Mariana Sgarioni

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Reportagem

Leroy Merlin dá vida nova a produtos que iriam para o lixo

Dá para imaginar que um vaso de plantas já pode ter sido, um dia, uma calça jeans? Pois este é um ótimo (e real) exemplo de economia circular - ou seja, aquele modelo de produção em que os materiais são sempre reutilizados. E que acontece dentro da Leroy Merlin, gigante varejista no setor de soluções para a casa.

Para fazer os vasos da coleção Renova Jeans, a empresa se uniu a artesãos, cooperativas e investiu em tecnologia. Os jeans dos uniformes dos colaboradores, que já não estão mais em condições de uso e iriam para o lixo, são desmanchados em fibras, encaminhados a uma massa biotecnológica à base de borracha de seringueira, e depois moldados. Estes novos vasos, mesmo depois de descartados, podem ser reciclados infinitamente.

A companhia também reaproveita restos de uniformes não utilizados para a confecção de cobertores, que são destinados à população vulnerável. Estes uniformes velhos, aliás, se transformarão, em breve, em uniformes novinhos: a empresa está em fase de testes de uma nova tecnologia para reaproveitamento total destas peças.

Outro projeto da Leroy é o chamado Areia Circular. A iniciativa pega restos de cerâmica que sobram das lojas e encaminha para a produção de areia usada na construção civil. Esta ação já reciclou mais de 14 mil quilos de material e impediu o desvio de mais de 1.750 pisos para aterros sanitários.

"Existem oportunidades imensas dentro dos negócios circulares, que vão muito além do aproveitamento de resíduos ou de produtos que podem ser reparados e recuperados. Trata-se de uma tendência e de uma necessidade do mercado", afirma Andressa Borba, diretora de Impacto Positivo da Leroy Merlin.

A executiva fala, a seguir, sobre estas tendências de mercado e como a economia circular é uma interessante estratégia de negócios cravada em todas as decisões da empresa que foi pioneira na coleta seletiva e na gestão de resíduos no país.

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Ecoa: Por que o setor varejista precisa ir além da reciclagem?
Andressa Borba:
No nosso mercado existe, por um lado, escassez de matéria-prima. Por outro lado, muita sobra de resíduos. Então, para essa conta fechar, é preciso aproveitar estas sobras e é isso que temos feito sempre que enxergamos uma oportunidade. Desde o processo de concepção dos produtos, incentivamos que eles aceitem um reaproveitamento de insumos na cadeia produtiva, seja para um mesmo produto, ou para outros, em novos formatos.

Ecoa: Quais são as principais sobras das lojas?
Andressa Borba:
O entulho é um resíduo ainda muito gerado, seja no fundo de loja, ou pelas obras dos clientes. Fizemos, então, uma parceria e vimos que seria possível, por exemplo, transformar aquilo que seria um resíduo numa areia de construção, que retorna às prateleiras para ser comercializada com qualidade, além de dar acesso também a quem não pode comprar outros tipos de areia. Investimos muito também para aumentar a circularidade dos produtos têxteis, gerados pelos uniformes da companhia que são descartados porque não têm condições de uso. Temos vasos sendo vendidos nas lojas que vieram das calças jeans dos uniformes.

Ecoa: A circularidade está no centro da estratégia de resíduos da Leroy?
Andressa Borba:
Sim. Buscamos, de forma constante, a redução da geração de resíduos, com aumento da eficiência operacional, o reúso de materiais, a reciclagem, a busca por novos modelos de negócio e a destinação de, no mínimo, 90% dos resíduos gerados fora de aterros sanitários até 2026. Investimos também em inovação. Em 2023, por exemplo, reestruturamos o Projeto Postera, e desenvolvemos uma iniciativa-piloto para que os uniformes pudessem ser transformados novamente
em fios de tecido, destinados à fabricação de novos uniformes ou acessórios, como bolsas utilitárias para os colaboradores.

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Ecoa: Qual a importância de ações como estas para a saúde do negócio?
Andressa Borba:
Entendemos que se trata de uma necessidade quando a gente fala do nosso mercado. É preciso olhar para a economia circular como uma oportunidade. Um exemplo é um novo projeto, também em fase de testes, chamado Quase Perfeitos, em que vendemos itens com pequenos defeitos com preços mais baixos. Além de aproveitar os produtos, você gera acessibilidade de compra. Estamos também com um projeto de reparação. Então, não é apenas falar sobre reciclagem, diminuição de resíduos, mas também sobre contribuir para que mais pessoas consigam ter em casa produtos a preços mais baixos. Estamos vivendo uma nova forma de fazer negócios e quem não estiver alinhado a isso vai perder mercado.

Enel transforma terrenos de linhas de transmissão em hortas urbanas

Área da Enel Distribuição São Paulo que foi cedida para plantação de hortaliças
Área da Enel Distribuição São Paulo que foi cedida para plantação de hortaliças Imagem: Divulgação

Onde houver terra é possível plantar comida - e esta máxima vale até para os lugares mais improváveis nos centros urbanos. Quem diria, por exemplo, que aos pés daquelas imensas torres metálicas de transmissão de energia, cravadas nas cidades, já está brotando muita couve, beterraba, espinafre, entre outras hortaliças? E estas verduras vêm alimentando centenas de pessoas.

O projeto Hortas em Rede, uma parceria da Enel Distribuição São Paulo com prefeituras e instituições, utiliza os terrenos das linhas de transmissão para desenvolver hortas urbanas. O resultado são alimentos frescos brotando de um espaço que era antes inutilizado, mas que agora promove inclusão social, sustentabilidade - e mata a fome.

A iniciativa começou em 2018 e hoje já conta com 50 hortas ativas em São Paulo e na região metropolitana. O objetivo é estabelecer hortas em regiões com grande concentração habitacional, com foco em pessoas em vulnerabilidade social. O projeto proporciona capacitação profissional, inclusão social e geração de renda por meio da comercialização dos produtos cultivados localmente pelos participantes.

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"Estes terrenos, que são grandes e cortam as cidades, ficavam sem nenhuma utilização e acabavam virando depósito de entulhos, lixo clandestino ou eram invadidos, tornando-se uma área suja e perigosa. Quisemos ressignificar este espaço: eles foram transformados em áreas de agricultura urbana", diz Claudia Guimarães, Head de Sustentabilidade das distribuidoras da Enel Brasil.

A gestão dos plantios e culturas é feita por agricultores cadastrados, que são treinados e capacitados para trabalharem em um terreno que fica ao lado de linhas de energia. Ou seja, é preciso cuidado. A escolha das hortaliças também obedece critérios de segurança: somente vegetais rasteiros podem ser cultivados. Desta forma, não há o risco de árvores altas que podem interferir nas torres e causar acidentes. "Temos hortas que produzem toneladas de alimentos. Um dos desafios dos agricultores é o escoamento dessa produção", comenta Claudia. Muitos vendem suas colheitas para escolas, mercados, restaurantes e hortifrútis, por exemplo. Segundo ela, uma das hortas é cuidada por uma agricultora indígena, que planta ali sementes raras, que servem para o replantio de áreas desmatadas em todo o país.

"A produção das hortas vai muito além da renda gerada ali pelos alimentos e de toda a sustentabilidade do entorno. Fizemos pesquisas que mostram que os agricultores urbanos tiveram uma melhora de saúde, de disposição física e de qualidade de vida. Então, temos um espaço que não é só de geração de renda sustentável: é também de bem-estar".

Cadeiras de milhões: como cédulas de dinheiro com defeito viram móveis

Cadeiras fabricadas com cédulas de dinheiro que seriam descartadas pela Casa da Moeda
Cadeiras fabricadas com cédulas de dinheiro que seriam descartadas pela Casa da Moeda Imagem: Divulgação/Tran$forma

Pode parecer piada pronta, mas tem muito dinheiro indo para o lixo. A Casa da Moeda, responsável por produzir e imprimir as notas no país, descarta, por ano, 200 toneladas de cédulas por erros de impressão, corte ou outros defeitos. O que fazer para evitar que este lixo valioso vá para os aterros sanitários?

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O Projeto Tran$forma evita este descarte recolhendo o material e, em parceria com artistas, produzindo objetos de decoração, móveis e outros utensílios. São cadeiras, mesas, pufes e até camas que permitem que o consumidor se sinta - literalmente - deitado (ou sentado) em uma fortuna. "Temos um pufe feito com R$ 25 milhões em notas rasgadas", conta Patricio Mariano Malvezzi, CEO da Equipa Group e responsável pelo Tran$forma.

A vida do dinheiro neste país é curta. "No Brasil, há uma política restrita sobre a estética. A nota não pode ter duas dobras - se tiver, o Banco Central retira de circulação", explica o executivo. Segundo ele, uma nota costuma circular no máximo por 3 anos. "Damos mais de 100 anos de vida a uma matéria-prima que durava apenas 3".

As cédulas são fabricadas com um tipo de papel constituído por três camadas sobrepostas, como se fosse um sanduíche. A parte do meio é feita de 100% algodão, e as outras, em geral, são compostas por uma pasta de madeira. Elas precisam sair da Casa da Moeda lisinhas e sem nenhum defeito ou amassado, caso contrário são inutilizadas. A cada ano, a impressão das notas cresce cerca de 7%.

Segundo o Banco Central, mais de 90% das cédulas fora de uso são encaminhadas para coprocessamento e utilizadas como combustíveis de fornos para fabricação de cimento.

Malvezzi afirma que tem um contrato com a Casa da Moeda, que vende à sua empresa todos os seus resíduos. As notas chegam já picotadas, prontas para serem encaminhadas a diversos usos.

"As soluções são inúmeras, porque é possível misturar os resíduos com diferentes tipos de material e gerar novos ciclos de vida. Podemos fazer, por exemplo, uma estátua de Cristo Redentor para decoração com poliéster ou filamentos de impressão 3D, ou ainda uma cadeira. O papel-moeda hoje tem um valor intrínseco muito importante", completa o empresário.

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Dica de exposição

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Circuito Cultura e Inclusão

Exposição itinerante que une fotografia e narrativas de pessoas em situação de vulnerabilidade social realizada pela ONG ImageMagica e Ministério da Cultura. A mostra acontece até 12 de maio, na Estação Guarulhos-CECAP, da CPTM, com o objetivo de utilizar a fotografia como ferramenta de inclusão e empoderamento social, celebrando a diversidade cultural e conectando histórias reais a um futuro mais sustentável.

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