Opinião

Prefeituras precisam expandir a oferta de escolas em tempo integral

Neste pleito, escolhemos as lideranças que irão administrar e legislar em nossas cidades, impactando diretamente a vida cotidiana. Na educação, o trabalho das prefeituras é decisivo: os municípios são responsáveis por 22 milhões de matrículas na formação inicial das crianças e adolescentes na rede pública - quase a totalidade da educação infantil, e a maior parte do Ensino Fundamental. Ao enfrentarem desafios de acesso e qualidade, e ao assumirem agendas estratégicas, como a educação em tempo integral, prefeitas e prefeitos têm a oportunidade de deixar legados importantes.

Um dos grandes desafios para os eleitos será assegurar o acesso à educação infantil, em especial considerando as 632 mil crianças na fila de espera por uma vaga em creches. Dessas, 64% estão em situação de vulnerabilidade social e 38% são de famílias de baixa renda. Na pré-escola, a situação ainda é preocupante: cerca de 78 mil crianças estão fora dessa etapa e metade delas (39 mil) não estão matriculadas por falta de vagas, conforme dados do Gaepe-Brasil (Gabinete de Articulação para a Efetividade da Política da Educação no Brasil).

Ampliar o acesso à educação infantil não é suficiente se não houver qualidade. Evidências demonstram que, nos primeiros anos de vida, as interações com o ambiente, o suporte de adultos de referência e os estímulos e cuidados adequados são essenciais para o desenvolvimento das aprendizagens. No entanto, uma pesquisa da Fundação Maria Cecilia Souto Vidigal, Lepes (Laboratório de Estudos e Pesquisas em Economia Social da USP de Ribeirão Preto) e Itaú Social, realizada em 12 municípios, traz uma fotografia da fragilidade das práticas pedagógicas mesmo em regiões mais favorecidas economicamente.

Em 55% das turmas observadas, por exemplo, não havia leitura de histórias para as crianças e, em 42%, não foram observadas atividades de brincadeira livre, que deveriam estar presentes quase que diariamente nas rotinas para o desenvolvimento físico, mental, social e emocional na primeira infância.

Ao avançarem para o Ensino Fundamental, as prefeituras precisam se mobilizar para expandir a oferta de escolas em tempo integral com qualidade, uma estratégia comprovada para reduzir as desigualdades educacionais, especialmente em relação à raça e ao nível socioeconômico.

Entretanto, ampliar o acesso a mais tempo para os alunos não é o bastante. Prefeituras precisam planejar a dedicação integral do professor a uma única escola, e um desenho curricular que de fato amplie as oportunidades de aprendizagem de crianças e adolescentes. Prefeitas e prefeitos podem liderar a atuação intersetorial entre suas secretarias, possibilitando que pastas como as de meio ambiente, parques, cultura e esportes melhor contribuam para as vivências de aprendizagem do currículo escolar.

Este novo ciclo de gestão municipal também pode ser uma oportunidade para que as lideranças eleitas se destaquem na melhoria do ensino da matemática. Mesmo em regiões ricas, a maioria dos adolescentes chega ao nono ano do Ensino Fundamental sem a proficiência necessária e marcada pela crença de que matemática é para poucos, para quem "tem o dom". Universidades e instituições de pesquisa podem contribuir neste caminho, em parceria com escolas e redes, no sentido de desenvolver e sistematizar experiências locais que inspirem estados e outras cidades.

Sem dúvida, em um país com a escala, complexidade e nível de desigualdades como o nosso, desafios educacionais como esses não podem ser enfrentados isoladamente pelas prefeituras. A colaboração entre municípios, estados, a União e a sociedade civil é indispensável. Ao mesmo tempo, há transformações nas experiências de crianças e adolescentes que começam a partir do município. Dentro desta interdependência, o compromisso das lideranças municipais escolhidas nestas eleições contém em si o potencial para mudar o cenário da educação pública brasileira.

*Patricia Mota Guedes é superintendente do Itaú Social. Graduada em Ciências Políticas pela Universidade do Arizona do Norte, é mestre em Administração Pública pela Universidade de Massachusetts Amherst e em Políticas Públicas pela Universidade de Princeton, nos Estados Unidos

Opinião

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7 comentários

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Arthur Eduardo Freitas Heinrich

Em um mundo em que os pais educam menos e delegam essa tarefa às escolas, e em virtude da ociosidade em meio à conectividade, utilizada de forma negativa pelos jovens sem rumo, escolas em tempo integral são uma alternativa. Mas me lembro quando meu filho entrou na POLI/USP, e fomos chamados para uma palestra proferida pelo diretor da POLI. Ele dizia que, embora o campus seja atraente, não é um parque para brincar com o cachorro. O aluno está lá para aprender, de graça, porque o custo é bancado pelo imposto do contribuinte e por um fundo privado mantido por doadores. Então, é necessário respeitar o esforço destas pessoas para que você tenha o privilégio de estudar sem pagar pela faculdade. O mesmo se aplica às escolas e todas as instituições públicas, mantidas pelos contribuintes. Políticos não dão nada ao Povo.

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Joao Orestes Schneider Santos

Dsede que não usem a metodologia Paulo Freire.....

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Esmeraldo Pereira

A escola de tempo integral pode ser um caminho para uma educação mais efetiva das nossas crianças. Ma para isso, há que se reformular o currículo escolar, adequar os espaços internos e externos das escolas (que hoje se assemelham mais a uma prisão) e, sobretudo, preparar e valorizar melhor os professores e equipe. O poder público não pode supor que educação de qualidade seja feita às custas do sacrifício desses profissionais a troco de quase nada.

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