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Rafael Reis

REPORTAGEM

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Candidata a sensação da Copa, Dinamarca não descarta ter Eriksen no Qatar

Técnico Kasper Hjulmand e Eriksen conversam durante treino da Dinamarca - Divulgação
Técnico Kasper Hjulmand e Eriksen conversam durante treino da Dinamarca Imagem: Divulgação

09/02/2022 04h20

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Semifinalista da Euro-2020, derrotada apenas duas vezes nas últimas 11 partidas, dona da segunda melhor campanha das eliminatórias europeias da Copa do Mundo e apontada como uma das possíveis surpresas do Qatar-2022, a Dinamarca ainda não desistiu de ter Christian Eriksen na competição deste ano.

Em entrevista exclusiva ao "Blog do Rafael Reis", o técnico Kasper Hjulmand evitou falar sobre a possibilidade de contar com o meio-campista de 29 anos no torneio da Fifa. No entanto, admitiu que se o camisa 10 recuperar o ritmo de jogo, seu retorno à seleção será "natural".

Menos de sete meses depois de sofrer uma parada cardíaca em campo no primeiro jogo da Dinamarca na Euro, o astro foi apresentado no começo desta semana como reforço do Brentford para a reta final do Campeonato Inglês.

Eriksen precisou deixar a Inter de Milão, onde estava desde 2020, porque a legislação italiana não permite a escalação de jogadores que façam uso de marca-passos (ele teve de implantar um desfibrilador cardíaco depois do incidente de junho).

Na Inglaterra, essa restrição não existe. O meia, que já está treinando com seus novos companheiros desde segunda-feira, poderá participar normalmente de todas as competições do seu clube, o 14º colocado da Premier League.

"Precisamos lembrar que o Christian é um jogador de alto nível. Então, se conseguir recuperar o ritmo de jogo, o natural é que acabe sendo convocado novamente e faça parte da seleção", afirmou Hjulmand, em conversa por telefone na semana passada.

Durante o papo de quase meia-hora, o jovem treinador de 42 anos também revelou que é um apaixonado pelo futebol brasileiro e que chegou a chorar quando viu a seleção de 1982 ser eliminada pela Itália da Copa na Espanha.

Hjulmand ainda falou sobre suas expectativas para o Qatar-2022, a presença cada vez maior de filhos e netos de imigrantes africanos na seleção e sobre como o futebol vai muito além da busca pela vitória.

"Futebol não é resultado apenas, é amizade, é ajudar as pessoas. O que aconteceu com Eriksen nos fez lembrar dos valores fundamentais do futebol. Temos que ser gratos ao jogo", afirmou o treinador dinamarquês.

Confira a entrevista com o técnico da Dinamarca

BLOG DO RAFAEL REIS - A Dinamarca vem sendo apontada por muita gente como candidata a ser a maior surpresa da Copa do Mundo. Como você lida com essa expectativa?

KASPER HJULMAND - Isso é reflexo das coisas que estamos fazendo e dos bons resultados que temos colhido. Consideramos essas expectativas como algo positivo porque elas só existem porque fizemos as pessoas acreditarem na gente. No entanto, sabemos que países grandes e tradicionais têm mais recursos e possibilidades. Não somos como eles, mas vamos trabalhar duro e com muita determinação. Não somos a nona melhor seleção do mundo [no ranking da Fifa] à toa. Acreditamos em nós mesmos.

E qual é a sua expectativa individual para a seleção dinamarquesa no Qatar-2022? Qual resultado te deixaria satisfeito?

Essa é uma pergunta que sempre me fazem. Mas, sinceramente, tudo depende do sorteio das chaves e de outros fatores que não tenho como controlar. Então, o que posso fazer é sonhar com uma grande Copa e com o melhor resultado possível. Não coloco uma meta porque ela dependeria de muitas variáveis. O que posso dizer que os sorteios serão determinantes para o nosso planejamento.

Você acredita que essa Dinamarca pode ser melhor que as de 1986, 1992 e 1998? Por quê?

É muito difícil comparar times de épocas diferentes. Hoje, temos um grande grupo de jogadores. E, assim como na Copa-1986 e na Euro-1992, o país inteiro está do nosso lado. Temos uma nação jogando junto conosco e o apoio de crianças apaixonadas pela seleção. Esse espírito coletivo é algo especial. Mas, precisamos lembrar que antigamente o número de seleções nos campeonatos era menos. Em 1992, quando ganhamos a Euro, eram só oito participantes. Agora, são 24. Quanto mais jogos têm um torneio, menor é a chance de uma surpresa e maior é o favoritismo das grandes seleções.

Na sua opinião, por que a Dinamarca evoluiu tanto nos últimos anos?

São vários fatores, e eles não são todos esportivos. Nosso crescimento é resultado de um trabalho social. A Dinamarca tem uma identidade do muito clara. Nossos jogadores são ambiciosos, mas também generosos. Possuem uma mentalidade coletiva, torcem para a equipe mesmo quando não estão em campo. As estruturas do país permitiram esse crescimento. Os clubes e as federações melhoraram. Temos hoje uma geração de jogadores atuando nos grandes times dos grandes campeonatos nacionais. No futebol é assim, quando você planta direito, colhe resultados.

Yussuf Poulsen, Pione Sisto e Mohamed Daramy são alguns dos jogadores da seleção que possuem raízes africanas. O quanto os processos de imigração ajudaram na evolução do futebol dinamarquês?

A diversidade é uma força tanto na sociedade quanto em um time de futebol. Você não vai conseguir jogar bem futebol se escalar um time com 11 atacantes. A diversidade é uma necessidade, é algo indispensável para o sucesso. Essa é uma mensagem importante que o futebol pode passar para o mundo.

A parada cardíaca sofrida por Eriksen durante a Euro foi a cena mais chocante que você já vivenciou em um campo de futebol? Você chegou a pensar que ele não escaparia dessa?

Quando Christian caiu no gramado, ele chegou realmente a morrer [ficou cinco minutos sem sinais vitais]. Mas eu já havia passado por algo semelhante. Quando eu era jogador, um companheiro de time também desabou no gramado [foi atingido por um raio] e ficou em coma. Sobre o Eriksen, foi algo terrível ver alguém tão fantástico passar por uma situação tão pesada. Eu sabia que algo muito forte estava se passando com ele, mas só os médicos tinham capacidade de falar o que realmente estava acontecendo. O Christian é um jogador maravilhoso, mas é ainda melhor como pessoa.

Eriksen acabou de assinar o Brentford e vai jogar o resto da temporada na Premier League. Você ainda conta com ele para a Copa do Mundo?

Acho que ainda é cedo para tomar qualquer decisão a esse respeito. Primeiro, ele tinha que voltar à normalidade e ter novamente uma vida boa, o que já está acontecendo. O próximo passo vem agora, que é retornar ao futebol. Mas, precisamos lembrar que o Christian é um jogador de alto nível. Então, se conseguir recuperar o ritmo de jogo, o natural é que acabe sendo convocado novamente e faça parte da seleção.

Depois de tudo que aconteceu, qual é o seu sentimento sobre Eriksen? Dá para sua relação com ele ser apenas a de um técnico com um jogador?

Nós, os dinamarqueses, experimentamos algo único, que não apenas uniu o time durante a Euro, mas também junto o nosso povo. Posso dizer que a nação inteira sentiu o mesmo. Todos passamos a trabalhar mais forte depois daquele dia. Conversamos sobre os nossos sentimentos e reescrevemos nossa história de uma forma fantástica. O mais importante é que lembramos que há coisas mais valiosas do que ganhar uma partida de futebol. Futebol não é resultado apenas, é amizade, é ajudar as pessoas. O que aconteceu com Eriksen nos fez lembrar dos valores fundamentais do futebol. Temos que ser gratos ao jogo.

Se você pudesse escolher um jogador brasileiro para defender a Dinamarca, quem seria?

Ah, eu não tenho como escolher um só, não. São muitos. Minha primeira grande paixão no futebol foi o Brasil-1982. Eu tinha dez anos e chorei com a eliminação de vocês na Copa do Mundo. Vocês são muito talentosos. Não dá para escolher um só.

E quem são as suas seleções favoritas para ganhar a Copa-2022?

Olha, acho que são as mesmas seleções grandes de sempre: Argentina, Brasil, Inglaterra, Alemanha, França, Espanha, Itália, se conseguir a classificação, e talvez a Holanda. Essas equipes são sempre as favoritas. Só que os favoritos sempre podem perder e acabar nos dando uma chance.