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Larissa Cassiano

OPINIÃO

Texto em que o autor apresenta e defende suas ideias e opiniões, a partir da interpretação de fatos e dados.

Precisamos conversar sobre o 'chip da beleza'

O tubinho de silicone é colocado sob a pele do bumbum e libera microdoses de hormônios -
O tubinho de silicone é colocado sob a pele do bumbum e libera microdoses de hormônios

Colunista do UOL

10/11/2021 04h00

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Muitas pessoas não sabem o que é e exatamente como funciona, mas querem colocar, seja pelo nome que já é chamativo ou pela expectativa de aumento da libido, emagrecimento, tratamento da endometriose, contracepção, entre outras possibilidades.

Mas o que há por trás desse "chip da beleza"? Que chip é esse?

Primeira coisa a ser dita sobre o "chip da beleza" é que ele não é um chip. Isso mesmo: são tubos de silicone semipermeáveis de 4 a 5 cm que recebem hormônios de liberação diária, mas não possuem nenhum tipo de captação, transmissão de informações nem parte metálica.

Ele pode ser inserido no tecido subcutâneo (tecido de gordura) de qualquer parte do corpo, e a preferência dos profissionais costuma ser pela região do glúteo. Ele libera o hormônio que cai diretamente na corrente sanguínea, podendo ser utilizado no período de seis meses a um ano.

Para quem já ouviu sobre implantes hormonais para contracepção vale ressaltar que esses implantes hormonais são diferentes. O modelo utilizado exclusivamente para contracepção é o implante contraceptivo de etonogestrel (implanon) e não é o mesmo que o "chip da beleza", é um método contraceptivo reconhecido mundialmente, com licença da Anvisa e utilizado com o objetivo de contracepção.

Esses implantes hormonais são fabricados por farmácias magistrais conhecidas como farmácias de manipulação, e lá o medicamento é produzido individualmente com base na prescrição, ou seja, cada implante tem medicações e doses específicas para cada paciente. Essa forma de produção não é regulada pela Anvisa.

Hoje, os implantes que inicialmente eram prescritos por Elsimar Coutinho, ginecologista, se espalharam pelo país e estão sendo inseridos por médicos de diversas especialidades, já não apenas os ginecologistas e endocrinologistas.

Entre esses profissionais que prescrevem os implantes hormonais as indicações citadas são: endometriose, adenomiose, sangramento uterino anormal, contracepção, ganho de massa muscular, diminuição de gordura, aumento da libido, aumento do desempenho físico, entre outras.

Em setembro, a Febrasgo (Federação Brasileira das Associações de Ginecologia e Obstetrícia) se posicionou não recomendando o uso dos implantes hormonais não aprovados pela Anvisa, e na semana passada a SBEM (Sociedade Brasileira de Endocrinologia e Metabolismo) também informou que não recomenda o uso desses implantes.

E por que isso está acontecendo?

Isso está acontecendo porque, embora usados com frequência entre profissionais, na literatura médica não existem estudos de segurança com estas medicações. O Brasil é um dos poucos países no mundo que utiliza essa forma de implantes. Nos EUA, as sociedades de endocrinologia e menopausa também não recomendam o uso do hormônio desta forma.

Os estudos feitos até o momento foram com poucas usuárias ou não seguem todas as regras necessárias e não chegaram até a fase em que a eficácia e os resultados são demonstrados. Alguns argumentam que a gestrinona, homônimo utilizado nos implantes, já é utilizada há um tempo e certificada, porém esse uso e certificação se trata do uso via oral, diferente do que se faz com o implante, e como as doses não seguem um padrão e são personalizadas individualmente, fica difícil saber qual dosagem ideal é segura.

Não podemos esquecer que os implantes não são isentos de riscos e efeitos colaterais, um deles, e talvez o mais complexo, é o aumento do clítoris, além de aumento de pelo, queda de cabelo, aumento da oleosidade da pele e mudança no timbre da voz.

Temos um medicamento que está sendo utilizado em várias situações, doses muito variáveis, estão crescendo e sendo prescrito por profissionais que nem sempre tem treinamento suficiente para ajuste da dose ou manejo dos eventos adversos, porém sem regulamentação pela Anvisa, algo precisa ser feito, para que tanto usuárias quanto profissionais possuam toda segurança possível.

Gostou deste texto? Dúvidas, comentários, críticas e sugestões podem ser enviadas para: dralarissacassiano@uol.com.br.

Referências:

https://www.febrasgo.org.br/pt/noticias/item/1312-posicao-das-comissoes-nacionais-especializadas-de-

https://www.endocrino.org.br/wp-content/uploads/2021/11/Posicionamento-da-SBEM-sobre-Implante-de-Gestrinona_2021.pdf

https://elmeco.com.br/