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Juiz que desdenhou de Lei Maria da Penha recebe pena leve e mantém salário

O juiz Rodrigo de Azevedo Costa recebeu uma pena branda mesmo após destratar vítimas de violência doméstica - Reprodução
O juiz Rodrigo de Azevedo Costa recebeu uma pena branda mesmo após destratar vítimas de violência doméstica Imagem: Reprodução

De Universa, em São Paulo

17/08/2022 15h20

O juiz Rodrigo de Azevedo Costa, que desdenhou da Lei Maria da Penha e destratou mulheres em audiências online de uma Vara de Família em 2020, foi julgado na tarde desta quarta-feira (17) em sessão do TJ-SP (Tribunal de Justiça de São Paulo). Em audiências, ele chegou a dizer que não estava "nem aí" para a lei nem para a medida protetiva de uma vítima de violência doméstica. A sentença determinou ao juiz a pena de remoção compulsória, que significa que ele será afastado de São Paulo e colocado em outra cidade, onde continuará a atuar como juiz. A comarca para onde ele será encaminhado ainda vai ser definida pelo TJ-SP.

Todos os desembargadores presentes (22 homens e 2 mulheres) votaram contra o voto do relator, o desembargador Xavier de Aquino, que tinha indicado pela disponibilidade, uma pena mais grave, que afastaria o juiz temporariamente das funções, ainda recebendo salário. A pena máxima a ser aplicada a um juiz seria a aposentadoria compulsória, afastamento definitivo do cargo, ainda com salário, mas, segundo fontes consultadas pela reportagem, essa é uma pena mais rara.

Um dos juízes que participaram da sessão definiu a conduta do juiz Rodrigo como "desastrosa". Mesmo assim, não decidiram pela pena mais pesada.

A sessão, presidida pelo presidente do TJSP, Ricardo Mair Anafe, durou pouco mais de uma hora e contou com a presença do advogado de Rodrigo, Pedro Giberti, que alegou que o juiz estava com síndrome de burnout na época das audiências. Também o colocou como vítima da reportagem publicada na época do caso pelo site Papo de Mãe, parceiro do UOL. Segundo o advogado os vídeos tinham sofrido "edição prejudicial", fato contestado pelos juízes presentes que tiveram acesso a todas as audiências na íntegra e constataram, então, a gravidade.

A audiência foi acompanhada pelas mulheres que foram maltratadas pelo juiz Rodrigo de Azevedo Costa. Ouvidas por Universa, se mostraram decepcionadas com a decisão.

A sentença determinou ao juiz a pena de remoção compulsória, que significa que ele será afastado de São Paulo e colocado em outra cidade, onde continuará a atuar como juiz. A comarca para onde ele será encaminhado ainda vai ser definida pelo TJ-SP.

O advogado Pedro Giberti, responsável pela defesa de Rodrigo no caso, foi procurado por Universa. "Foi a decisão que eu esperava", disse.

"Não faria sentido colocar o juiz em disponibilidade [dar uma pena mais grave] porque embora as condutas nas três audiências tenham sido reprováveis, ele estava doente. Há um laudo psiquiátrico no processo, um médico nomeado pelo TJ viu os três vídeos na íntegra, teve oportunidade de avaliar comportamento dele durante os surtos e produziu um laudo dizendo que ele estava com síndrome de burnout, por esgotamento, além de alteração psiquiátrica que foram determinantes do comportamento dele", afirmou.

Após o caso, Rodrigo procurou tratamento psiquiátrico e terapia, diz o advogado.

Relembre o caso

Em dezembro de 2020, o site Papo de Mãe revelou que o juiz Rodrigo de Azevedo Costa desdenhou da Lei Maria da Penha durante uma audiência em que se analisava um pedido de pensão. Na época, disse que "se tem lei Maria da Penha contra a mãe (sic), eu não estou nem aí. Uma coisa eu aprendi na vida de juiz: ninguém agride ninguém de graça". O ex-casal participava da audiência, e a mulher havia feito uma denúncia contra o companheiro por violência doméstica.

Também estavam presentes duas advogadas. Em dado momento, o juiz se dirigiu à defesa da vítima e disse: "Doutora, eu não sei de medida protetiva, não estou nem aí para medida protetiva e estou com raiva já de quem sabe dela. Eu não estou cuidando de medida protetiva".

Rodrigo ainda chegou a fazer ameaças dizendo, por exemplo, "eu tiro a guarda de mãe". Também insinuou que se a vítima fizesse um novo boletim de ocorrência contra o ex, poderia ter problemas com a guarda, pois, segundo ele, "ficar fazendo muito B.O. depõe muito contra quem faz".

O juiz foi afastado e, na sequência, a Corregedoria do TJ-SP (Tribunal de Justiça de São Paulo) abriu um processo para investigar sua conduta.

Na época, ele afirmou que não se pronunciaria "antes do término dessa apuração para evitar o risco de qualquer nulidade do procedimento. Esclareço ainda que a juízes é vedado pela Loman (Lei Orgânica da Magistratura Nacional) comentar processos em andamento sob as suas competências)".

Depois que a história veio à tona, outros vídeos de audiência em que mulheres foram constrangidas pelo mesmo mesmo juiz foram revelados. Em um deles, ele diz à uma mãe que "se não tem como cuidar [do filho], então dá para adoção, põe num abrigo".

"A senhora escolheu um mau pai, a senhora escolheu um cara sem dinheiro. Azar é o seu [...] Se ele é mau pai, eu não tenho culpa. Eu vou fazer o quê? Vou pegar este negão e encher ele de tapa? Não é meu trabalho este", disse em outro momento.