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'Defensor' de mulheres, Bolsonaro deveria se posicionar sobre caso Robinho

Robinho, ex-atacante do Santos e da seleção brasileira, declarou voto em Jair Bolsonaro - Reprodução/Instagram
Robinho, ex-atacante do Santos e da seleção brasileira, declarou voto em Jair Bolsonaro Imagem: Reprodução/Instagram

Colunista do UOL

05/10/2022 04h00

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Como se fosse um filme do genial Quentin Tarantino, vou começar escrever esse texto pelo fim da história. Voltando no tempo, mas também indo adiante. Como se fosse, por exemplo, Pulp Fiction. Mas não se trata de uma ficção. Infelizmente, vou falar de fatos reais, com base em uma sentença judicial.

O Ministério Público de Milão fez o pedido de extradição do ex-jogador Robinho, condenado a nove anos de prisão por estupro, em fevereiro. Mas o pedido só agora chegou à justiça brasileira, após envio do Ministério da Justiça da Itália.

Numa noite de 2013, lá na cidade do Milan e da Internazionale, Robinho e seus amigos saíram para se divertir numa boate. O entendimento da palavra "divertimento", entretanto, é diferente para algumas pessoas. Principalmente para quem quer levar vantagem em alguma situação por se achar uma pessoa superior a outra.

Nesse caso, Robinho e seus amigos encontraram uma garota albanesa que, provavelmente, ficou encantada ao se encontrar com o jogador famoso na Itália, que jogava em um clube importante e na seleção brasileira.

Quando perceberam a idolatria da menina, que já estaria bebendo, pensaram em um "divertimento" — que seria divertido apenas para eles. Para a garota, seria uma violência, um crime.

Possivelmente ela até ficaria com o Robinho numa boa. Por confiar, por se sentir segura ao estar com uma pessoa pública. E, claro, o mais importante de tudo em qualquer relação: estar a fim de curtir com alguém. Não pensou em nenhum momento que estava correndo riscos.

Mas Robinho e seus amigos se aproveitaram da menina, que estava vulnerável por estar alcoolizada. Ela foi estuprada. Foi ignorado se ela estava querendo, gostando ou não. Para eles, o importante era o "divertimento", sem se preocuparem minimamente com ela. Riram, debocharam, enganaram, iludiram e cometeram um crime perverso e hediondo.

Uma amiga socorreu a garota, totalmente em pânico e chocada pelo que tinha acontecido com ela. Foi à delegacia e denunciou ter sido vítima de estupro coletivo de um grupo de pessoas, incluindo um jogador famoso.

Robinho foi um excelente jogador. Fez uma das mais incríveis jogadas do futebol brasileiro, dando várias pedaladas na final do Brasileiro de 2002 em cima do jogador corintiano Rogério. Jogou duas Copas do Mundo pelo Brasil, embora não tenha se firmado como o jogador que todos nós pensávamos. Mas a pergunta é: e daí?

Tudo o que Robinho fez no futebol se apaga quando ele comete um crime desses, ainda mais com áudios gravados de conversas dele com um amigo, rindo da história, dizendo que ela estava bêbada e não se lembraria de nada, minimizando o fato de forçá-la a lhe fazer sexo oral, dizendo que aquilo não era transar — típico da escola do ex-presidente americano Bill Clinton.

O ex-jogador foi condenado pela justiça italiana a nove anos de prisão em janeiro deste ano, quando já estava no Brasil. Ele mentiu descaradamente diversas vezes e teve apoio de alguns "amigos", dizendo que teria o privilégio da dúvida. Mas qual dúvida? A sentença está dada pela justiça, e não tem mais recurso.

Hoje em dia, Robinho passeia pelas praias do litoral sul de São Paulo. Sorrindo, jogando futevôlei, recebendo visitas ilustres como a do meia Diego Ribas, do Flamengo, com quem fez dupla talentosa no Santos. Um mês antes da sentença definitiva, também passeou com Neymar nas férias do jogador do PSG no Brasil — na época, foram visitar a avó do camisa 10.

Existe um grande silêncio, que significa conivência, no meio do futebol. Não fossem revelações trazidas pela imprensa, sobre o conteúdo do processo de estupro que ele já respondia na Itália, e a reação de parte da sociedade, Robinho teria voltado a jogar normalmente pelo Santos em 2020. Quando assinou o pré-contrato, o fato de responder a um processo por uma acusação tão grave como um estupro nunca foi considerado um problema.

Na sexta-feira (30), Robinho interrompeu a ausência nas redes sociais para declarar apoio ao presidente Jair Bolsonaro, candidato à reeleição. Poucos dias depois, chega à Justiça do Brasil esse pedido de extradição, que não será cumprido porque a lei brasileira impede que seus cidadãos sejam extraditados. Mas o judiciário pode decidir que Robinho cumpra a pena aqui.

É preciso dizer que Bolsonaro não tem poder de decisão sobre a extradição ou a prisão de Robinho — como disse, isso ficará a cargo da Justiça.

Mas o presidente tem um longo histórico de agressões verbais a mulheres, principalmente jornalistas e opositoras políticas. Na campanha para a reeleição, mente descaradamente, dizendo que apoia e protege as mulheres.

Será? Então chegou a hora de uma demonstração de respeito a todas as mulheres, principalmente aquelas que são vítimas de estupro. E agora, Jair? Não seria um bom momento de posicionar? Afinal, você é ou não é um defensor das mulheres?