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Remoção de tatuagem feita por agressor é lenta e dolorosa, dizem médicas

Justiça mantém prisão de jovem que fez tatuagem no rosto de ex-namorada  - Reprodução/ Twitter
Justiça mantém prisão de jovem que fez tatuagem no rosto de ex-namorada Imagem: Reprodução/ Twitter

Luiza Souto

De Universa, do Rio de Janeiro

24/05/2022 11h39

A jovem de 18 anos vítima de violência e que teve o nome do ex-namorado tatuado por ele em seu rosto pode conseguir retirar a marca que o agressor deixou. De acordo com profissionais ouvidos por Universa, a tatuagem pode ser removida, mas o processo levará meses e deve ser dolorido.

De acordo com médicas, a vítima deve procurar uma dermatologista que tenha o aparelho adequado para a remoção da tatuagem. A médica Mariana Anabuki, de São Paulo, disse que é possível apagá-la com o Laser ND Yag, que vai atuar na quebra dos pigmentos da tinta.

Segundo Mariana, o aparelho pode ser utilizado em qualquer tipo de pele, mas as mais escuras correm um maior risco de efeitos colaterais, como manchas ou cicatrizes residuais.

Outra informação importante é: trata-se de um procedimento doloroso, embora seja possível utilizar anestésico local. O tratamento dura meses, pois a pele precisa de um tempo de recuperação após o procedimento, que pode gerar algumas bolhas e casquinhas. Geralmente é indicado o uso de um creme para ajudar no processo. É preciso esperar a pele cicatrizar entre uma sessão e outra.

"No caso dessa vítima, não é uma tatuagem muito grande nem tem desenho. O fato de o agressor ter usado unicamente pigmento preto facilita a remoção. Nesses casos, geralmente realizamos entre seis e dez sessões", afirma Mariana, que diz ainda estar disponível para atender a jovem gratuitamente.

Pele pode não voltar a ser como antes

A dermatologista Carolina Milanez, de Mogi das Cruzes, recomenda laser de picossegundos ou Q switched, que mandam a energia do laser em pouquíssimo tempo para tentar não lesionar os tecidos ao redor. E alerta: nem toda pele volta a ser como antes:

"Muitas vezes a pele não volta a ser como era antes e conseguimos ver, por exemplo, uma cicatriz. E nesse caso ainda é preciso conhecer a profundidade da tinta, porque isso dificulta também a retirada já que seriam várias camadas da pele a alcançar", aponta Carolina, pós-graduada em cosmiatria pela Unifesp (Universidade Federal de São Paulo) e membro da Sociedade Brasileira de Cirurgia Dermatológica (SBCD).

Tatuadora não recomenda a camuflagem

Tatuadora há 20 anos, Karlla Mendes separa dois dias no mês para cobrir marcas de vítimas de violência, erros médicos e pacientes com câncer desde 2017. Mas nesse caso de Taubaté, ela atenta, a recomendação mesmo é a retirada da tinta, com máquina específica, conforme apontou Mariana.

Ela atenta para isso porque há tatuadores que trabalham com camuflagem de cicatrizes e olheiras, usando pigmento com a tonalidade próxima à da pele da cliente, o que não funcionaria com a vítima.

"No caso dessa vítima nada vai cobrir o preto. Pode pigmentar, mas quando cicatrizar a cor escura vai permanecer", explica ela, criadora do projeto We Are Diamonds, que atende vítimas de violência em situação de vulnerabilidade. Ela, que mora na Austrália, esteve no Brasil este fim de semana atendendo mulheres na Tattoo Week, uma das maiores convenções de tatuagem da América Latina.

"Consegui atender a uma vítima de atropelamento, outra que teve 38% do corpo queimado ao acender uma lareira e uma mulher que foi agredida pelo ex-companheiro e tinha uma cicatriz no pulso", ela lista.

Rede de apoio é fundamental para apagar também os traumas

Se a marca de uma tatuagem parece relativamente fácil de sair, o trauma causado por este tipo de violência muda a neurobiologia do cérebro, com consequências que desencadeiam desde ansiedade à ideação suicida. São danos que muitas vezes acabam impedindo que a pessoa saia do ciclo de violência, explica a psicóloga Carolina do Amaral e Silva.

E para sair desse ciclo, ela explica, o primeiro passo é ter consciência do que acontece. E contar com uma boa rede de apoio como família e amigos, além de assistente social e psicóloga, e uma advogada comprometida com os direitos da mulher.

"O impacto do abuso psicológico é enorme, e dificilmente temos recursos internos para dar conta sozinhas. O sofrimento é intenso. E as consequências da violência só podem ser tratadas, quando ela acaba", ensina Carolina, que é especialista em sexualidade humana pela USP.

"E cabe lembrar que abusadores também precisam de tratamento, para que não continuem perpetuando violências", ela finaliza.

O homem de 20 anos que tatuou o rosto da ex foi detido. Ele é investigado pela DDM (Delegacia da Mulher) de Taubaté e o caso corre em segredo de Justiça.