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Remédios e Tratamentos

Um guia dos principais medicamentos que você usa


Carbamazepina controla convulsão e pode ser útil em quadros psiquiátricos

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Imagem: iStock

Cristina Almeida

Colaboração para VivaBem

24/05/2022 04h00

Resumo da notícia

  • O fármaco controla a atividade elétrica anormal do cérebro, inibindo os canais de cálcio
  • Entre os seus efeitos colaterais mais comuns destacam-se tontura, náuseas e vômito
  • A gestão da dor neuropática na fibromialgia é um uso promissor, mas não está na bula
  • Embora a sonolência seja outro possível efeito colateral, o fármaco não trata a insônia

Disponível no mercado desde a década de 1960, a carbamazepina é um medicamento utilizado no tratamento de convulsões, dores decorrentes de neuralgia, assim como em episódios agudos de mania e no transtorno bipolar.

O que é carbamazepina?

Trata-se de um medicamento classificado como anticonvulsivante, mas também tem uma estrutura similar aos fármacos psicoativos. Isso explica o fato de ele ter sido o primeiro anticonvulsivante a ser utilizado no tratamento do transtorno bipolar.

Consideradas as suas características farmacológicas, esse medicamento só pode ser utilizado mediante prescrição médica, com retenção de receita.

Em quais situações ela deve ser usada?

Dada a utilização desse fármaco há quase 60 anos, ele é considerado seguro e eficaz. Contudo, é importante que você faça o uso racional desse remédio, ou seja, utilize-o de forma apropriada, na dose certa e pelo tempo determinado pelo seu médico.

A carbamazepina pode ser utilizada isoladamente ou associada a outras medicações no tratamento das seguintes condições:

A literatura sobre esse medicamento esclarece que ele também pode ser útil na esquizofrenia refratária, nas síndromes das pernas inquietas e de abstinência alcoólica, na contenção da agressividade em pacientes com demência, assim como neuropatias periféricas consequentes ao diabetes (formigamento nas mãos e pés).

Outro uso que tem se demonstrado promissor é o controle da dor neuropática na fibromialgia. Como todas essas indicações não constam da bula, elas são chamadas de off label.

Entenda como ela funciona

O seu mecanismo de ação não é totalmente esclarecido, mas o que os cientistas já descobriram é que a carbamazepina é capaz de controlar a atividade elétrica anormal do cérebro por meio da inibição dos canais iônicos (sódio e cálcio). Estes, entre outras funções, estão envolvidos na excitação dos neurônios, liberação de hormônios e neurotransmissores, e ainda se relacionam com descargas epilépticas, sincronização e propagação das crises.

Uma vez administrado pela via oral, o medicamento é absorvido no trato gastrointestinal, amplamente metabolizado pelo fígado e é excretado, principalmente, pela via renal, mas também pelas fezes.

Com um comprimido simples, a concentração máxima de carbamazepina no plasma pode ser alcançada em até 12 horas, e quando administrado na forma de solução, o pico de sua concentração pode ser alcançado em 2 horas. As explicações são de Flavio da Silva Emery, professor associado da USP de Ribeirão Preto.

Conheça as apresentações disponíveis

A marca de referência da carbamazepina é o Tegretol®, mas você pode encontrar as versões genéricas. O fármaco consta da Rename 2022 (Relação Nacional dos Medicamentos Essenciais), por isso pode ser obtido nas farmácias do SUS (Sistema Único de Saúde), bastando apresentar a receita médica.

Confira as apresentações e doses disponíveis:

  • Comprimidos - 200 mg, 400 mg
  • Comprimidos de liberação prolongada - 200 mg, 400 mg
  • Suspensão oral - 20 mg

A medicação poderá ser usada 2, 3 e até 4 vezes ao dia, a critério do médico, e o tempo de espera para o efeito desejado também variará de dias a semanas, a depender do quadro da doença.

Na maioria das vezes, esse medicamento é de uso contínuo e jamais deve ser utilizado ou descontinuado sem acompanhamento médico.

A razão para isso é que cabe ao profissional da saúde o monitoramento, identificação e tratamento precoces de eventuais efeitos colaterais, em especial alterações no fígado, bem como a redução da concentração do sódio (hiponatremia), especialmente entre pacientes idosos.

Quais são as vantagens e desvantagens da carbamazepina?

Os especialistas consultados ressaltam que esse medicamento, por ser antigo, já foi amplamente utilizado e estudado e, assim, sua ação é muito conhecida, assim como os seus possíveis efeitos colaterais e seus respectivos controles. Isso faz que a carbamazepina seja considerada segura e efetiva.

Outra vantagem destacada foi a variedade de apresentações, em especial a "líquida" (solução), que facilita a utilização na população pediátrica e geriátrica, e também permite melhor adequação da dosagem. Soma-se a isso o fato de a medicação constar da Rename 2022, o que faz dela acessível para a maioria da população.

Quanto às desvantagens, os entrevistados indicam os possíveis efeitos colaterais que, segundo eles, não podem ser considerados raros.

Saiba quais são as contraindicações

A carbamazepina não pode ser usada por pessoas que sejam alérgicas (ou tenham conhecimento de que alguém da família tenha tido reação semelhante) ao seu princípio ativo ou a qualquer outro componente de sua fórmula.

Fique também atento à presença das seguintes condições:

  • Ter ou ter tido glaucoma
  • Ter ou ter tido doenças no coração, rins, tireoide, fígado, sangue ou quadros psiquiátricos
  • Uso de antidepressivos IMAOS (inibidores da monoamino-oxidase)
  • Alergia à frutose (no caso do uso da suspensão oral que contém sorbitol)
  • Gravidez
  • Amamentação

Crianças e idosos podem usá-la?

Sim. A carbamazepina é considerada segura para pessoas nessas faixas de idade, mas esses grupos devem ter as doses dos remédios adequadas, assim como devem ser monitorados por meio de exames sanguíneos constantes para prevenção e controle dos possíveis efeitos colaterais.

Entre os pacientes geriátricos, em especial, esse cuidado deve ser ainda mais ativo para detectar precocemente efeitos colaterais como delírio, retenção urinária, aumento da pressão ocular, constipação e redução da concentração de sódio no sangue (hiponatremia).

Estou grávida e pretendo amamentar. Posso usar carbamazepina?

Embora não haja contraindicação expressa para grávidas e lactantes, o fabricante adverte que pode haver risco para o bebê, caso você utilize a medicação durante a gravidez. No entanto, o neurologista Marx Linconl Lima de Araújo Barros, chefe da Divisão Médica do HU-UFPI, diz que uma vez que a paciente esteja medicada desde antes da gestação e haja controle adequado de crises epilépticas, é possível manter o tratamento.

"Nesses casos, entendemos que a retirada do medicamento poderia representar maior perigo para a paciente do que a sua manutenção", completa o médico.

Já durante a amamentação há possibilidade de o fármaco passar em pequena quantidade para o leite materno. Assim como no caso de gravidez, caberá ao médico avaliar os perfis de risco e benefício para a gestante/lactante para a continuidade (ou não) do tratamento.

Caso esteja planejando engravidar ou descubra que está grávida, informe imediatamente seu médico.

Qual é a melhor forma de consumi-la?

A orientação é que o comprimido seja ingerido com água, e ele não deve ser mastigado, nem fracionado.

Existe uma melhor hora do dia para usar esse medicamento?

O conselho da farmacologista Patrícia Medeiros de Souza, professora associada de farmacologia clínica da UnB, é que você deve tomar o remédio sempre no mesmo horário, de preferência, na hora das principais refeições. Se isso não for possível, organize-se para fazer um lanche antes de tomar cada dose.

"A razão para isso é que os alimentos ajudam a reduzir efeitos colaterais indesejados como a náusea ou o vômito, e ainda garantem maior aproveitamento do fármaco —o que potencializa a ação desejada", explica Souza.

O que faço quando esquecer de tomar o remédio?

Tome-o assim que lembrar e reinicie o esquema de uso do medicamento, a não ser que as horas já tenham avançado tanto que a próxima dose já esteja próxima. Neste caso, despreze a dose esquecida, tome a dose no horário certo seguinte e siga com o tratamento.

É desaconselhado tomar doses em dobro de uma única vez para compensar a dose que foi esquecida. Se você sempre se esquece de tomar seus remédios, use algum tipo de alarme para lembrar-se.

Quais são os possíveis efeitos colaterais?

Este medicamento é considerado bem tolerado, seguro e eficaz quando utilizado de acordo com as orientações médicas.

Apesar disso, algumas pessoas poderão observar as seguintes manifestações, consideradas comuns:

  • Tontura
  • Sonolência
  • Alterações na coordenação motora
  • Náuseas
  • Vômito
  • Fadiga
  • Dor de cabeça
  • Leucopenia (alterações na contagem de leucócitos)

Veja possíveis manifestações menos comuns

  • Problemas dermatológicos (especialmente entre pessoas de origem chinesa)
  • Depressão do sistema nervoso central
  • Hepatotoxicidade
  • Confusão
  • Toxicidade renal
  • Ideação suicida
  • Hiponatremia

Interações medicamentosas

Algumas medicações não combinam com a carbamazepina. E quando isso acontece, elas podem alterar ou reduzir seu efeito. Avise o médico ou o farmacêutico, caso esteja fazendo uso (ou tenha feito uso recentemente) das substâncias abaixo descritas, que são exemplos de interação, mas não excluem outras que, eventualmente, possam ter a mesma ação. Confira:

Informe também ao médico ou farmacêutico o uso de suplementos como a vitamina B3, bem como a utilização de algum fitoterápico. A sugestão dos especialistas é que você mantenha consigo uma lista dos medicamentos que faça uso continuamente para que eles possam prevenir interações na hora de lhe prescrever um tratamento.

A carbamazepina corta o efeito do anticoncepcional?

Não corta, mas pode torná-lo menos efetivo. Caso esteja usando esse medicamento, sugere-se proteção complementar por meio do uso de preservativos.

O fármaco ajuda a dormir melhor?

Um dos efeitos colaterais mais comuns desse medicamento é a sonolência. No entanto, ele não tem indicação para o tratamento de insônia.

Existe interação com algum tipo de exame laboratorial?

Alguns dos efeitos colaterais, como a toxicidade do fígado e a anemia, poderiam, em tese, levar a alterações de exames laboratoriais que avaliem as funções daquele órgão (enzimas hepáticas, por exemplo), ou um simples exame sanguíneo para avaliar as condições gerais da saúde.

Toda vez que tiver de se submeter a exames durante o tratamento com a carbamazepina, informe ao médico e ao pessoal do laboratório o uso desse medicamento, bem como de outros que você use de forma contínua.

Posso beber álcool enquanto uso a carbamazepina?

Não é recomendado. A bebida poderia potencializar a sensação de cansaço, além dos efeitos colaterais do medicamento, como a tontura, a sonolência e alterações na coordenação motora, por exemplo. Além disso, o álcool sobrecarregaria ainda mais o trabalho do fígado, órgão encarregado de metabolizar o medicamento.

Em casa, coloque em prática as seguintes dicas:

  • Observe a validade do medicamento indicado no cartucho. Lembre-se: após a abertura, alguns fármacos têm tempo de validade menor, o que também é influenciado pela forma como você o armazena;
  • Leia atentamente a bula ou as instruções de consumo do medicamento;
  • Ingira os comprimidos inteiros. Evite esmagá-los ou cortá-los ao meio --eles podem ferir sua boca ou garganta;
  • Em caso de cápsulas, não as abra para colocar o conteúdo em água, alimentos ou mesmo para descartar. Sempre use a cápsula íntegra;
  • No caso de suspensões orais, agite bem o frasco antes de usar. E sempre limpe o copo dosador antes e após o uso. E armazene junto ao frasco do medicamento, para evitar misturar com outros medicamentos;
  • Prefira comprar remédios nas doses justas para o uso indicado para evitar sobras;
  • Respeite o limite da dosagem diária indicada na bula;
  • Escolha um local protegido da luz e da umidade para armazenamento. Cozinhas e banheiros não são a melhor opção. A temperatura ambiente deve estar entre 15°C e 30°C;
  • Guarde seus remédios em compartimentos altos. A ideia é dificultar o acesso às crianças;
  • Procure saber quais locais próximos da sua casa aceitam o descarte de remédios. Algumas farmácias e indústrias farmacêuticas já têm projetos de coleta;
  • Evite descarte no lixo caseiro ou no vaso sanitário. Frascos vazios de vidro e plástico, bem como caixas e cartelas vazias podem ir para a reciclagem comum.

O Ministério da Saúde mantém uma cartilha (em pdf) para o Uso Racional de Medicamentos, mas você pode complementar a leitura com a Cartilha do Instituto de Tecnologia em Fármacos (Farmanguinhos - Fiocruz) (em pdf) ou do Conselho Regional de Farmácia de São Paulo (também em pdf). Quanto mais você se educa em saúde, menos riscos você corre.

Fontes: Flavio da Silva Emery, professor associado da FCFRP-USP (Faculdade de Ciências Farmacêuticas de Ribeirão Preto da Universidade de São Paulo), atual coordenador do programa de pós-graduação da mesma instituição, membro da comissão de divulgação científica da FCFRP-USP e do sub-comitê de Drug Discovery and Development da IUPAC (sigla em inglês para União Internacional de Química Pura e Aplicada); Patrícia Medeiros de Souza, professora associada de farmacologia clínica da UnB (Universidade de Brasília); Marx Linconl Lima de Araújo Barros, neurologista e chefe da Divisão Médica do HU-UFPI (Hospital Universitário da Universidade Federal do Piauí), que integra a rede Ebserh (Empresa Brasileira de Serviços Hospitalares) e membro titular da ABN (Academia Brasileira de Neurologia). Revisão técnica: Flavio da Silva Emery.

Referências: Anvisa (Agência Nacional de Vigilância Sanitária); Maan JS, Duong TvH, Saadabadi A. Carbamazepine. [Atualizado em 2021 Ago 6]. In: StatPearls [Internet]. Treasure Island (FL): StatPearls Publishing; 2022 Jan-. Disponível em https://www.ncbi.nlm.nih.gov/books/NBK482455/.