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O que pode ser?

A partir do sintoma, as possíveis doenças


Glaucoma: perda da visão é efeito que se combate com visita anual ao médico

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Imagem: iStock

Cristina Almeida

Colaboração para VivaBem

06/10/2020 04h00

Todo mundo pensa que fazer check-up todos os anos é a mesma coisa que prevenir doenças. Na verdade, a prevenção decorre da adoção de uma série de práticas que são incorporadas ao seu cotidiano para evitar o aparecimento de doenças.

Já as visitas periódicas ao médico facilitam diagnósticos precoces que, no caso do glaucoma —uma enfermidade ocular que decorre de uma lesão do nervo óptico— podem evitar um amargo desfecho: a perda visual.

O glaucoma é a segunda maior causa de cegueira nos Estados Unidos e é responsável por mais de 12% do total dela em todo o mundo. Estima-se que, no Brasil, cerca de 1 milhão de pessoas tenham a doença, que pode acometer crianças e jovens, mas é mais comum entre os adultos maiores de 40 anos e idosos. Os dados são da SBG (Sociedade Brasileira de Glaucoma).

Mais prevalente entre as populações negra e oriental, o glaucoma é definido como uma enfermidade progressiva silenciosa porque, em geral, ele é assintomático. Isso significa que ele pode se desenvolver por meses ou anos sem apresentar sintomas, até que a pessoa perceba alguma mudança na forma como enxerga: ao olhar para frente, a visão central está preservada, mas a periférica, ou seja, a visão lateral, vai se perdendo.

A essa altura, o glaucoma já é crônico, está em seu estado avançado e requer cuidado constante.

Entenda o que é glaucoma

Este é o nome que se dá a um grupo de doenças que levam à perda da visão decorrente de uma lesão no nervo óptico.

Na maioria das vezes o prejuízo é gradual, e boa parte da visão lateral (periférica) pode se perder sem que se tenha conhecimento da enfermidade.

Por que isso acontece?

Até o momento não se sabe exatamente o que causa o glaucoma, mas a pressão alta intraocular tem relação com a maior parte dos casos. Atualmente, o parâmetro de normalidade é de até 21 mm Hg.

Esse aumento na pressão pode ser o resultado da dificuldade de drenagem do líquido ocular (fluido do olho ou humor aquoso). Tal fluido é produzido em uma parte do olho chamada corpo ciliar, situada atrás da íris (câmara posterior), e uma de suas funções é nutrir o olho.

Para cumprir seu objetivo, ele flui como um rio para a parte da frente do olho (câmara anterior). Depois é drenado por estruturas que ficam no ângulo —região onde a córnea e a íris se encontram e onde o líquido é drenado.

Para que esse sistema funcione de forma perfeita, mantendo a pressão normal, é preciso que haja um equilíbrio entre a produção do líquido e sua drenagem. O glaucoma se instala após um tempo prolongado de "sofrimento do nervo", seja por aumento da pressão intraocular, seja pela baixa vascularização no mesmo.

A importância desse nervo é que ele é formado por cerca de 1 milhão de fibras nervosas que conectam a parte posterior do olho ao cérebro. O glaucoma causa danos às células desse nervo, o que pode levar à perda irreversível da visão.

Conheça as suas variações

O glaucoma é classificado de acordo com suas variações clínicas. Confira:

  • Primário (idiopático) - não se conhece a causa da doença;
  • Secundário - está associado a algum problema sistêmico ou outras doenças oculares. São exemplos infecções, inflamações, uso de corticoides, tumores, catarata ou trauma;
  • Glaucoma de ângulo fechado (GAF) - mais frequente em orientais e hipermétropes. Nesse tipo de glaucoma há o fechamento do ângulo, ou seja, da região onde o humor aquoso é drenado;
  • Glaucoma de ângulo aberto (GAA) - é a forma mais comum e está associado a histórico familiar de glaucoma, pressão intraocular alta e ângulo aberto;
  • Glaucoma de pressão normal - a lesão do nervo óptico ocorre sem que haja aumento da pressão ocular.

Quem precisa ficar atento?

O glaucoma pode ser congênito, acometer crianças, jovens, adultos maiores de 40 anos, mas é mais comum entre os idosos.

A doença também é mais frequente nos seguintes grupos e condições de saúde:

  • Pessoas com histórico de glaucoma na família (parentes de primeiro grau, principalmente)
  • Indivíduos com pressão ocular alta
  • Idade superior a 40 anos
  • Hipermetropia
  • Miopia
  • Diabetes
  • Pessoas que fazem uso crônico de corticosteroides
  • Pacientes com lesões oculares
  • Populações negra e oriental
  • Enxaqueca
  • Hipertensos
  • Apneia Obstrutiva do Sono

Como reconhecer os sintomas

A forma mais comum dessa enfermidade, o GAA, tem como característica ser indolor e assintomático na sua fase inicial. E pode afetar apenas um dos olhos ou os dois.

Quando o GAA já está mais avançado, podem ser observadas as seguintes manifestações:

  • Pontos cegos (campos visuais que não podem ser enxergados)
  • Perda da visão lateral (periférica)
  • Visão em túnel (perde-se completamente a visão periférica, mas se vê perfeitamente de frente)

Sintomas do GAF, que é considerado uma emergência médica. A visão pode ser perdida no prazo de 2 a 3 horas):

  • Dor ocular intensa
  • Dor de cabeça intensa
  • Olho avermelhado
  • Visão enevoada
  • Halos coloridos em volta da luz
  • Perda da visão repentina

Quando procurar ajuda

A oftalmologista Luisa Aguiar, professora da disciplina de glaucoma da SBO-RJ, fala que 50% das pessoas com glaucoma desconhecem ter a doença porque não há uma queixa típica que possa fazê-las desconfiar de que algo está errado. Isso só acontecerá no estado avançado do glaucoma.

Além disso, a maioria das pessoas associa o oftalmologista somente aos óculos. "Mas a oftalmologia não se restringe à prescrição de lentes de correção. É importante associá-la a outros quadros", comenta a médica.

"A recomendação da SBO é que, a partir dos 40 anos, a visita ao oftalmologista seja anual, justamente para facilitar o diagnóstico precoce. E os pacientes devem solicitar ao médico um exame completo, o que inclui o exame de fundo de olho, e a medição da pressão —que pode ser medida em qualquer idade", completa Aguiar.

Já as orientações da AAO (Academia Americana de Oftalmologia), é que a frequência dos exames de rotina para aqueles que estão no grupo de risco para o glaucoma deve ser definida de forma individualizada, considerando a idade do paciente, os fatores de risco, raça e histórico familiar.

Como é feito o diagnóstico

Na hora da consulta, o médico irá colher o seu histórico de saúde. Além disso, ele deve fazer o exame oftalmológico completo.

A tríade de exames que compõe essa visita médica é a avaliação da acuidade visual (verifica-se a visão está boa), o exame de fundo de olho e a medição da pressão ocular. A explicação é de Leon Grupenmacher, chefe do Serviço de Oftalmologia do Hospital Universitário Evangélico Mackenzie, de Curitiba.

"É importante que o paciente cobre do médico essa prática, mas principalmente a medição da pressão e avaliação do nervo óptico, o que se faz com a ajuda de um oftalmoscópio, que permite ver o fundo do olho, além das eventuais alterações no nervo", acrescenta o oftalmologista.

O médico pode ainda solicitar um exame complementar para avaliar as visões central e periférica (exame de campo visual).

Importante saber que um único resultado desses testes não é capaz de confirmar a suspeita diagnóstica. É o conjunto de todas essas informações que ajudam o oftalmologista a definir o diagnóstico do glaucoma.

Como é feito o tratamento?

O glaucoma é uma doença crônica e séria que pode resultar na perda da visão.

"Até o momento, não há cura para ela, e o objetivo do tratamento é reduzir, ao máximo, a pressão ocular", esclarece Francisco Grupenmacher, médico coordenador da residência de oftalmologia do Hospital Universitário Cajuru e da Santa Casa de Misericórdia de Curitiba.

A educação das pessoas com glaucoma é considerada a chave para o sucesso do tratamento, porque elas precisam estar cientes dos riscos da doença e da importância do acompanhamento médico, que deve acontecer por toda a vida. A ideia é estimular a adesão ao monitoramento do avanço ou da estabilização da doença, prevenindo ou retardando suas consequências.

Importante saber que as terapias disponíveis não melhoram a visão nem reparam as perdas já existentes no nervo óptico. A boa notícia é que, com o devido tratamento, há bom prognóstico para a maioria dos pacientes. A depender do tipo da doença e a sua gravidade, as estratégias terapêuticas incluem ou combinam o uso de colírios, laser e cirurgia.

Entenda como cada prática atua no controle da doença

  • Colírios - eles podem aumentar ou reduzir a drenagem do líquido circulante no olho;
  • Laser - as modalidades são a Trabeculoplastia Seletiva a Laser (TSL) e a Iridotomia;
  • Cirurgia - Trabeculoptomia e MIGS (cirurgia minimamente invasiva para glaucoma).

A maioria das cirurgias visa aumentar a drenagem. Mas em casos muito avançados, ela pode também ser útil para reduzir a produção do líquido ocular.

Mudanças na alimentação podem ser úteis?

Não existem evidências científicas de benefício ou contraindicação de algum tipo específico de dieta para pessoas com glaucoma.

Posso continuar com a atividade física?

Ter uma rotina de exercícios melhora o estado geral de saúde, mas algumas modalidades podem alterar a pressão ocular. Informe seu médico sobre suas práticas esportivas e veja se elas podem afetar negativamente o glaucoma.

Algumas atividades são até desejáveis porque atuam no controle da pressão intraocular, destacando-se as aeróbicas (caminhada, por exemplo).

A relação entre glaucoma e mindfulness

Um recente artigo publicado no periódico Journal of Current Glaucoma Patients concluiu que a prática meditativa tem baixos custo e risco, pode ser útil para reduzir a pressão ocular de forma significativa, e ainda melhora a qualidade de vida de pessoas com glaucoma.

As razões para isso seriam os efeitos da meditação nas estruturais cerebrais, bem como na redução dos níveis de cortisol, relacionados ao estresse.

Fontes: Luisa Aguiar, oftalmologista, professora da disciplina de glaucoma da SOB (Sociedade Brasileira de Oftalmologia - Rio de Janeiro); Francisco Grupenmacher, médico coordenador da residência de oftalmologia do Hospital Universitário Cajuru e da Santa Casa de Misericórdia de Curitiba, professor titular de oftalmologia da Escola de Medicina da PUC-PR (Pontifícia Universidade Católica do Paraná) e integrante do corpo clínico do Hospital da Visão/Oftalmoclínica; Leon Grupenmacher, chefe do Serviço de Oftalmologia do HUEM (Hospital Universitário Evangélico Mackenzie - Curitiba) e chefe do Serviço de Oftalmologia da Escola de Medicina da PUC-PR. Revisão técnica: Luisa Aguiar.

Referências: SBG (Sociedade Brasileira de Glaucoma); Dietze J, Blair K, Havens SJ. Glaucoma. [Atualizado em 2020 Jun 30]. In: StatPearls [Internet]. Treasure Island (FL): StatPearls Publishing; 2020 Jan-. Disponível em: https://www.ncbi.nlm.nih.gov/books/NBK538217/; Dada, Tanuj & Gagrani, Meghal. (2019). Mindfulness Meditation: Can Benefit Glaucoma Patients?. Journal of Current Glaucoma.