Lucas Veiga

Lucas Veiga

Siga nas redes
Só para assinantesAssine UOL
Opinião

É verdade que quem não se ama não consegue amar outra pessoa?

A pergunta que dá título à coluna dessa semana é repetida a cada episódio do reality "RuPaul 's Drag Race". No programa, a apresentadora convoca as participantes a um intenso mergulho em suas verdades e vulnerabilidades como caminho para o autoamor.

No capítulo "Compromisso: que o amor seja o amor próprio" do livro "Tudo Sobre o Amor", a escritora estadunidense bell hooks nos mostra como o ato de se amar não compõe o nosso processo educativo ou formativo, de modo que podemos chegar à vida adulta sem saber exatamente como ou o que seria na prática amar a si mesmo.

Soma-se a isso o fato de no processo de socialização, por vezes, vivenciarmos experiências de negligência e violência que podem ser internalizadas, desencadeando uma baixa autoestima.

Em relação ao racismo, por exemplo, sofrer discriminação simplesmente por ter a cor da pele e os traços que se tem pode contribuir para o surgimento de um afeto de auto-ódio. A violência racial projetada sobre a pessoa negra é introjetada, resultando em sentimentos de inferioridade e até mesmo em comportamentos autodestrutivos.

Apesar disso, bell hooks defende que por mais que nós, pessoas negras, não tenhamos gerência sobre o racismo estrutural ou, como apresento no meu livro "Clínica do Impossível", por mais que o fim imediato do racismo não esteja posto como possível, precisamos assumir o compromisso de trabalhar ativamente pela desmontagem da autodepreciação e pela construção do autoamor.

Uma pista que a autora nos oferece como direção para o autoamor é "introduzir ativamente em nossa vida padrões de pensamento e comportamento construtivos e positivos" que visam exatamente encontrar formas de afirmar o próprio valor, sem sucumbir a experiências de desvalorização e violência sofridas.

Em diálogo com o escritor Nathaniel Branden, a ensaísta destaca a importância da autoconsciência, autoaceitação, autorresponsabilidade, autoafirmação e de viver com propósito, como dimensões fundamentais da autoestima. Isso implica na "disposição de se posicionar em favor de si mesmo, de ser quem sou abertamente, de me tratar com respeito em todos os encontros humanos".

Quanto mais estamos conectados com nosso senso de valor, mais reconhecemos o senso de valor dos outros. Quanto mais somos capazes de nos aceitar e nos afirmar, mais conseguimos aceitar e afirmar os outros. A capacidade de vivenciar o autoamor é condição de possibilidade para experimentarmos o amor em todas as nossas relações.

Opinião

Texto em que o autor apresenta e defende suas ideias e opiniões, a partir da interpretação de fatos e dados.

** Este texto não reflete, necessariamente, a opinião do UOL.

Deixe seu comentário

Só para assinantes