Milly Lacombe

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OpiniãoEsporte

Talvez nem Leila Pereira saiba de sua importância para a mulher no futebol

Pela primeira vez Leila Pereira se vê no meio de uma polêmica tendo a opinião pública a seu lado. Ela levou quase quatro anos para sentir esse gosto. Até hoje tudo o que escutou das ferozes vozes das ruas era grito e xingamentos. Os elogios dos homens são feitos sempre baixinho, no canto do ouvido, no mano-a-mano do ambiente privado (para todas nós); a crítica acontece em tom forte e no espaço público.

Agora, diante de Dudu, Leila sente o apoio da massa. Ficou claro pra geral que ela defendeu a instituição, e ele, a si próprio. Mesmo os que ainda pendiam para Dudu agora pularam do veleiro dele para o iate dela.

É corriqueiro que vejamos homens avaliando o "feministômetro" de Leila. "Não é feminista", "não é feminista de verdade", "é a falsa feminista". Homens, que desde pequenos são treinados para nos avaliar a qualquer ocasião, acham perfeitamente natural ser deles esse tipo de decisão. Muitos nos confidenciam na miúda coisas que, acreditam, desvenda o machismo em Leila. Contam casos que a envolvem em situações que, para eles, indicam claramente a queda da máscara: "viu! Mulher-machista!". Querem nos alertar docemente para o que consideram ser uma ingenuidade incurável associada ao feminino, essa que nos impede de enxergar as coisas como elas são. Daí a necessidade de explicar, explicar, explicar.

Seria preciso estar muito letrado nessa luta - ou existir em corpo de mulher - para ter a real dimensão do papel de Leila para as mulheres que trabalham com o futebol. Não nos interessa que ela amanhã apareça com uma camiseta onde se lê "O Futuro é Feminino". Não nos interessa que ela se declare feminista em discursos ensaiados. Não nos interessa vê-la em marchas feministas pela cidade. Importa o que ela faz. E ela faz, o que, nessa terra arrasada de jogadores e executivos de futebol, dentro da qual nenhum homem se mexe em nome da justiça de gênero - é bastante coisa. Leila, sabendo ou não sabendo, rompe muitas fronteiras pelas mulheres que trabalham e amam esse jogo.

Assim como todas nós, Leila Pereira vai se percebendo dentro das armadilhas do machismo lentamente. O letramento feminista não é um evento; é um processo. Demora, exige atenção, diálogo, reflexão. Pode estancar de vez em quando, mas nunca retrocede. Leila está nessa jornada, aprendendo despacito, como todas nós.

A colega de coluna, Alicia Klein, informa que ela vai processar Dudu. E nós aplaudimos. A coisa mais fácil nesse mundo dominado pela lei dos homens é xingar e diminuir uma mulher. Se fazem isso até com aquelas que estão hierarquicamente acima, imagine o que é feito com as que estão abaixo. É tranquilo. É favorável. Os amigões gostam, aplaudem. Homem pode ser tão histérico quanto quiser. Bem, talvez não mais. Leila fala firme, age e, ao agir, nos redime.

Opinião

Texto em que o autor apresenta e defende suas ideias e opiniões, a partir da interpretação de fatos e dados.

** Este texto não reflete, necessariamente, a opinião do UOL.

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