'Mania de Você' prioriza papo reto para apresentar nova novela
Mais do que nunca, primeiro capítulo de novela em TV aberta, onde a história há de se estender por dezenas de capítulos, tem de ser sucinto, claro e com a maior urgência possível. A tentação do espectador em desviar os olhos de uma tela para outra é cada vez maior, e já não há tempo a perder com cenas veladas ou decorativas no começo da trama.
"Mania de Você", a décima novela de João Emanuel Carneiro, chega nesta segunda-feira (9) ao principal espaço de entretenimento do país, a novela das nove, cumprindo com êxito tal premissa. Antes que o primeiro bloco termine, um sujeito já é assassinado (personagem de Fábio Assunção), duas mulheres dão à luz e morrem no pós-parto, e seus bebês já se transformam em Gabz e Ágatha Moreira.
A história vai girar em torno das duas, o que tem entusiasmado muitos noveleiros a ver nessa dinâmica algo como Flora (Patrícia Pillar) e Donatela (Cláudia Raia), em remissão à ótima "A Favorita" (2008), do mesmo autor.
É claro que o folhetim da vez não se apoia na trama de 16 anos atrás, mas, só como paralelo, João Emanuel certamente não teria hoje o prazo que teve naquela ocasião para sustentar um suspense sobre quem era a mocinha e quem era vilã, algo arrastado ao longo de vários capítulos.
Agora, primeira fase de novela equivale à metade do primeiro bloco na estreia, e olhe lá.
Embora o jogo seja entre Luma (Ágatha) e Viola (Gabz), e ali esteja novamente Adriana Esteves, sempre pronta a comover a plateia, vem de Chay Suede, o Mavi, o maior indício de protagonismo para os episódios a seguir. Só não vale dizer que ele vai "roubar a cena" porque não terá sido um furto, mas tão somente um merecimento do ator.
As melhores falas estão com ele, um rapaz cuja mãe (Adriana) é incapaz de lhe dar um abraço ao ouvir do filho que ele enfim está para se formar, ainda que ela jamais tenha lhe dado qualquer atenção.
Os piores diálogos, não só em conteúdo, mas também em forma, estão na boca do vilão da estreia, um Rodrigo Lombardi construído para ser odiado pelo público em menos de dez minutos. Molina, seu personagem, despacha o inimigo para uma gaveta de necrotério, administrando um crime que só em novela ficaria sem solução. Suas frases conspiram a favor do canastrão, algo explicitamente proposital.
Aliás, a maldade, fator que indiscutivelmente mobiliza qualquer plateia, não se disfarça em eufemismos em "Mania de Você". Não tem essa de ética de bandido quando o chefe do morro entra em cena, disposto a estuprar a mocinha Viola. E ela é salva por Mavi, nossa estrela maior — que, é bom avisar, logo logo parecerá bem menos fofo, confirmando a disposição de João Emanuel em promover grandes viradas em suas criaturas.
Beira o didatismo a maneira como "Mania de Você" apresenta seus tipos, mas o autor é conhecido como alguém que não confunde bom mocismo com pasmaceira, o que faz de seus heróis figuras mais críveis.
No quesito cenário, sai o laranja-marrom, entra o azul: a terra vigente no horário há um ano e meio, desde a estreia de "Terra e Paixão" até o fim de "Renascer", agora é substituída por água, muita água. É água na abertura, ao som de Anitta interpretando a canção de Rita Lee e Roberto de Carvalho, e mais água nos videoclipes de pegação entre Nicolas Prattes e Ágatha Moreira em cenas calientes.
Para além da conveniência de se revezar sotaques e cenários, dos rurais aos urbanos, a fim de não exaurir o público, convém notar que João Emanuel sabe buscar sempre um ângulo fora do comum para contar suas histórias. Angra dos Reis é a parada da vez. Com praia e vilinha de pescador, poderia até remeter a "Segundo Sol" (2017), mas uma tem sotaque carioca, e a outra, baiana.
Em "Avenida Brasil" (2012), seu maior sucesso, o autor soube valorizar o subúrbio em detrimento da manjada zona sul carioca. Em "A Regra do Jogo" (2015), o foco principal estava no morro.
Na montagem do primeiro capítulo de "Mania de Você", o contraste de cores traça os destinos de Luma e Viola, ao exibir a alma gélida e cinzenta de Molina após o parto de Luma, e a alegria em cores sortidas nos braços de Marcel (Bukassa Kabengele), artista de circo e pai de Viola.
Crescida, a menina rica se esbalda entre a alta gastronomia de Paris e seu jet ski nas águas que cercam a ilha herdada da mãe, usurpada pelo suposto pai. É melodrama na veia, sem medo de ser melodrama.
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