Fãs têm reservas canceladas para show de Gaga e empresas cobram até o dobro

O megashow de Lady Gaga no Rio de Janeiro, que acontece no próximo sábado, deve reunir cerca de 1,5 milhão de pessoas nas areias de Copacabana.

Boa parte desse público são fãs da artista que vêm de outros estados, mas que têm enfrentado dificuldades para hospedagem devido aos preços altos ou, em muitos casos, por terem suas reservas canceladas por redes de hospedagens que miram preços mais abusivos devido à demanda.

Diversos fãs têm usado as redes sociais para denunciar o cancelamento repentino de reservas já feitas em plataformas como Airbnb e Booking. É o caso da jornalista Maressah Sampaio, 37, que mora em Porto Alegre (RS), mas vai à cidade maravilhosa acompanhada por familiares e uma amiga, todos fãs da artista norte-americana.

Sampaio começou a procurar hospedagem quando surgiram os primeiros rumores da apresentação de Gaga no Rio. Em janeiro, "quando já estava claro que teria o show", diz a jornalista, ela reservou um apartamento pelo Airbnb em Copacabana por R$ 1.800 de 30 de abril a 5 de maio.

A anfitriã aceitou a reserva, mas, dias depois, quando a Prefeitura do Rio confirmou o espetáculo da diva pop em Copacabana, Maressah foi surpreendida pela proprietária do imóvel, que enviou mensagem e pediu a ela para cancelar a reserva que já estava paga.

Ela mandou mensagem dizendo que não poderia mais me receber porque houve uma mudança na política de hospedagem do apartamento e pediu para eu cancelar. Eu falei: 'não posso cancelar porque posso ser penalizada e preciso estar no Rio nessa data, já paguei inclusive, então não vou cancelar'. Ela respondeu: 'não, tu tem que cancelar porque eu não vou te receber'.

A jornalista denunciou o caso nas redes sociais ao mesmo tempo em que acionou o suporte do Airbnb. O post viralizou, e a plataforma contatou a jornalista e afirmou que a anfitriã, além de não poder cancelar a reserva sem uma justificativa plausível, errou ao pedir que a própria cliente realizasse o cancelamento. "Depois dessa repercussão toda, o Airbnb me disse que ela não poderia ter feito isso e eles mesmo cancelaram a reserva e suspenderam a conta dela".

O valor que já havia sido pago por Maressah foi convertido em crédito para usar na própria plataforma. O problema, porém, é que ela não conseguiu mais encontrar uma hospedagem pelo mesmo valor em Copacabana. "Foi muito difícil e não consegui mais em Copacabana porque tinha reservado por um valor X que não existia mais lugar nenhum em Copacabana por aquele valor".

Ela achou um outro apartamento na Lapa por R$ 3.800, mas a diferença de R$ 2.000 da primeira reserva foi paga pelo próprio Airbnb. Sampaio, porém, ressalta que havia se planejado para evitar gastos extras, como locomoção, que agora inevitavelmente terá.

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Consegui hospedagem pelo dobro do preço, só que o Airbnb viu a repercussão do meu post e bancou a diferença. Mas, pô, a gente planeja com antecedência, coloca todos os gastos no papel... Gastos com deslocamento que não teria, agora vou ter. Além disso, não vou conseguir em Copacabana como eu tinha planejado e tive toda essa dor de cabeça.
Maressah Sampaio

Valor mais que dobrou

O engenheiro químico Junior Rocha, 28, vai sair de São Paulo com um grupo de quatro amigos para assistir ao show de Lady Gaga em Copacabana. Eles também reservaram um apartamento pelo Airbnb a uma quadra do local do show.

A Nossa, Rocha explicou que o grupo começou a se planejar desde que surgiram os rumores da vinda de Gaga ao Rio. Tão logo o espetáculo foi confirmado, fizeram a reserva do dia 2 ao dia 5 de maio por R$ 4.600. Em 13 de abril, o proprietário do imóvel entrou em contato com o pretexto de que havia ocorrido um engano com as datas reservadas e propôs aumentar o valor das diárias no mesmo período para R$ 10,4 mil, mais que o dobro do valor inicial.

Após fazer a alteração das datas, o valor mais que dobrou. Demorei para responder [se iríamos aceitar a nova proposta], e ele cancelou a reserva.
Junior Rocha

Junior vai sair de São Paulo com um grupo de quatro amigos para assistir ao show
Junior vai sair de São Paulo com um grupo de quatro amigos para assistir ao show Imagem: Arquivo Pessoal

As reservas feitas pelo Airbnb são cobradas a partir do momento em que o proprietário aceita a locação do espaço. O engenheiro diz que a plataforma, inicialmente, devolveu o montante de R$ 4.600 na forma de crédito para usar na própria empresa.

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Ele entrou em contato para solicitar o reembolso no cartão de crédito e o Airbn "não se opôs", mas, ressalta o engenheiro, isso não minimiza o "transtorno" de ficar com o limite de seu cartão estourado, além de ter seu planejamento inicial alterado.

Depois de terem a reserva cancelada, Junior e os amigos precisaram correr para encontrar outra hospedagem por um preço que não fosse abusivo. Como já tinham comprado as passagens e feito reservas em restaurantes durante a estadia na cidade maravilhosa, e também por serem fãs da estrela pop, cancelar a ida ao show não estava definitivamente nos planos deles.

Felizmente, os cinco conseguiram alugar outro espaço na região do show por um preço similar ao inicial, mas em um site diferente.

Maria Luiza e Emanuele Santos fizeram uma reserva e depois foram informadas sobre o cancelamento
Maria Luiza e Emanuele Santos fizeram uma reserva e depois foram informadas sobre o cancelamento Imagem: Arquivo Pessoal

A designer Maria Luiza, 26, mora na zona norte do Rio. Entretanto, ela e a amiga Emanuele Santos, 31, são muito fãs de Lady Gaga e reservaram um apartamento pela Booking bem próximo ao local do show para acompanhar tudo de pertinho, inclusive os ensaios. "Somos do Rio, mas queríamos ficar perto de Copacabana para caso ela faça ensaios na madrugada, como a Madonna", explicou.

Maria e Emanuele encontraram um apartamento e fizeram as reservas. Posteriormente, o proprietário enviou mensagem à Maria informado que "essa data não está liberada para reserva" e pediu para que, "por favor, [ela] efetuasse o cancelamento, pois não poderia lhe receber".

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As amigas não concordaram e o anfitrião propôs novas datas, mas no final de maio, dos dias 28 a 30, ou seja, após o show. "Ele tentou alterar a data até nos convencer de cancelar. Como não cancelamos porque não concordamos, ele mesmo cancelou".

Para a surpresa das amigas, dias depois o mesmo espaço estava disponível para reserva na Booking. Agora, porém, o valor cobrado era de R$ 6,6 mil pelo prazo de três dias, bem diferente da reserva feita por Maria e Emanuele, no valor de R$ 600. "Esse valor iríamos dividir entre nós duas e ficaria R$ 300 para cada. Quando vimos o novo valor de R$ 6,6 mil ficamos chocadas", diz a designer.

Nos sentimos enganadas e ficamos tristes porque fizemos todo planejamento que foi por água abaixo.
Maria Luiza

Lei protege o consumidor

O consumidor que fez uma reserva em hotel ou site de hospedagem, mas que subitamente teve a reserva cancelada, está protegido pelo Código de Defesa do Consumidor.

A Nossa, a advogada Caren Benevento, da Benevento Advocacia e pesquisadora do Grupo de Estudos do Direito Contemporâneo do Trabalho e da Seguridade Social da Universidade de São Paulo, destacou que a legislação brasileira considera que, uma vez oferecido e aceito o serviço, "a oferta vincula o fornecedor, e seu descumprimento gera direito à reparação".

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Cliente pode exigir o cumprimento forçado da oferta, ou seja, a garantia da hospedagem nas condições inicialmente acordadas, diz Benevento. "Se não for viável, ele tem direito à restituição imediata e atualizada do valor pago ou, se preferir, a substituição da hospedagem por outra equivalente, sem custo adicional. Além dessas opções, o consumidor também pode buscar indenizações por danos materiais — como gastos extras para encontrar uma nova hospedagem — e, dependendo do caso concreto, pleitear danos morais".

Se o problema não for resolvido diretamente com a empresa, o consumidor pode registrar reclamação junto ao Procon de seu estado ou município, utilizar a plataforma consumidor.gov.br para tentar uma solução online, ou ainda ingressar com ação judicial, inclusive no Juizado Especial Cível para causas de menor valor.
Caren Benevento

Empresas não podem cancelar uma reserva confirmada apenas para aplicar reajustes de preço em função da alta demanda, afirma a especialista. "Essa prática viola o princípio da boa-fé objetiva e configura abuso de direito, de acordo com o Código de Defesa do Consumidor.

Empresas que agem dessa forma podem ser penalizadas administrativamente com multas aplicadas por órgãos de defesa do consumidor, como o Procon, e judicialmente, caso sejam responsabilizadas por perdas e danos causados aos consumidores".

"A legislação é clara ao determinar que a oferta feita e aceita gera uma obrigação para o fornecedor. O descumprimento injustificado dessa obrigação pode levar à condenação ao pagamento de indenizações por danos materiais e, em determinadas situações, danos morais. Portanto, consumidores que tiverem suas reservas canceladas injustamente devem reunir toda a documentação (comprovantes de reserva, comunicações de cancelamento, valores pagos) para buscar a reparação dos seus direitos nos canais administrativos ou judiciais disponíveis."

Empresas podem ser penalizadas

O Procon-RJ está monitorando as plataformas que oferecem hospedagens para mapear possíveis infrações aos direitos do consumidor. Em caso de comprovada qualquer medida abusiva que vise extorquir financeiramente os turistas, essas empresas podem ser penalizadas, conforme informou a Nossa o subsecretário de Direitos Difusos, Coletivos e Individuais, da Secretaria de Estado da Defesa do Consumidor do Rio de Janeiro, Claudir Rodrigues.

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Secretaria tem "desencadeado uma série de operações para garantir a estabilidade dos produtos e serviços colocados no mercado de consumo, principalmente os consumidores que estão vindo para o Rio e vão participar do show da Lady Gaga", afirmou Rodrigues.

O subsecretario destacou que o Procon-RJ já recebeu reclamações de clientes lesados e passou por plataformas de hospedaria que "estavam cancelando unilateralmente as hospedagens de modo a elevar os preços injustificadamente".

Instauramos processo administrativo para apurar a responsabilidade dessas plataformas na semana anterior e as plataformas serão notificadas nesta semana. Se ficar comprovado que houve abuso de poder econômico, a prática abusiva de cancelamento para fins injustificados de aumento do preço e exploração do consumidor, essas plataformas serão responsabilizadas administrativamente sob pena de multa, que pode chegar a aproximadamente R$ 14 milhões.
Claudir Rodrigues

Rodrigues ressalta que esse valor será calculado a partir do demonstrativo do resultado de exercício que foi praticado pelas empresas e o faturamento anual anterior delas.

"Será feito um trabalho muito justo e equilibrado para apurar responsabilidades. E as empresas poderão sofrer não só a sanção de multa, mas até possivelmente serem interditadas e impedidas de prestarem serviço por um determinado período. Permaneceremos vigilantes para que os consumidores tenham seus direitos resguardados", completou.

O que dizem as empresas citadas

Por meio de nota, o Airbnb informou que só comenta casos específicos mediante o compartilhamento do código da reserva para análise interna. Entretanto, a plataforma ressaltou que cancelamentos feitos pelos próprios anfitriões "são raros" e, nesses casos, podem sofrer punições que vão desde cobrança de taxas a contas suspensas.

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Também por nota, a Booking alegou que as tarifas são definidas pelos proprietários dos imóveis, mas que os anfitriões que cancelam reservam "de forma inadequada" podem ser penalizados.

16 comentários

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Fernando Souza

Em datas movimentadas esses sites de hospedagens com particulares NUNCA valem a pena. Já passei exatamente esse perrengue no Airbnb pra um reveillon no Rio. Os donos dos aptos cancelam faltando poucos dias e você que se vire - sendo que o dinheiro que volta pra vc já não vai conseguir alugar mais nada. O melhor jeito é se planejar com bastante antecedência e ir na rede hoteleira mesmo. Pode até sair um pouco mais caro, mas é muito mais seguro e evita uma dor de cabeça enorme. Abandonei o Airbnb há alguns anos já, e foi exatamente por isso.

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Joao Marcos Rodrigues de Souza

É a ganância e a falta de caráter do empresário brasileiro! Tem pousada no interior de Minas Gerais, que atende o básico e tem o preço mais caro que o do Hotel Hilton em Nova York na época de Natal.

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Claudio Soares Vasconcelos

país de oportunistas..não é só nessa situação..aconteceu o mesmo cmg em uma hospedagem em porto de galinhas...aluguei em agosto/24 para janeiro..em outubro foi cancelada e depois reapareceu com o valor bem mais alto.

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