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Opinião

Vinte dias no oceano: navegando da Nova Zelândia à Austrália

Chegamos à Austrália após 20 dias ininterruptos de navegação. Originalmente, nossa ideia era ter feito essa jornada alguns meses atrás, em outubro do ano passado, para evitar possíveis ciclones na rota. Porém, a extensa (e necessária) manutenção no veleiro Kat acabou levando mais de tempo que o desejado.

Ancorados na Nova Zelândia por 1 ano e 2 meses, exploramos cada detalhe da embarcação. Mesmo com tudo revisado, sempre dá um friozinho na barriga antes de soltar as amarras e içar as velas novamente.

Mil pensamentos tomam conta da mente. Lembramos de tudo de que precisamos para semanas isolados no mar? Quem já navegou sabe a logística detalhada envolvida em uma travessia longa e a quantidade de detalhes para estar tudo 100% (ou perto disso). Serão 2.400 milhas até o norte da Austrália ou teremos que ampliar essa distância para aproveitarmos os melhores ventos e nos ajustarmos a eventuais mudanças? O trajeto nunca é uma linha reta.

Com o coração acelerado e muita emoção, eu, Erika e minha mãe Heloisa nos despedimos, mais uma vez, de Opua, na Nova Zelândia, onde temos amigos que fazem parte dos nossos 40 anos de história. Em Opua, vivemos, individual e coletivamente, momentos muito especiais, entre eles, esse retorno do veleiro Kat às águas e o início da segunda etapa da rota internacional da Voz dos Oceanos.

No final, tudo deu certo! Celebramos o Natal e o Ano Novo em alto-mar. Durante a viagem, nos revezamos em turnos, enfrentamos desafios no Estreito de Torres e fizemos uma breve parada em Thursday Island. Navegar por essa região é desafiador: águas rasas, recifes de corais, correntes fortes um histórico de naufrágios tornam o Estreito uma das áreas marítimas mais complexas do mundo. Mas estamos bem!

Até chegarmos aqui, acompanhamos e vivenciamos constantes mudanças na previsão do tempo. Partimos com uma baixa pressão se formando. Após dois dias de navegação, o vento começou a apertar, a frente intensificou e virou uma tempestade. Ainda na primeira semana, chegamos a pegar, em alguns momentos da noite, um vento de 40 a 50 nós e rajadas batendo os 60 nós.

Com isso, o mar cresceu muito rápido e ondas de 4 a 5 metros quebravam de maneira desencontrada. Parecia que estávamos dentro de uma máquina de lavar, em funcionamento, na centrifugação. Naquela noite, o balanço era tão forte que decidimos pular o jantar, ficando apenas com frutas para evitar ir à cozinha.

Foi um começo desafiador após tanto tempo longe da navegação. Com o passar dos dias, os ventos diminuíram, e o mar, gradualmente, se acalmou. Em alguns momentos, as águas ficaram tão calmas que pareciam um espelho, sem uma única brisa.

Confesso que não foi fácil pegar, logo de cara, uma ventania e mar grosso após tanto tempo parados. Depois, o vento já foi diminuindo e o mar ficando mais calmo. Com ventos que seguiram fracos, em alguns momentos, o mar virava um espelho, sem uma brisa sequer.

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Além dos desafios do mar, enfrentamos mudanças bruscas de temperatura. O frio intenso do início deu lugar a um calor escaldante a partir da época do Natal. As temperaturas estão extremas. Várias regiões na Austrália estão em alerta máximo por causa do calor. O ano de 2024 foi o segundo mais quente da história do país. Isso é alarmante e preocupante.

No veleiro Kat, além dos toldos, improvisamos outras proteções ao sol com toalhas e capas de vela, criando áreas extras de sombra a bordo. À noite, embora mais fresco, o calor intenso persiste. Ainda assim, resgatamos uma tradição: assistimos juntos ao pôr do sol todos os dias. É sempre um espetáculo, que não queremos perder.

Depois de mais de um ano longe da navegação, estamos recuperando o ritmo. E, quando você estiver lendo esse texto, provavelmente já estaremos navegando rumo à Indonésia ou até concluído as mais 700 milhas até lá.

Escolhemos a Indonésia porque está fora da zona de ciclones do Pacífico Sul, cuja temporada vai de novembro a abril. Ainda assim, os riscos existem, especialmente em tempos de mudanças climáticas. Seguimos atentos, com segurança e comprometidos com nossa missão, que nos orgulha e nos une ainda mais a você.

Por isso, sinta-se sempre muito confortável a bordo da Voz dos Oceanos!

Bons ventos para todos nós!

Opinião

Texto em que o autor apresenta e defende suas ideias e opiniões, a partir da interpretação de fatos e dados.

** Este texto não reflete, necessariamente, a opinião do UOL.

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