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'Comecei escovando cabelo aos 16 e hoje cuido de VIPs como Rafa Kalimann'

Pri Bueno/Divulgação
Imagem: Pri Bueno/Divulgação

Luiza Souto

Colaboração para Ecoa, no Rio de Janeiro (RJ)

10/08/2023 06h00

Daniele Cristina dos Santos, de 31 anos, tinha apenas 4 quando o pai foi morto em uma favela do Rio de Janeiro. Para conseguir sustentar sua irmã, que era recém-nascida, e ela, sua mãe, aos 21 anos, dobrou o número de faxinas que já fazia "para chegar, talvez, com um danone em casa".

Moradora do Complexo do Alemão, na zona norte carioca, hoje Daniele atende por Dany Shekinah e superou - e muito - o sufoco de sua infância. É uma referência no mundo do mega hair, já arrumou cabelo de famosas, só emprega mulheres da comunidade no seu salão e ensina cabeleireiras a faturarem até R$ 15 mil por mês.

"Eu quero que elas sonhem junto comigo", diz ela a Ecoa do terraço de seu espaço, com o Cristo Redentor bem distante.

Para ajudar a mãe a fechar as contas do mês quando ainda era adolescente, Dany começou a vender açaí e cachorro-quente na porta da escola onde estudava. Tinha 13 anos e ganhava cerca de R$ 100 reais por semana.

Escova no cabelo das vizinhas

Aos 16, começou a fazer escova no cabelo das vizinhas e, num único dia, faturava o mesmo valor que conseguia com as vendas durante toda a semana. Com o dinheiro extra, resolveu investir no ramo e foi fazer um curso de cabeleireiro.

No ano seguinte, Dany alugou um pequeno espaço na casa da avó para abrir um salão. Chamou três amigos para oferecer serviços que ela não sabia fazer, como o de manicure e escova progressiva. Com o dinheiro que passou a ganhar, aos 18 anos veio a primeira grande realização,

Dani - Luiza Souto - Luiza Souto
Hoje Dani tem um salão de três andares no Complexo do Alemão, comprou uma casa para ela e outra para a mãe e avó
Imagem: Luiza Souto

"Fiz o casamento dos meus sonhos, na igreja e com festa. Passei a morar na casa da minha avó e transferi o salão para Nova Brasília, a comunidade mais movimentada do Complexo", conta.

Cinco anos após as mudanças, a cabeleireira diz que se sentiu estagnada: as contas estavam fechando no azul, mas não sobrava nada para expandir. Ela foi, então, buscar mais especialização e fez um curso de coloração. Com a nova especialidade, viu o número de clientes aumentar.

A chave do crescimento é o conhecimento.

Dany Shekinah

Virada na carreira

O espaço em Nova Brasília ficou pequeno para a nova fase. Assumiu, então, um grande empréstimo para comprar a casa da avó e voltou com o salão para onde tudo começou.

A essa altura, já estava pagando sua casa própria fora do Complexo, e para dar conta dos boletos, investiu em mais cursos. Foi quando chegou no mega hair.

Com os estudos, criou uma técnica própria, em que colore a cabeça da cliente sem colocar química no cabelo natural. E só utiliza fio brasileiro, vindo do sul do país. Ele tem as melhores estruturas do mundo e é dos mais caros, podendo custar mais de R$ 5 mil.

"No começo, achava que ninguém pagaria por um cabelo brasileiro, mas pagam, mesmo sendo da comunidade", diz ela, que já colocou suas mãos na cabeça de famosas, como a da atriz Rafa Kalimann e a da influenciadora digital Júlia Peixoto.

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A cabeleireira só emprega em seu salão mulheres da comunidade e promove eventos para ensiná-las a empreender
Imagem: Luiza Souto

Nos cinco anos em que trabalha com mega hair, ela conseguiu comprar uma casa para a mãe e a avó, alugou a de uma tia, adquiriu seu primeiro carro, fez as festas de aniversário da filha de 5 anos, acrescentou mais três andares no salão e contratou 20 mulheres da comunidade.

Com mais de 42 mil seguidores no Instagram, conquistados de forma orgânica, é ela mesma quem treina todas as funcionárias. "Quando não sei alguma técnica, chamo alguma empresa parceira para dar aula de graça. Não ligo para ter uma profissional expert, mas ela tem que ter força de vontade."

A minha maior motivação é poder pagar um salário de qualidade, porque eu quero que elas cresçam.

Dany Shekinah

"A comunidade prospera"

Além dos treinos presenciais, Dany vende cursos online e presta mentoria semanal para as alunas que compram seu pacote de vídeos. Com um sobrenome que, em hebraico, significa "a glória de Deus se manifesta", diz que algumas funcionárias já até compraram casa e carro com o trabalho no salão.

E ela não para de criar oportunidades para ver as vizinhas empreenderem. Neste ano, criou o Empreendedorismo por trás das vielas, evento realizado numa escola da comunidade, com empresários de diversos segmentos contando sobre suas trajetórias. Segundo Dany, mais de 200 moradores do Complexo participaram. Tudo com patrocínio que ela mesma conseguiu. E já está preparando uma nova edição.

Dani - Pri Bueno/Divulgação - Pri Bueno/Divulgação
O próximo passos de Dani é investir em implante capilar e em um novo espaço na zona oeste da cidade
Imagem: Pri Bueno/Divulgação

Mas antes disso, a cabeleireira retirou um lixão em frente ao seu salão e arrumou o local com bancos, coqueiros e balanço. Ela está agora atrás de doações de tintas para colorir muros da comunidade, e "deixar as coisas mais bonitinhas", complementa Dany, que apesar de hoje morar fora da comunidade bate ponto todo dia no local.

"O empreendedor tem um papel muito grande na comunidade, e hoje sei que consigo inspirar mulheres que não sonham, ou que são desacreditadas pela geografia. Mas a comunidade prospera." O próximo passo de Dany é investir em implante capilar e em um novo espaço na zona oeste da cidade.

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