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Renato Mauricio Prado

A insensatez galopante

Richard Rios em ação pelo Flamengo durante clássico contra o Vasco - Thiago Ribeiro/AGIF
Richard Rios em ação pelo Flamengo durante clássico contra o Vasco Imagem: Thiago Ribeiro/AGIF

11/05/2020 04h00

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Já são mais de 11 mil mortos no país, quase 2 mil deles no Rio de Janeiro, estado que ostenta a maior taxa de mortalidade no Brasil (acima de 9%). Se houvesse um mínimo de sensatez entre os cartolas do futebol carioca, os signatários daquele absurdo documento, sugerindo a volta aos treinamentos "o mais breve (sic) possível", estariam agora pedindo desculpas, mortos de vergonha. As honrosas exceções foram os presidentes do Fluminense e do Botafogo que, sabiamente, se recusaram a assinar tamanha idiotice.

Sinceramente, nem chega a me surpreender que o presidente da Federação, Rubens Lopes, e seus teleguiados, dos clubes pequenos, defendam tal sandice. Mas ver o Flamengo e o Vasco capitanearem tal estupidez é de chorar. Detalhe, Alexandre Campello, presidente cruz-maltino é médico! Como pode ser conivente com uma barbaridade dessas?

No caso rubro-negro, há ainda um agravante: o clube acaba de perder, para a Covid-19, o seu mais antigo funcionário, o massagista Jorge Luís Domingos, o Jorginho, que tinha quase 40 anos de serviço e era adorado por todos os jogadores. Além disso, ao testar o elenco, seus parentes e os funcionários do departamento de futebol, um total de 293 pessoas, foram encontrados 38 casos positivos (índice altíssimo), entre eles três atletas. Como achar viável retomar os treinos assim?

Notoriamente insensíveis quando o assunto requer um mínimo de humanidade, Landim e Bap dão novas mostras de que têm uma fria planilha excel de receitas e despesas no peito no lugar do coração - vide a novela das indenizações dos meninos do Ninho, o corte da premiação dos funcionários mais humildes, a dispensa de sobreviventes do incêndio, as 60 demissões recentes, a resistência a parar o campeonato e agora a pressa em voltar - contrariando até a posição do vice-presidente de futebol Marcos Braz.

Desta vez, porém, estão dando um passo adiante nessa insensatez galopante ao quererem colocar centenas de pessoas envolvidas nessas atividades em risco. E os jogadores que não se iludam: a tentativa de antecipar a volta aos treinos e só o princípio. O que essa turma quer mesmo é retomar os jogos o mais rapidamente possível. A qualquer custo. Dane-se a saúde dos atletas e dos demais envolvidos.

Melhor mudar de assunto e levantar o astral, contando histórias. Como dizia aquela velha seção da Reader's Digest, "Rir é o melhor remédio".

Olha a penitência!

Uma de fé, que me foi contada por meu fiel escudeiro Antônio Roberto Arruda, companheiro valioso e inesquecível nas redações do Globo e do Extra. Nos anos 60, na progressista cidade de Bicas (terra natal do Arrudinha), nas Minas Gerais, quando o assunto era futebol, o padre Manuel Pires Pereira pintava e bordava na paróquia.

Rubro-negro de quatro costados, o sacerdote não escondia sua paixão: rezava pelo Flamengo durante os sermões da santa missa e comemorava as vitórias rubro-negras com memoráveis carreatas movidas a vinho e puxadas pelo carro da pastoral, em um autêntico trio elétrico.

O lado torcedor do religioso, porém, não era nem sequer a sua face mais apaixonada no mundo da bola. Padre Manuel gostava mesmo era de jogar como ponta-de-lança, defendendo as cores do Sport Clube Biquense, o arquirrival do Leopoldina, em clássicos dos mais renhidos.

Um belo dia, na decisão da liga local, cansado de apanhar do zagueiro Zicão (que media 1,90m e pesava mais de 100 quilos), o religioso aproximou-se do adversário e, assim como quem não quer nada, soprou-lhe ao ouvido:

"Olha aqui, companheiro, mais uma botinada dessas e eu serei obrigado a tornar público aquele pecado mortal que você me confessou há alguns dias, antes da comunhão. Você é quem sabe: ou as minhas canelas ou a sua reputação".

Zicão, que era um baita negão, ficou branco da cabeça aos pés. E o Padre Manuel meteu quatro golaços naquela tarde, saindo do estádio nos braços da torcida.

Nos anos 60, em Bicas, quando o assunto era futebol, quem diria, Padre Manuel virava um autêntico capeta...

Amor cubano

Essa faz parte do folclore dos Jogos Pan-Americanos. No ano em que a competição se realizou em Winnipeg, no Canadá, um grupo de atletas cubanos passeava pela cidade quando um dos cartolas da delegação, um velhinho de oitenta e tantos anos, sofreu um ataque cardíaco. Caído no chão, pediu, como último desejo, uma bandeira de Cuba, para se despedir de sua pátria amada.

Procura daqui procura dali, não havia por perto nem sequer uma flâmula de mão. Foi quando uma das mais belas atletas do grupo, penalizada com o sofrimento do ancião, confessou que tinha tatuada em uma das nádegas a bandeira cubana. Solícita, logo se dispôs a ajudar.

No meio de uma rodinha improvisada, virou-se de costas para o moribundo, baixou o short e deixou à vista a bandeira gravada no meio daquela colossal abundância...

O velho a agarrou fortemente e beijou a bandeira, bradando:

"Mi querida Cuba! Me despido com recuerdos, mi vieja Habana, mi hermosa tierra".

E tome de beijos e mais beijos na bandeira, diante da turma consternada. Depois de algum tempo, o agonizante pediu, então, à mulher:

"Mira, chica, ahora date la vuelta que tambíem quiero despedirme com um beso bien grande de mi amado Fidel..."