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Rodrigo Mattos

REPORTAGEM

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CBF pede rescisão de acordo da Série A suspeito de pressão na era Caboclo

Goiás é um dos clubes que decidiu usar novas placas - (Foto: Divulgação/Palmeiras)
Goiás é um dos clubes que decidiu usar novas placas Imagem: (Foto: Divulgação/Palmeiras)

19/04/2022 04h00

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Com Igor Siqueira

A CBF entrou com um pedido de rescisão dos contratos de placas do Brasileiro com a Sport Promotion com alegação de uma dívida de R$ 34,8 milhões. Essa reivindicação ocorre em meio a uma disputa entre 12 clubes da Série A com a empresa para tentar romper seus acordos.

Há uma suspeita expressa em processo judicial de que esses contratos foram feitos pelos clubes por pressão da gestão de Rogério Caboclo, ex-presidente da confederação. E a Sport Promotion acumulou uma dívida com a CBF, que não era cobrada pela entidade até agora. O presidente da entidade, Ednaldo Rodrigues, assumiu agora em definitivo a confederação. Caboclo nega qualquer direcionamento ou pressão na escolha da empresa e afirma que sempre exigiu o cumprimento de contratos.

A história começa em 2019. Então, 19 clubes da Série A - todos menos o Athletico- assinaram acordos de placas individuais com a Sportpromotion. A CBF aparecia como anuente do negócio.

Em 2022, 11 clubes - Ceará, Atlético-MG, Coritiba, Cuiabá, Juventude, Fortaleza, Fluminense, Goiás, América-MG, Atlético-GO,Avaí - decidiram romper seus contratos com a Sport Promotion para assinar com uma nova empresa, a Brax. O Botafogo também rompeu seu acordo para exibir marcas próprias. A Sport Promotion foi à Justiça comum e conseguiu uma liminar para manter os acordos - a maioria ignorou a decisão.

Agora, a CBF entrou com um pedido de rescisão do acordo com a Sport Promotion em uma ação em um tribunal arbitral, corte que o contrato indica como responsável por decidir a questão. A alegação é de que a empresa atrasou R$ 34,8 milhões em valores a serem quitados em 2021 e 2022 referentes às placas do Brasileiro das Série A e B. Há ainda pagamentos a vencer em abril de 2022.

A CBF repassava o dinheiro para os clubes referentes aos seus direitos e deveria receber da Sport Promotion. De acordo com as alegações da entidade, isso não ocorreu. Por isso, a confederação argumentou que a empresa cometeu três inadimplementos dos contratos em vigor e pede a rescisão do acordo. Já havia uma cobrança anterior não quitada. O valor total pode chegar a quase R$ 50 milhões com as parcelas por vencer até o final de abril.

Questionada, a Sport Promotion afirmou desconhecer a cobrança da CBF.

No processo judicial, de disputa entre clubes e Sport Promotion, 11 times da Série A alegaram que foram pressionados pela gestão de Caboclo a assinar com a empresa. A afirmação é feita em uma recurso para tentar derrubar a decisão em favor da empresa. A concorrência ocorreu em 2019 após seguidos fracasso anteriores para tentar vencer as placas, depois de a Globo abrir mão desses direitos.

"Relatam os agravantes (os clubes) que o contrato em questão se origina de um processo licitatório controvertido e que, diante da pressão exercida pela administração da CBF da época, muitos dos clubes se viram forçados a celebrar o negócio com a autora. Aduzem, ainda, que diversamente da decisão agravada, a pandemia não interferiu de forma grava no contrato", diz o trecho de uma decisão do Tribunal de Justiça, que foi favorável à Sport Promotion.

O dono da Sport Promotion, José Coelho Leal, o Kiko, tinha uma relação próxima com o ex-presidente da CBF Marco Polo Del Nero. A assessoria da empresa nega qualquer proximidade com o dirigente: diz que mantinha relação institucional como com outras entidades. Caboclo, presidente em 2019, foi eleito com apoio de Del Nero e tinha uma relação ainda próxima com ele nessa época.

O blog ouviu duas fontes envolvidas na negociação das placas com a condição de anonimato. Uma relatou que, sim, houve pressão da CBF por fechar com a Sport Promotion, inclusive com a menção de que a falta de acerto causaria problemas na logística. A outra fonte afirmou que não viu nenhuma pressão da confederação e que a Sport Promotion apareceu como única solução após fracassos seguidos de outras propostas.

Questionada, a Sport Promotion afirmou que houve concorrência pelas placas auditada pela EY - antiga Ernest & Young - e negou qualquer pressão da CBF. A EY, de fato, acompanhou o processo da disputa, embora não tenha auditado. A mesma posição foi dada por Caboclo, como pode ser visto ao final do texto.

Em seu pedido de rescisão do contrato, na corte arbitral, a CBF alega ser a titular dos direitos das placas. Então, os contratos assinados pelos 11 clubes com a Brax pelas placas também não seriam válidos pois não tiveram a anuência da entidade.

Caso ganhe a ação na corte arbitral, a CBF vai conseguir o rompimento de todos os 19 contratos de clubes com a Sport Promotion, inclusive aqueles que não rescindiram. São os casos de Flamengo, Corinthians e Palmeiras. A intenção da entidade é também que o tribunal arbitral determine quem tem os direitos de negociar as placas e fazer um acordo com os clubes.

Está em discussão na entidade ainda que dirigentes anteriores da CBF que não cobraram a dívida sejam responsabilizados caso a entidade não consiga receber da Sport Promotion.

A CBF afirmou que não se pronunciaria sobre o caso por estar em juízo. Já Caboclo, por meio de sua assessoria, negou qualquer pressão pelo contrato e afirma ter cobrado valores pendentes da Sport Promotion. Veja sua posição completa abaixo:

"1) A CBF sempre cobrou rigorosamente todos os valores devidos pela Sport Promotion. A entidade jamais deixou de cobrar qualquer valor devido pela empresa, inclusive notificando a Sport Promotion ao cumprimento de suas obrigações sob pena da CBF adotar todas as medidas legais cabíveis. Tais atitudes alcançaram seus objetivos e a Sport Promotion, na ocasião, cumpriu com as suas obrigações.

2) Não houve nenhuma pressão por parte da CBF para que clubes viessem a subscrever o referido contrato, e nem havia interesse da entidade para tanto. Todo processo de contratação da empresa que comercializaria as placas de publicidade dos jogos foi realizado por meio do BID, processo concorrencial conduzido pela Ernst & Young, empresa de auditoria, diretamente com os clubes envolvidos, que tinham o livre arbítrio da escolha da empresa de sua preferência. Não houve por parte da CBF qualquer participação ou ingerência que não fosse pelo melhor resultado econômico para os clubes, a partir da organização de uma negociação coletiva para esse fim.
Importante destacar que os clubes sequer eram obrigados a subscrever os contratos, a exemplo do Palmeiras, e que alguns como Flamengo e Corinthians o fizeram espontânea e individualmente com a mesma empresa Sport Promotion. Posso garantir que nunca tratei deste tema com qualquer clube do Brasil."