Ozempic, Wegovy: o que explica sucesso dos remédios para obesidade em 2023?
Ozempic, Wegovy e Mounjaro: a chance de você ter ouvido ou lido algo sobre esses remédios neste ano é alta. Afinal, a fama deles no tratamento da obesidade e do sobrepeso fez com que não demorassem a virar opções também para o emagrecimento estético.
Mas o que explica o "boom" das chamadas canetas emagrecedoras entre pessoas já magras? Fatores como a perda rápida de peso, os efeitos colaterais "leves", a facilidade para comprá-las (não é preciso ter receita) e, principalmente, o sucesso nas redes sociais impulsionaram o uso estético no mundo todo.
Neste ano, VivaBem ouviu relatos de médicos que disseram receber pacientes, em sua maioria mulheres, cada vez mais informadas e já pedindo pelas medicações na expectativa de perderem poucos quilos o mais rápido possível.
É importante saber que o Ozempic (da farmacêutica dinamarquesa Novo Nordisk) e o Mounjaro (da norte-americana Eli Lilly) são indicados para tratar o diabetes tipo 2. A orientação para obesidade e sobrepeso é feita de maneira off label —quando a recomendação de uso está fora da bula, o que é permitido pelo CFM (Conselho Federal de Medicina).
O Wegovy, também da Novo Nordisk, é o único indicado exclusivamente para a obesidade ou sobrepeso com comorbidade, como diabetes, hipertensão arterial e insuficiência cardíaca.
Segundo especialistas, a única barreira contra o uso estético ainda mais desenfreado é o alto custo dos remédios. Apenas o Ozempic está à venda no Brasil. Ele é comercializado por valores entre R$ 994,03 e R$ 1.308,32, dependendo da dose. Os dados são da Cmed (Câmara de Regulação do Mercado de Medicamentos).
Wegovy e Mounjaro foram aprovados pela Anvisa (Agência Nacional de Vigilância Sanitária) neste ano, mas ainda não têm data de chegarem às farmácias. O primeiro, que inclusive está liberado para adolescentes, terá preço entre R$ 994,03 e R$ 2.520,61, segundo a tabela da Cmed deste mês.
Compra sem receita
Especialistas e os próprios laboratórios repudiam o uso dos remédios sem supervisão médica.
A pessoa pode errar as doses se não tiver orientação, porque o protocolo segue um escalonamento até chegar à máxima suportada pelo paciente. Não são incomuns relatos de quem começa por conta própria já em quantidades altas.
Isso pode potencializar os efeitos colaterais, além de desperdiçar o remédio —que é bastante caro.
Por que emagrecem?
As três medicações são considerados inovadoras no tratamento do diabetes tipo 2, da obesidade e do sobrepeso com comorbidade.
A semaglutida, substância do Ozempic e Wegovy, simula a ação do GLP-1, hormônio que regula o nível de açúcar no sangue (a glicemia).
Emagrecer é um efeito natural, porque o remédio age em receptores do sistema nervoso central para controlar o apetite e retarda o esvaziamento gástrico (como se a pessoa ficasse mais tempo com a comida no estômago). Basicamente, quem toma não sente muita fome ao longo do dia e come menos do que o habitual.
A semaglutida causa perda de até 15% do peso corporal após 17 meses de uso, indicou o principal estudo da medicação —que considera a dose máxima do Wegovy (2,4 mg). Outros remédios para tratar a obesidade, como a sibutramina e a liraglutida, apresentam redução de 6% a 10%.
Uma das fases do estudo comparou os resultados do Wegovy e do Ozempic, que tem dose máxima de 1 mg. A análise foi feita em pessoas com diabetes tipo 2, que naturalmente perdem menos quilos. Quem aplicou 2,4 mg de semaglutida por semana perdeu, em média, 9,64% do peso total; enquanto aqueles que receberam 1 mg perderam 6,99%.
Já o Mounjaro é um remédio à base de tirzepatida, que age nos receptores do GLP-1 e em mais um hormônio, o GIP. Pacientes que utilizaram Mounjaro 15 mg perderam 26,6% do peso total, quase o dobro do índice apresentado pela semaglutida.
Pesquisadores acreditam que a razão de a tirzepatida ser tão eficaz em reduzir os níveis de glicose no sangue e induzir a perda de peso é que os dois hormônios que ela imita trabalham de modo sinérgico.
Vale dizer que esse estudo comparou doses diferentes de semaglutida e tirzepatida, dificultando a comparação, destacou Dean Schillinger, professor de medicina e especialista em diabetes na Universidade da Califórnia em São Francisco (EUA), em uma entrevista ao jornal The New York Times.
Críticas ao uso estético e os riscos
Entidades médicas criticam o uso estético. A Abeso (Associação Brasileira para o Estudo da Obesidade e Síndrome Metabólica) e a SBEM (Sociedade Brasileira de Endocrinologia e Metabologia) afirmam que a aplicação por quem não é obeso:
expõe pessoas sem indicação de uso aos efeitos colaterais —destacados abaixo;
contribui para a escassez dos remédios, relatada por muitos pacientes que dependem do Ozempic para tratar o diabetes tipo 2;
aumenta o estigma do tratamento de obesidade e sobrepeso para quem já sofre preconceitos.
Segundo o presidente da Abeso, Bruno Halpern, o uso por quem não tem indicação ajuda a estigmatizar o remédio e cria resistência entre quem precisa dele. "Cria um preconceito e [quem deveria] não usa por receio, porque virou 'modinha'", afirmou o endocrinologista em entrevista ao VivaBem publicada em abril.
Mais estudos sobre as medicações são necessários para indicar os efeitos de longo prazo.
As reações mais comuns são:
- Náuseas;
- Vômitos;
- Diarreia ou constipação;
- Como a pessoa come menos, é normal ter fadiga, tontura e sensação de falta de energia.
O uso estético pode potencializar a perda de massa magra, sobretudo se a pessoa for sedentária. Os protocolos dos estudos com as três medicações incluem mudanças nos hábitos de vida, com reeducação alimentar e atividade física.
Também se popularizou como sintoma o "rosto de Ozempic". Associado à flacidez facial, é algo comum para quem passou pela redução de peso excessiva e/ou acelerada —assim como a queda de cabelo. A explicação é a perda da gordura subcutânea, que dá sustentação à pele. Sem ela, o rosto fica com o aspecto de "caído".
Há quem diz até que os dedos afinaram após o uso do Ozempic, algo também associado à redução de gordura subcutânea.
Vale o alerta de que pessoas já magras e que buscam com frequência métodos para perder peso podem ter transtornos de imagem e/ou alimentares. Médicos ainda abordam o risco de se desenvolver uma dependência psicológica (não da medicação em si), acreditando que não vá mais emagrecer sem o remédio.
Efeito sanfona
É muito difícil a pessoa não recuperar os quilos perdidos —o chamado efeito rebote, ou sanfona.
Ao parar com os remédios, o impulso para diminuir o apetite cessa e as respostas de saciedade voltam ao normal entre semanas e meses. Se a pessoa não ajustou a dieta e não faz exercício, a tendência é que retome as escolhas pouco saudáveis de antes e ganhe peso.
É importante entender que diabetes e obesidade são doenças crônicas, que precisam de tratamento a longo prazo. Por isso, a ideia é de que o uso dos remédios será pelo resto da vida.
*Com informações de reportagens publicadas em 20/04/23, 27/04/23, 17/05/23 e 25/09/23.