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Opinião

Aumenta a repulsa aos livros! É grande a queda da leitura entre mais ricos

Volto à 6ª edição da pesquisa Retratos da Leitura no Brasil, feita pelo Instituto Pró-Livro. Já escrevi sobre como despencou o número de leitores no país e questionei o parâmetro usado para definir o que é um leitor. Ainda há bastante para se falar e discutir a partir do levantamento.

Em meio aos muitos dados tristes, parece haver indicativos de não estarmos somente perdendo leitores, mas acompanhando crescer o desprezo ou repúdio ao livro.

Os entrevistados disseram não ler, sobretudo, porque não têm tempo. Praticamente empatado na primeira posição está o mais puro desinteresse pela leitura, aqueles que dizem não ler simplesmente porque não gostam, número que cresceu de 28% em 2019 para 32% nessa nova edição da pesquisa.

Não ter paciência para ler (13%) e a preferência por outras atividades (12%) estão em terceiro e quarto colocados entre os motivos que fazem com que não leitores fiquem distantes dos livros. São justificativas que talvez possam ser condensadas assim: não leio porque não quero.

É uma postura que encontra eco em outros dados da pesquisa.

O número de gente que assume não gostar de ler ultrapassou o de quem diz gostar muito de ler (29% x 26%). E é um desgosto que aumenta conforme a idade avança. Apenas 13% da criançada entre 5 e 13 anos diz não gostar de ler. O número passa para 29% quando olhamos para os adultos com entre 25 e 29 anos. E alcança os 37% entre quem tem de 50 a 69 anos. As pessoas abandonam os livros conforme envelhecem.

Há outros indicativos sobre essa aversão aos livros. Alguns têm percentuais baixos, no entanto simbólicos. Para 2% dos não leitores a leitura não serve para nada. Para 6% desse pessoal, a leitura é uma atividade cansativa e que exige muito tempo.

Um índice chama especial atenção. Quando perguntados o que faria com que frequentassem mais a biblioteca, 39% dos entrevistados disseram que nada os levaria a curtir esses espaços. O que justifica tamanha repulsa? Teriam medo da biblioteca? Receio de serem vistos como alguém que frequenta lugares cheios de livros, ideias e leitores?

Vejo tudo isso e lembro como os livros foram atacados nos últimos anos no país. Com a estupidez galopante que ganhou poder, a cultura foi apedrejada e qualquer atividade intelectual virou motivo de chacota para muita gente. Passou a existir certo orgulho de se desprezar símbolos do conhecimento —e o livro sempre foi o maior deles.

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Classe C e os mais ricos

Nesse buraco, não surpreende ver a redução no número de leitores em todas as classes sociais. Quem mais deixou de ler foi o pessoal da classe C, que passou de 53% de leitores em 2019 para 46% em 2024. Logo depois vem os mais abastados: na classe A, a queda foi de 67% para 62%. Na classe B a redução foi de 63% para 60% e na D/E, de 38% para 35%.

O movimento apresenta nuances se observamos a renda familiar. Daí foram os mais ricos que deixaram a leitura de lado. O número de leitores entre famílias que vivem com mais de dez salários mínimos desabou de 70% para 59%.

Outras reduções: de 46% para 39% entre quem vive com até 1 salário mínimo, de 51% para 45% entre os que vivem com entre 1 e 2 salários mínimo e de 56% para 51% entre os que vivem com entre 2 e 5 salários mínimos.

A exceção é o pessoal com renda familiar entre 5 e 10 salários. Esses começaram a ler mais: passaram de 57% para 63% de leitores.

Preço do livro

Somente 1% dos entrevistados diz não ler por conta do preço do livro, mesmo número da última edição da pesquisa. Entre os leitores, 4% alegam não ler mais porque não têm grana para comprar novos títulos, patamar que também segue idêntico ao da última edição.

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Dentre os fatores que influenciam na escolha de qual livro comprar, o preço aparece em quinto lugar, atrás do tema, do título, do autor e de recomendações de amigos e familiares. 15% dos leitores apontam o preço como um aspecto fundamental, número que era de 22% em 2019.

O preço dos livros subiu nos últimos anos, tanto que as queixas dos leitores são frequentes. Ainda assim, pelo menos segundo a pesquisa, não é uma razão crucial para que tanta gente deixe de ler no país.

É importante olharmos para esses dados também para não mentirmos para nós mesmos. Não é uma medida ou outra isolada, por mais bem-vinda que seja, que resolverá o grave problema da leitura no Brasil.

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Opinião

Texto em que o autor apresenta e defende suas ideias e opiniões, a partir da interpretação de fatos e dados.

** Este texto não reflete, necessariamente, a opinião do UOL

15 comentários

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Arturo Martinez Nunez

Não tem tempo de ler um livro, agora  para as redes sociais sobra. Um País que sua população não tem o hábito de leitura, está fadado a perpetuar as atuais condições sociais.

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Jose Carlos Amaral Flinco

Isso explica, muitas coisas.

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Afonso Celso Pancini Pola

Isso explica muita coisa que vem acontecendo no nosso país. Crença na Terra olana, negacionismo, oposição à ciência, teorias da conspiração, adoração pelas fakes news...

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