Sem água não tem refri: como a Coca-Cola vê a escassez hídrica

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O que seria de uma empresa de bebidas, cujo carro-chefe é o refrigerante mais famoso do mundo, em um planeta com escassez de água? Não se trata de nenhum cenário apocalíptico e sim de uma realidade provável. É só lembrar que no momento pelo menos 50% da população mundial - estamos falando de cerca de 4 bilhões de pessoas - já enfrentam falta de água no mínimo uma vez ao mês. Ou seja: as torneiras estão secando.
Se não vai ter água suficiente, que dirá uma Coca-Cola gelada? A gigante fabricante de bebidas já entendeu o recado faz tempo - tanto que elegeu este tema como uma de suas principais prioridades. A ideia é investir pesado em tecnologias para tornar suas operações cada vez mais eficientes - e isso significa utilizar menos água em tudo. Entre as inovações, a empresa acaba de trazer ao Brasil um sistema de nanobolhas, que permite reduzir de 17% a 40% o uso de água em processos industriais, como tratamento de efluentes, lavagem de esteiras e de embalagens retornáveis.
A Coca-Cola Brasil também apoia a tecnologia Suindara, que monitora, comunica e mobiliza, por satélite, diferentes agentes no combate a incêndios florestais e desmatamento no Cerrado, berço de 8 das 12 principais bacias hidrográficas brasileiras. "Áreas queimadas absorvem cinco vezes menos água que áreas preservadas", lembra Rodrigo Brito, diretor de Sustentabilidade da Coca-Cola Brasil e Cone Sul. Esta tecnologia cobre 6,8 milhões de hectares, e, em 2024, evitou a queimada de 8 mil hectares, incluindo o Parque Estadual da Serra dos Pirineus (GO), Parque Nacional de Brasília e Boca da Mata e a APA de Cafuringa (DF).
Na entrevista a seguir, Rodrigo Brito conta um pouco mais sobre a importância da eficiência hídrica na companhia, os investimentos nesta área, e os desafios de uma indústria que, assim como todos nós, depende da água para sobreviver.
Ecoa: A escassez de água é hoje um dos principais riscos de sobrevivência que a humanidade enfrenta. Como uma indústria do porte da Coca-Cola enxerga esta questão?
Rodrigo Brito: A água é um ciclo fechado no planeta. Você não cria água e você não perde água. Existe o mesmo volume de água na Terra que já existia há milhões de anos e ele permanecerá o mesmo durante os próximos milhões de anos. Então, qual é o desafio? A água estar disponível onde a gente precisar. Na zona sul da América Latina temos 64 fábricas e, só no Brasil, são 27. Precisamos garantir a perenidade destas operações que só acontecerão se houver uma perenidade dessa água.
Ecoa: Como fazer isso?
Rodrigo Brito: Temos três pilares e o primeiro deles é otimizar ao máximo nosso uso e consumo. Há 25 anos, usávamos o dobro de água que usamos hoje nos nossos processos. Para chegar nesta conta, lançamos mão de muita tecnologia, entre elas as chamadas nanobolhas. Existe um equipamento que nanifica gases, ou seja, divide uma bolha em milhares de nanobolhas. Então, se eu preciso lavar uma esteira, por exemplo, para produzir Sprite no mesmo lugar em que estava o Guaraná Jesus, tenho que zerar as contaminações. Com a nanobolha, a gente reduz de 17% a 40% o volume de água nesse processo porque o gás tem muito mais contato com a superfície. As fábricas mais modernas do Brasil já estão chegando no consumo de apenas 200 ml de água por litro envasado. Sem contar que a água que volta para a natureza, chega mais pura e oxigenada. As nanobolhas também são muito úteis na lavagem das embalagens retornáveis.
Ecoa: Estas garrafas retornáveis, apesar de evitarem o descarte, têm um impacto considerável no consumo de água, certo?
Rodrigo Brito: Este é um debate profundo. A embalagem retornável de plástico PET é muito virtuosa ao evitar resíduos. Ela tem 15 vidas, ou seja, pode ser reutilizada 15 vezes. Já as garrafas de vidro têm 35 idas e voltas. Porém, estas embalagens usam muita água para serem lavadas, além do calor, que consome muita energia. Então, preciso diminuir este impacto e ser mais eficiente no uso destes recursos. O PET é o segundo material mais coletado e reciclado depois do alumínio e é o plástico mais circular que existe. A Coca-Cola trabalha com vários tipos de embalagem: 98% do nosso vidro é retornado e o alumínio já é 100%. É seis vezes mais barato reciclar alumínio em vez de produzir um novo. Já o PET virgem é muito mais barato que o PET reciclado, coisa de 50%. Mas seguimos investindo na reciclagem do PET porque temos compromissos. Para isso, apostamos na redução do uso da água em todo o processo.
Ecoa: Não basta a indústria usar menos água, é preciso também devolver esta água para a natureza.
Rodrigo Brito: Sem dúvida. Por isso que temos ações de reposição hídrica, com programas de conservação e reflorestamento na mesma bacia. Calculamos, com auditoria externa, quanto as áreas preservadas absorveram de chuva, vegetação etc. Neste pilar de proteção de bacias e reposição contamos com uma tecnologia vinda de Córdoba chamada Kilimo, que usa imagens de satélite para promover o uso eficiente da água na agricultura. Os agricultores chegam a economizar 50% de água com este sistema e eles recebem créditos por esta economia. Investimos neste ponto porque a agricultura é quem consome 64% da água do Brasil e 80% da água no Chile. Dentro do monitoramento por satélites também investimos em uma tecnologia brasileira chamada Suidara, que previne incêndios e assim protege bacias. No ano passado, o equivalente a 8 mil estádios de futebol deixaram de ser devastados graças a esta solução. Ao evitar o fogo, estamos preservando a água no solo. No fim, tudo termina no mesmo lugar: na água.
Empresas exageram nos benefícios ambientais de seus produtos, diz estudo

"Eco-friendly", "100% reciclável", "Neutro em carbono"; "Não prejudica os animais". Estes são alguns dos termos que estão na moda e são usados a rodo em rótulos de produtos. São bonitos, pegam bem, mas não querem dizer rigorosamente nada. Se não houver uma prova de que o produto de fato cumpre o que está escrito ali, pode apostar que é greenwashing, aquelas ações de marketing feitas para promover uma falsa imagem de que determinada marca é ecologicamente responsável.
Uma pesquisa inédita realizada pela Market Analysis Brasil com o apoio do Instituto Akatu revelou que 85% das alegações ambientais feitas pelas marcas no Brasil são falsas ou enganosas, índice semelhante ao registrado há dez anos. Isso indica que estas marcas praticam greenwashing e que a transparência anda bem opaca no mercado.
O estudo analisou 2.098 produtos de diferentes categorias, identificando um total de 3.045 alegações ambientais. A metodologia envolveu pesquisas detalhadas em websites de empresas, programas e organizações certificadoras para garantir a qualificação adequada de cada alegação. O número de promessas ecológicas cresceu 28% desde 2014, porém ficou constatado que muitas companhias no mercado não têm nenhum respaldo no que dizem nos rótulos.
"Verificamos, em muitos casos, o desconhecimento por parte dos produtores. Atributos que são comunicados de forma equivocada e outros, que são importantes, mas que não são comunicados. Então grande parte do problema está na ignorância sobre o assunto", diz Lucio Vicente, diretor do Instituo Akatu.
Entre os diferentes tipos de greenwashing identificados, o mais comum foi o classificado com "Incerteza", presente em 57% dos produtos analisados. Essa prática ocorre quando uma marca utiliza declarações vagas e subjetivas, como "amigo do meio ambiente", ou similares. Também há muitos casos de marcas que colocam informações irrelevantes, como: "Não contém CFC", um composto químico poluente e que já foi proibido há muitos anos.
As categorias de produtos que se destacaram negativamente pelo greenwashing foram: Limpeza (96%); Casa, Jardim e Construção (86%); Eletroeletrônicos e acessórios (86%) e Cosméticos e higiene pessoal (75%). No caso dos produtos de limpeza, a pesquisa revelou um aumento preocupante de 27% na quantidade de alegações verdes sem comprovação em relação a 2014.
"Existe um aumento de diversos tipos de consumo atrelado a estes números. Houve um crescimento da adesão do consumidor para produtos de limpeza. Com o crescimento econômico, também houve este aumento de consumo de eletroeletrônicos. E também existem produtos de necessidade diária: as pessoas não deixam de tomar banho, por exemplo. Então, não podemos imputar a responsabilidade do consumidor checar isso o tempo todo. As empresas têm a responsabilidade de serem transparentes", explica Vicente.
As marcas querem, cada vez mais, colocar atributos verdes em seus produtos porque os consumidores estão mais exigentes. O estudo aponta que o senso crítico dos consumidores em relação às práticas de responsabilidade ambiental das empresas está afiado. As ações de incentivo positivo (premiação) e de punição (boicote ou crítica pública) vêm aumentando significativamente ao longo do tempo.
"Acredito que o âmbito regulatório deveria evoluir e construir critérios para cada tipo de setor. Não adianta cada um declarar o que quer. Deve-se exigir, no mínimo, que o produto diga quanto usou de água, energia e recursos naturais, por exemplo. Além disso, deve haver uma responsabilidade de autorregulação das empresas: elas podem fomentar, frente às suas associadas, uma evolução de transparência. E o terceiro ponto é conectar o consumidor: ele precisa consultar as companhias para checar sempre que estiver em dúvida sobre qualquer informação", completa Vicente.
Empresa alemã fabrica bicicleta de plástico descartado nos oceanos

A cada ano, 8 milhões de toneladas de plástico chegam aos oceanos, formando ilhas de lixo maiores que países inteiros, contaminando as águas, e, sim, ameaçando a vida no planeta. Para limpar a sujeirada é preciso de uma força-tarefa e ideias do que fazer com todo este plástico são sempre bem-vindas.
A igus, empresa alemã de polímeros de alto desempenho para movimentação, criou uma bicicleta composta por mais de 50% de plástico reciclado a partir do descarte nos oceanos. Metade do material das rodas e do quadro são feitos com redes de pesca reutilizadas.
Para esta fabricação, a empresa firmou parcerias com organizações de coleta e de pesca. Ao chegarem na fábrica, os resíduos são lavados e triturados antes de serem reciclados mecanicamente. Esse processo gera grânulos 100%
reciclados que serão parte do quadro, rodas e guidões da bicicleta.
"A igus:bike foi projetada para ser totalmente livre de lubrificação, reduzindo o impacto ambiental ao eliminar a necessidade de óleos e graxas. No momento, apenas os freios e algumas peças de conexão ainda são feitos de metal. Mas também estamos trabalhando para substituí-los por plástico de alto desempenho e longa duração. Além disso, não pintamos nossas bicicletas, pois isso dificulta a reciclagem", explica Sven Terhardt, Head de Produto e Vendas da igus:bike.
Segundo ele, os principais resíduos plásticos coletados dos oceanos são redes de pesca descartadas, garrafas PET, embalagens e microplásticos industriais. Esses materiais podem ser reciclados e transformados em polímeros de engenharia utilizados na produção de componentes da bicicleta, como o quadro, as rodas e o garfo.
A empresa produziu o primeiro lote de 100 bicicletas sustentáveis no ano passado e as magrelas estão apenas na Europa - por enquanto. A empresa tem planos de ampliação da produção. A igus é uma empresa global com sede na Alemanha e fábricas em vários países, incluindo EUA, China e Brasil. Seu faturamento anual ultrapassa 1 bilhão de euros.
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