uma IA conversacional com a qualidade do ChatGPT não surgiria até 2030. Hoje, as projeções sobre a chegada de uma "IA Geral" são incertas. Enquanto alguns acreditam que ela estará entre nós em apenas dois anos, outros estimam uma década - e há quem sustente que ela jamais será alcançada.
Ainda não sabemos ao certo quais caminhos levarão à superinteligência, mas a história nos ensina que nossa capacidade de prever o desenrolar do desenvolvimento tecnológico é mais limitada do que pensamos. O que nos resta, então, é aprender a antecipar múltiplos cenários e navegar na incerteza.
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