Volvo trata carro autônomo como "questão de honra" da Suécia
Quanto vale um carro que se dirige sozinho? E qual o custo? Nenhuma empresa envolvida nos atuais projetos se dispôs a responder claramente às questões até o momento. Não se trata apenas de segredo industrial: além das cifras altíssimas dos protótipos, é realmente complicado mensurar gastos monetários e em ações humanas de toda a burocracia necessária para viabilizar o inédito uso de veículos autônomos. Para a Volvo, ter uma resposta à altura da Mercedes-Benz e um carro real se guiando sozinho pelas ruas em 2020, vale muito: virou questão de honra.
Como UOL Carros mostrou na reportagem inicial da série, a indústria já se mobiliza há algumas décadas e definiu, no último ano, que o pontapé inicial da circulação de autônomos será dado em 2020 -- tudo a partir da data anunciada pela Mercedes. Acontece que este "espetáculo" da mobilidade não depende apenas das montadoras. Governo e sociedade civil precisam participar.
Daí o limite de seis anos estipulado pela Mercedes-Benz: este é o prazo que a marca acredita precisar para que legisladores e governos da Alemanha definam as regras locais para a condução totalmente autônoma. O mesmo vale para a Toyota, no Japão, e a escolha da Olimpíada de Tóquio de 2020 como "pano de fundo" não foi aleatória: se uma Copa do Mundo facilita a tarefa de liberar recursos para infraestrutura, o mesmo vale para os Jogos Olímpicos. De quebra, a Toyota espera que o bom ânimo dos administradores favoreça a legalidade, na capital do país, de um centro expandido ao mesmo tempo cheio de turistas e atletas e dominado por veículos rodando sem motoristas no comando.
Nos Estados Unidos, a Ford anunciou na segunda-feira (13) parceria com a Universidade de Michigan para a construção do Centro de Transformação da Mobilidade, espécie de incubadora para carros autônomos americanos que reunirá acadêmicos, engenheiros da montadora e de outras empresas e também "todos os níveis de governo", segundo comunicação da Ford. "[O Centro de Transformação da Mobilidade] é fundamental para obter um sistema de veículos conectados e automatizados que poderiam reduzir drasticamente os acidentes, aliviar os congestionamentos, diminuir a poluição e o consumo de energia", afirmou o responsável pelo projeto, Peter Sweatman.
Reunir todas as cabeças pensantes e os poderes atuantes em um mesmo local para decidir o futuro dos carros autônomos no menor tempo possível e ao menor custo é também a alternativa encontrada pela Volvo.
UOL Carros visitou a sede da montadora em Gotemburgo, viu de perto os primeiros protótipos da marca e mostra, na segunda reportagem da série especial sobre carros autônomos, como a Volvo desenvolve e viabiliza a tecnologia Autopilot, ou carro autodirigido, em conjunto com governo, universidades e empresas da Suécia. É pode dizer: apesar de embrionária, a iniciativa sueca já se mostra fascinante.
ONDE NASCE O AUTÔNOMO SUECO
O estudo de autônomos da Volvo é chamado de Drive Me, que pode ser traduzido livremente como "me leve", e tem como campo de provas o rodoanel da cidade de Gotemburgo, bem como o Parque Científico de Lindholmen, que apesar do nome laboratorial é uma bela praça de 1.000 m² na área portuária da cidade, que funciona como centro integrado de pesquisas tecnológicas e estudos acadêmicos ligado à Universidade de Gotemburgo, ao governo local e a companhias europeias de ponta.
Os prédios do local são futuristas e suas cores contrastam com o céu nublado da cidade. A Volvo está lá com seu QG; a Ericsson também tem sede no local e será anunciada em breve como colaboradora -- vai produzir o sistema de comunicação online entre carros, pista e centrais de tráfego, bem como a rede de armazenamento de dados na nuvem (mapas, posição dos carros e informações do trânsito atualizados). Estão presentes ainda os departamentos de controle do trânsito (equivalente aos Contran/Detrans estaduais) e o órgão sueco que faz a função de Ministério dos Transportes. O lugar parece inabitado em alguns momentos, mas 21 mil pessoas trabalham, moram ou convivem na área (toda Gotemburgo tem 600 mil habitantes). O objetivo de Lindholmen é chegar a ter 30 mil pessoas em... sim, em 2020.
Andando 30 minutos de carro para cada um dos sentidos da rodovia principal, chega-se tanto ao aeroporto (de um lado), quando ao centro da cidade (de outro). Quem preferir o transporte público, pode usar linhas de ônibus ou de ferry-boats (balsas como as que ligam Rio e Niterói) integrados ao sistema local de transporte público. O passe custa 25 coroas suecas, que equivalem a R$ 8. Há até um bilhete único que dá direito a usar todos os modais -- além dos ônibus e barcos, há bondes e aluguel de bicicletas: as diárias para adultos ficam em R$ 120.
A aposta da Volvo é que, quando não estiverem dispostas a andar pela rua, as pessoas sigam para Lindholmen em carros autônomos, chegando antes, mas sem deixar de fazer tudo o que fazem em ônibus e balsas -- ler livros, conversar ao celular e até tirar o atraso do sono.
"Como as três áreas de atuação civil estão aqui, com empresas de Transportes, Tecnologia e de Mídia junto a acadêmicos, as autoridades enxergam a importância e acabam querendo participar, sabem que dará visibilidade", afirma Leif Axelsson, coordenador de projetos do Parque Científico de Lindholmen, ao responder a UOL Carros sobre o que atrairia a colaboração de legisladores e governantes.
E a Volvo precisa da aprovação política para que o projeto avance: apesar dos benefícios teóricos sobre melhoria do trânsito e redução do total de acidentes que poderiam ser alcançados com carros que se dirigem sozinhos -- e se dirigem de forma ideal, usando menos combustível e ocupando menos espaço nas ruas --, ainda é preciso convencer pessoas e legisladores de que eles são viáveis legalmente.
Afinal, quem responderia pelos danos materiais e humanos causados por acidentes do futuro com veículos autônomos? A montadora (que faz o carro), o proprietário (que é dono, mas não estava dirigindo) ou o governo (que é dono da via por onde o veículo circula)? Quer algo mais difícil e/ou polêmico? O que ocorre se um futuro acidente envolver um carro autônomo e seu motorista "distraído" e um carro normal com o motorista distraído de fato ao ver a pessoa do carro ao lado sem as mãos ao volante? Antes disso, é preciso definir ainda quem vai pagar por melhorias em ruas e rodovias, que precisam de sistemas de telefonia 3G/4G e até de imãs em alguns trechos para permitir que os carros autônomos se encontrem.
"Esta plataforma de testes serve para mostrarmos os benefícios econômicos e sociais do carro autônomo, mas também para analisarmos quais são as expectativas de quem usa um veículo desses, a reação de quem não usa e todos os aspectos legais", nos conta Eric Coelingh, responsável pela tecnologia de segurança e apoio ao motorista da Volvo. "A única forma de entender isso tudo é testando de fato".
IMAGINA EM 2018
E o tal "teste de fato" ocorre desde o final de 2013, com os primeiros protótipos -- a Volvo faz segredo sobre o número, mas vimos e filmamos duas unidades do sedã S60 e uma do hatch V40, todas adaptadas -- circulando pelo entorno da área de Lindholmen e pelos 50 quilômetros do anel viário de Gotemburgo com técnicos e engenheiros a bordo -- os carros ainda não têm permissão para circular na área central da cidade.
A partir do final deste ano, a marca pretende convocar consumidores interessados em fazer o leasing (um contrato parcelado, que dá direito ao uso, mas não à posse do carro) de 100 novos carros de uma nova geração de protótipos, que serão testados até 2017 ou 2018. A seguir, será iniciada a fase de ajuste fino e, se tudo funcionar como previsto, virá o lançamento do primeiro carro 100% autônomo da marca, em 2020.
A Volvo é explícita: pretende criar uma solução autônoma que se estenda a todos os modelos da companhia. Ainda assim, o boom do lançamento será dado com um modelo especifico, que chame a atenção (e que provavelmente será caro), feito sobre a novíssima plataforma da marca que estreia em setembro, no Salão de Paris, com o novo novo XC90.
E O PREÇO?
De novo, é difícil arrancar valores dos porta-vozes da marca, mas sabemos que o portfólio atual da montadora na Europa vai de 22.600 (o hatch V40) a cerca de 42.000 euros (a geração atual do XC90), equivalente ao intervalo entre R$ 68.600 e R$ 130 mil. No Brasil, porém, os preços sobem: de R$ 123 mil (pelo V40) a R$ 240 mil (o XC60, menor que o CX90, mais caro). Fora dos gravadores, um dos engenheiros da marca nos disse que não é difícil imaginar que o protótipo atuais custem centenas de milhares de euros e que o carro final tenha o mesmo nível do Mercedes-Benz Classe S, que é vendido na Europa a iniciais 81 mil euros (sendo que o preço cobrado no Brasil beira os R$ 600 mil).
A Volvo sabe, porém, que ter preço competitivo será crucial, sobretudo numa sociedade com tantas alternativas como a sueca. Confrontando outro engenheiro, Henrik Lind, especialista em segurança ativa, com o possível custo, obtivemos a seguinte resposta: "O consumidor da Volvo sabe que nos diferenciamos pela segurança e, pode apostar, estão dispostas a gastar um pouco mais caro por isso", aposta Lind. "Mas se você colocar muitos opcionais e a solução custar 200 mil euros, por exemplo, ninguém vai pagar".
Viagem a convite da Volvo
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