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1ª mulher a pilotar aviões de linha no Brasil conta bastidores da profissão

Claudine Melnik começou a trabalhar na área com 23 anos - Arquivo pessoal
Claudine Melnik começou a trabalhar na área com 23 anos Imagem: Arquivo pessoal

Ed Rodrigues

Colaboração para Universa, em Recife

23/10/2022 04h00

Imagine embarcar em um avião e perceber que a comandante é uma mulher. Que orgulho, não é? Hoje, Dia do Aviador, Universa conta a história da pilota Claudine Melnik, 53, pilota há 27 anos e primeira mulher a assumir o comando de uma aeronave de linha no Brasil.

Claudine é natural de Curitiba, Paraná, começou na companhia Latam —na época, a empresa ainda se chamava Tam— como comissária de bordo, em 1992, aos 23. Dois anos depois, foi promovida a copilota de aeronaves Caravan C208, um monomotor de voos fretados. O ineditismo na carreira foi em 1995, quando ela finalmente realizou o sonho de se tornar pilota. Hoje, ela comanda o maior avião da frota, o Boeing 777, com capacidade para 410 pessoas, além do 787, e faz rotas internacionais do Brasil para América do Norte, Europa e África.

Pausa na história: alguns dicionários já aceitam a palavra pilota como feminino de piloto. O termo também é usado por Claudine e por outras pessoas no meio dos transportes aeroviários. Portanto, é correto.

Voltando a Claudine. O sonho de voar, conta, vem desde criança. "Não sei exatamente se foi por causa de uma viagem de férias que fizemos em família ou se essa vontade era anterior. Mas o fato é que desde muito pequena eu me via voando de alguma forma", conta a comandante.

Ela, então, projetou sua carreira nas alturas e correu atrás da capacitação para se tornar pilota. Cursou aulas teóricas em Curitiba e, mais tarde, foi à prática, em Minas Gerais.

Claudine acumula 20 mil horas de voos, principalmente para rotas internacionais - Arquivo pessoal - Arquivo pessoal
Claudine acumula 20 mil horas de voos, principalmente para rotas internacionais
Imagem: Arquivo pessoal

Quando ingressou na Latam, a profissional já possuía as carteiras necessárias para ser pilotar um avião e, assim que surgiu a oportunidade, realizou a migração para o cargo que sempre quis seguir.

Na companhia, realizou voos domésticos durante quatro anos e, quando a empresa adquiriu a sua primeira aeronave para voos de longo curso, fez parte da primeira turma de copilotos que voaram do Brasil ao exterior. O primeiro voo internacional foi para Miami, nos Estados Unidos.

A Universa, ela lembra que, embora o cargo seja majoritariamente masculino, nunca sentiu preconceito por ser mulher. Ela ressalta que se submeteu aos mesmos testes de proficiência ao longo da carreira, desde o curso inicial, e às mesmas cobranças para as mesmas aptidões.

"Às vezes, as pessoas acham que pode haver algum teste de força física para ingressar na carreira, onde poderia acontecer uma natural desvantagem para a mulher, mas esse não é o caso na nossa profissão", explica.

"Você sabe mexer com todos aqueles botõezinhos?"

No início do trabalho como pilota - Arquivo pessoal - Arquivo pessoal
No início do trabalho como pilota: "Já perguntaram se eu sabia fazer baliza com o avião"
Imagem: Arquivo pessoal

No início da carreira, o fato de ser uma mulher e pilota do avião despertava bastante a curiosidade nos passageiros, relembra Claudine, que diz já ter ouvido de passageiros se ela sabia mesmo para que serviam "todos aqueles botõezinhos" da cabine. "Também já perguntaram se tenho força para trocar pneu de avião", diverte-se.

"Uma outra vez, um passageiro reportou críticas ao meu trabalho porque tive que aguardar minha vez para se aproximar para um pouso, então ficamos no ar. E ele achou que estávamos perdidos já que tinha visto o aeroporto lá de cima, e nós, segundo ele, não", diz, em mais um momento em que ri de suas lembranças.

Quanto ao preconceito, a pilota lembra que já foi alvo até de mulheres. E homens chegam a questionar coisas do tipo: "Sabe fazer a baliza com a aeronave?".

"No mais, me divirto com o que pode passar na cabeça dos meus queridos passageiros. Quando viajo ou trabalho com outra pilota, me sinto muito orgulhosa e certa de que será mais um voo muito tranquilo", diz.

"Torço para que tudo caminhe bem quando estou longe de casa"

Mãe de dois filhos, Claudine diz que sua profissão exige uma grande doação pessoal e destaca que pratica o eterno exercício da culpa de não estar presente em momentos familiares significativos e insubstituíveis.

"No mais, estou sempre torcendo para que tudo caminhe bem enquanto estou a milhas longe de casa", diz ela, orgulhosa do lugar que alcançou. "Neste ano, completo 30 anos de casa e acredito que tudo está na ordem que deveria estar."

Para Claudine, a aviação pode ser um pouco mais difícil para as mulheres por causa da própria autocobrança feminina, não apenas em relação à vida pessoal, mas ao desejo de fazer o que faz da melhor maneira possível.