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Pitty critica a banalização do 'feat': 'Virou ferramenta de marketing'

Colaboração para Splash, do Rio

21/07/2022 04h00

Em junho, um encontro inesperado encantou o público do festival João Rock, em São Paulo: Pitty e Nando Reis subiram ao palco juntos para a primeira apresentação do show "PittyNando", que em agosto vira uma turnê nacional. Os artistas conversaram sobre o projeto em conjunto com Zeca Camargo no "Splash Entrevista" desta semana.

No show, os trabalhos dos dois artistas se misturam de modo a surpreender o público. "Há uma fusão: as obras se encontram e as pessoas se encontram - as pessoas mais que os artistas", disse Nando. "Criamos uma persona única através da arte", completou Pitty, que assumiu a direção musical do espetáculo:

"Trabalhamos juntos para fazer as músicas realmente funcionarem. Trabalhamos com mashups, colagens, isso nos uniu na parte musical e estética", disse a cantora. A proposta empolga Nando: "As músicas são quase todas conhecidas das pessoas, mas serão ouvidas de novas maneiras. É tudo diferente".

O balé de Pitty e Nando

As bandas dos dois artistas também se juntaram, para trabalhar em novos arranjos de sucessos como "Equalize", "Me Adora", "All Star" e "Do Seu Lado". A diretora Pitty faz questão de reforçar que não são dois shows em um:

Tem um balé, uma movimentação pensada pra gente fluir pelo palco. Sabe aquelas duplas de equilibristas, em que um sustenta o peso do outro? É desse jeito que o espetáculo é pensado.

Assumidamente "meio preguiçoso", Nando ficou maravilhado pelo "pensamento conjuntural" da parceira, que pensou em todos os detalhes do show. Mas não apenas isso. "Ver as minhas músicas na voz da Pitty, vê-la não só cantando, mas pensando nas minhas musicas, é incrível. É um pacote completo. Vem com tudo e eu fico de cara", elogiou.

"Ao mesmo tempo que tem roteiro pensado, cada apresentação é única", completou Pitty.

Show não é cinema: é teatro. Cada dia é diferente. Por mais que tenha um jogo de cena, isso nunca engessa o show. Ele é fluido.

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Nando Reis e Pitty no 'Spash Entrevista'
Imagem: UOL

Musa contemporânea

Nem Nando, nem Pitty se reconhecem como cantores. "Nunca me julguei um cantor", disse Nando. "Por isso interpreto majoritariamente as coisas que eu escrevo. E consegui cantar as coisas da Pitty", disse, revelando o tamanho da identificação entre os dois.

"Durante a minha vida inteira isso foi difícil pra mim. Cantora é Elis, Edith Piaf, Gal", disse Pitty. "Eu canto, mas me considero mais compositora. Gosto mais desse ofício de construir o painel artístico como um todo."

Nando lembrou que, quando ele se profissionalizou músico, há quase 40 anos, ainda era um selo de qualidade para um jovem compositor ter canções gravadas por grandes cantoras. Pitty aprovetou para refletir sobre o papel da "musa inspiradora".

"Essa figura se modificou ao longo do tempo", disse. "Ela inspirava, mas sempre foi calada. A musa não tinha voz." Isso mudou.

A musa agora não é só aquela figura etérea. É uma mulher que sente e diz coisas, cria e também se coloca na responsabilidade do erro e do acerto.

Além do feat

Outra coisa que não é mais como era antigamente, segundo os dois, é o feat. Pitty e Nando fazem questão de dizer que sua reunião não é mera jogada de marketing, para um ganhar engajamento em cima dos fãs da outra, e vice-versa.

"Eu adoro feats e tudo o mais, mas isso passou a ser compreendido como uma composição que visa outras coisas", disse Nando. Pitty foi além:

O lance é que o feat banalizou e virou só uma ferramenta de marketing. Não raro a gente vê na música pop pessoas que compram feat de artista gringo porque aquilo vai ser bom comercialmente. Em vez de partir de uma admiração, você parte do ponto de vista mercadológico.

"É claro que temos que pensar na parte comercial", completou. "Mas acredito que ele está a serviço da arte, não o contrário. Se não a gente está ferrado."

Nando concordou em gênero, número e grau.

É importante ter arte. Que papo é esse de 'preciso de médico, mas não preciso de música'? Precisa, sim! Todos nós precisamos. A gente precisa de comida, diversão e arte.

E é este, eles garantem, o objetivo do novo espetáculo. "Movimentar as pessoas a partir da arte, do texto, é essencial pra gente não ficar anestesiado pelo noticiário. Estes encontros sublimam estas sensações e trazem alegria. A gente precisa de uma alegria revolucionária", disse Pitty.

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Pitty e Nando Reis preparam lançamento da turnê 'PittyNando'
Imagem: Otávio Sousa