Topo

Olhar Olímpico

Confederação prefere ficar sem dinheiro público a deixar atletas votarem

Beto Santini deve ser o próximo presidente da confederação de badminton - Divulgação
Beto Santini deve ser o próximo presidente da confederação de badminton Imagem: Divulgação

03/09/2020 04h00

Começou muito mal, para os atletas, o calendário eleitoral do movimento olímpico brasileiro. Na primeira vez que os atletas têm garantida por lei uma ampla participação na assembleia das confederações, logo a primeira votação será realizada com menos atletas tendo direito a voto do que determina a Lei Pelé. Para a Confederação Brasileira de Badminton (CBBd), é preferível perder quase 100% da sua receita a correr o risco de a oposição chegar ao poder. A Comissão de Atletas do COB pediu para a eleição ser suspensa, mas não obteve resposta.

O artigo 18-A da Lei Pelé condiciona o repasse de recursos públicos a uma série de regras de governança, entre elas que o "colégio eleitoral (seja) constituído de todos os filiados no gozo de seus direitos, observado que a categoria de atleta deverá possuir o equivalente a, no mínimo, 1/3 (um terço) dos votos, já computada a eventual diferenciação de valor". A cada três votos, um precisa ser de atleta.

Uma confederação pode não dar direito a atleta votar para presidente, mas isso a impede de receber recursos públicos. É uma escolha feita pela Confederação Brasileira de Futebol (CBF), que não se submete às regras dos artigos 18 e 18-A da Lei Pelé, mas também não pleiteia verbas públicas. Não há nenhuma ilegalidade nisso.

Agora a CBBd vai pelo mesmo caminho, com a diferença que o badminton não tem patrocinadores privados e depende dos repasses das Loterias. A confederação realiza amanhã (4) sua eleição presidencial, autorizando 15 federações e cinco atletas a votarem. De acordo com a Secretaria Especial do Esporte, que certifica quem cumpre e quem não cumpre a Lei Pelé, a lei exige oito votos de atletas quando o universo é de 23 votantes.

A confederação alega que conseguiu a certificação com seu estatuto, que tem texto considerado dúbio: "a CBBd observará a razão de, no mínimo, 1/3 dos votos à categoria dos atletas, considerando todos os candidatos no gozo do seus direitos". A área jurídica da entidade afirma que, por esse texto, os atletas têm direito a um voto a cada 3 votos de federações. Como são 15 federações, seriam cinco atletas na assembleia. E que esse texto foi considerado, pela secretaria, como adequado à Lei Pelé.

Incomodada, a comissão de atletas reclamou. E uma comissão eleitoral supostamente independente deu razão à interpretação que prejudica os atletas, alegando que cabe a ela apenas analisar o estatuto, não a Lei Pelé. "As deliberações deste colegiado vêm no sentido da manutenção da estabilidade das relações associativas, e de respeito às decisões soberanas do próprio sistema federativo do badminton brasileiro", justifica a comissão, presidida pelo advogado Leonardo Andreotti.

Para a Secretaria Especial do Esporte, a Lei Pelé é clara. "O número de 1/3 da categoria de atletas deve ser calculado a partir do número de votos de todo o pleito eleitoral, e não de uma única categoria, como por exemplo, as federações", diz a pasta. Realizando uma eleição com critérios que não esses, a CBBd pode ter seu certificado cassado e perder acesso ao dinheiro público repassado pelo COB e pelo CPB. Os dois comitês foram procurados e não quiseram comentar o assunto.

O advogado da CBBd alega a eleição segue o previsto em estatuto e que, em 2021, quando a certificação vencer, a renovação será discutida com a secretaria. Confrontado com a declaração da secretaria de que a proporção deve ser de um atleta para cada três votantes no total, Bruno Gelmini disse que "duvida" que a secretaria não dará o certificado à confederação.

O atual presidente da CBBd, Francisco Ferraz, do Piauí, não pode concorrer à reeleição. Seu candidato é o Beto Santini, diretor-técnico da confederação. Os atletas apoiam o árbitro campeiro Hilton Fernando dos Santos, já selecionado para apitar os Jogos de Tóquio. Com os atletas tendo oito votos, a eleição seria apertada, com favoritismo de Hilton. Como eles terão apenas cinco, a tendência é que Santini seja eleito e administre uma confederação sem dinheiro.