Foi assim, sem pompa, sem despedida e com uma mensagem irritada, que Robinho confirmou ao UOL o que nunca anunciou oficialmente: não joga mais futebol profissional. Condenado a nove anos de prisão por estupro de uma jovem na Itália, o ex-jogador está sem clube desde 28 de fevereiro de 2021, quando acabou seu último contrato com o Santos.

A condenação final de Robinho aconteceu no dia 19 de janeiro deste ano. Nesse dia, a Corte de Cassação de Roma, a última instância da justiça italiana, rejeitou o recurso apresentado por Robinho e por Ricardo Falco, amigo do ex-jogador, e confirmou a condenação dos dois a nove anos de prisão por violência sexual em grupo contra uma mulher albanesa em uma boate em Milão, em 2013.

A sentença é definitiva, sem possibilidade de recurso, e a polícia italiana já busca por Robinho. Quer dizer: buscar não é o termo exato. O que os italianos fizeram foi pedir para a polícia brasileira o paradeiro do condenado para, então, pedir sua extradição. Como o Brasil não extradita seus cidadãos, a Itália trabalha com a possibilidade de pedir para que Robinho cumpra pena no Brasil. O Itamaraty confirmou essa possibilidade.

O andamento do caso, a partir disso, fica nebuloso: fontes ligadas à Justiça italiana afirmam que, para que o processo continue, precisam de uma resposta da Polícia Federal sobre o paradeiro de Robinho no Brasil. Só que essa informação não chega à Itália.

A reportagem tentou entrar em contato com a PF e questionou sobre providências a serem tomadas em relação ao caso. A resposta foi seca. "Não há informações relacionadas ao fato a serem disponibilizadas por essa assessoria".Sem dados sobre o paradeiro do jogador, o UOL foi a Santos contar onde está e como vive Robinho desde que foi condenado. Rodando pela Baixada e falando com pessoas que conviveram com o ex-atleta nas mais diversas frentes, a reportagem reconstruiu uma rotina cuidadosa e bastante diferente da mantida nos tempos de idolatria.

Foi questão de tempo até que as perguntas por Robinho chegassem aos ouvidos de Robinho. Foi neste contexto, incomodado, que ele mesmo entrou em contato e, entre mensagens, enviou as mensagens que abrem esta reportagem. Depois de confirmar que não joga mais futebol, pediu para ser deixado em paz.

Procurando Robinho

"Como é que não localiza alguém que todo mundo sabe onde mora?", disse o garçom de um botequim dentro do Shopping Jequiti, em Guarujá-SP. A questão surgiu logo após o trabalhador descobrir que a Polícia Federal não tinha respondido à Justiça italiana sobre o paradeiro de Robinho.

O ex-jogador costumava frequentar o local. Quando aparecia, atendia fãs para autógrafos e fotos. "Desde então, sumiu", contou o garçom. "Outro dia o Péricles estava aqui", continuou. "Tirou foto com todo mundo, mas pediu distanciamento. Era pandemia, né?"

O local é bastante frequentado por celebridades por causa de sua localização: fica ao lado de um hotel de luxo na praia de Pernambuco e é próximo ao condomínio Jardim Acapulco, onde famosos como Pelé, Neymar e a apresentadora Eliana possuem mansões. Robinho também tem uma casa lá.

O Jardim Acapulco conta com um centro comercial dentro de seus portões, com padaria, mercado e restaurantes. Quem é morador não precisa sair para nada. Mesmo assim, o ex-atacante do Santos costumava se deslocar, com frequência, cerca de 1,5 km até uma padaria que fica em frente ao botequim do garçom amigo.

Robinho sentava-se no banquinho redondo, se debruçava sobre o balcão em frente à estufa de salgados e comia uma coxinha ali mesmo. "Eu já vi aquele goleiro grandão do Corinthians aqui também. Cássio, né?", lembrou a atendente no dia que a reportagem esteve por lá.

A padaria é tradicional na cidade e conta também com um míni mercado. "Ele levava um monte de coisa, não comprava só pão não. Mas faz tempo que não aparece, mesmo. Desde esse negócio da condenação", contou a caixa do estabelecimento.

Mesmo dentro do Jardim Acapulco, Robinho deixou de transitar em áreas comuns. Sua casa nunca esteve tão habitada quanto no início deste ano, mas o ex-jogador ficava da porta para dentro. Seu carro até era visto rodando pelas ruas do condomínio, mas quem falou sobre o assunto conta que era o motorista quem dirige. Sozinho e sem destino certo, ele apenas "esquenta o veículo" para que não fique tanto tempo parado. Depois de uma volta rápida dentro do condomínio, retorna à garagem.

Neste momento, mudar de cidade, ir para um lugar em que ele seria menos visado, não parece fazer parte dos planos do ex-jogador. Robinho mudou seu número de telefone e não forneceu novos contatos a corretores de imóveis com quem tinha alguma relação. Houve quem conseguiu levar até ele oportunidades de negócio, mas as respostas secas frearam as conversas.

Mesmo amigos e pessoas que um dia trabalharam com Robinho relatam um sumiço, tanto do mundo real como do virtual. Nos primeiros cinco meses do ano, parou de responder a mensagens e não interagia mais nos grupos de conversa do qual fazia (ou segue fazendo) parte.

Idolatria que deu lugar ao isolamento

"Irmão, tô chegando aí na Baixada e já sabe, né? A gente precisa encontrar o pedalada. Não vou embora sem uma foto com ele".

O ano era 2015 quando um torcedor mandou essa mensagem para um dos repórteres que escrevem esta reportagem. Santista de uma geração atrás, daquela que saiu da fila em 2002 com as pedaladas de Robinho, aquele torcedor tinha o atacante, que estava de volta ao Santos naquele ano, como ídolo.

"Já estou de plantão nos stories dele e a gente vai fazer plantão na praia", continuou. Era de comum conhecimento que Robinho sempre jogava futevôlei nas areias de Santos. Não era difícil encontrar fotos com fãs que passavam pela praia. Sete anos depois, Robinho quase não aparece por ali. Dar autógrafos e tirar fotos com os fãs também não é mais algo natural.

A vida que adotou após a condenação é condensada perfeitamente em uma cena: um carro com vidros fechados entra no estacionamento de um hotel de luxo na praia de Pernambuco, em Guarujá. O homem que está dentro do carro sobe por um elevador exclusivo que dá acesso a uma área fechada e restrita.

Em outra época (ou outra vida?), Robinho entraria no local pela porta da frente, sorrindo e com uma caneta na mão. Na época em que mais ficou isolado após o julgamento, foi escondido ali, no hotel da família Sílvio Santos, que ele realizou treinos físicos.

Do outro lado do mar

Robinho tem outra casa na Baixada Santista, do outro lado da balsa, na orla da praia do canal 6 de Santos. O Point GE, uma barraca de praia de um amigo do ex-jogador, fica a dois quilômetros dali. É nessa barraca que fica a rede de futevôlei que é, pelo menos para quem passa por lá, "propriedade" de Robinho. O ex-atleta tem seu nome pintado na madeira que sustenta a rede.

O Point GE só abre durante temporada, mas a rede está sempre ali. A área geralmente fica vazia, ao contrário das várias outras, ao lado. Em volta da "Robinho", jogadores casuais se divertem em outras redes, professores comandam treinos com grandes grupos de alunos espalhando areia para todos os lados na praia. Mas a "Robinho" fica vazia.

"Ele não tem vindo, não, mas colou aí semana passada, um sábado de manhã. Mano, ele tava todo disfarçado, tá ligado? Máscara, óculos escuros e chapéu. Nem reconheci", contou uma pessoa que treina naquela região. "Mas depois ele se desmontou, tirou o disfarce e foi jogar com os parceiros dele", continuou.

Robinho não postou nada em sua conta no Instagram entre dezembro de 2021 e junho de 2022, quando fechou a apuração desta matéria. Quem visitou o perfil neste período encontrou uma série de stories antigos, o mais recente, de janeiro de 2021. Mostravam cenas de família e do cotidiano, conversas com amigos. Um homem feliz e mostrando sua vida, indicando que, ao menos naqueles tempos, ele se sentia confortável postando em redes sociais. Não é possível ter certeza de que ele não publicou stories nesses seis meses, mas nada aconteceu nas últimas semanas, durante a apuração.

Só que ele não conseguiu ficar completamente longe das redes sociais. Pessoas que o encontram pelas ruas tiram fotos. Robinho já foi citado e marcado por amigos ou fãs em algumas ocasiões. Ele apareceu em um vídeo gravado dizendo: "7 a 2, eu e o Juliano. Fica forte contra aquele rapaz lá, o Sapo, e aquele modelinho ali. Vai tomar surra. Sapo, e o Vagner, tá perdendo e vai pagar um monte de caldo de cana pra mim", disse para quem estava com o celular que gravava o momento. O depoimento foi postado na página chamada 'Resenha do coroa'.

Em fevereiro, gravou um vídeo, provavelmente a pedido de um fã, fazendo um desafio para uma partida de futevôlei. "Fala, Lucas, aqui é o Robinho. Estou gravando esse vídeo para te mandar um abraço, obrigado pelo carinho. E assim, se você quiser apanhar no futevôlei, vem aqui no canal 3. Eu e essa fera aqui. Abraço", diz Robinho.

Ele também compareceu a um evento nas quadras de futevôlei de Malcom, ex-Corinthians, e foi um dos convidados do aniversário de Ricardo Goulart, do Santos. Tirou foto com alguns atletas, foi marcado em publicações do goleiro João Paulo e do lateral Felipe Jonatan. Quem foi à festa disse que Robinho ficou "na dele, mais reservado". Anos atrás, o comportamento seria diferente, analisam pessoas que o conheceram nas passagens como jogador do Santos.

Um dos lugares que Robinho segue frequentando é o estúdio do seu barbeiro, localizado no shopping The Office Mall, no canal 3. No início de abril, o atacante compareceu ao local em companhia de seus filhos para cortarem o cabelo. Um registro, inclusive, foi feito no instagram do profissional, que trabalha com Robinho há anos.

Quando vai ao barbeiro, Robinho costuma entrar rapidamente e sair após o corte, normalmente pela manhã, quando o movimento é menor. Às vezes, atende fãs que o reconhecem.

Até pouco tempo atrás, Robinho ainda atuava frequentemente em um futebol amador no Clube de Regatas Saldanha da Gama, mas diminuiu suas aparições. Tinha como outro passatempo transitar pela orla da praia de Santos em uma scooter elétrica; o veículo chegou a ser apreendido pela Polícia no ano passado, depois de ser usado em local proibido.

Igreja e Santos viram os refúgios de Robinho

Segundo diversas fontes ouvidas pelo UOL, essas aparições em Santos marcam uma segunda fase na vida de Robinho pós-condenação. Nos primeiros meses, trocou a vida social de Santos pelo isolamento em Guarujá.

Hoje, o ex-jogador está de volta a Santos. Se antes só ia para a cidade para levar o filho para treinar no clube Portuários, voltou a passar períodos em seu apartamento no canal 6.

Essa volta a Santos forçou Robinho a sair de casa para conseguir manter alguns hobbies. Ao contrário de sua residência em Guarujá, seu apartamento em Santos não possui quadra de futevôlei, o que ajuda a explicar a presença esporádica do ex-jogador em sua antiga rede no canal 3.

"A gente via ele correndo por aqui de manhã. Semana passada, esteve aí e parou para tomar um sorvete", disse um atendente de uma rede de fast-food próxima ao apartamento do ex-jogador.

Já em uma das cafeterias mais tradicionais da cidade, localizada na esquina de seu apartamento, Robinho esteve com amigos. "Semana passada, sentou naquela mesa ali e pediu o de sempre: uma coxinha e um capuccino", contou a garçonete. O combo de Robinho custa R$ 20.

O novo-velho local preferido na Baixada Santista é o CT Rei Pelé. Por méritos próprios, segundo ouviu o UOL, seu filho, Robson Júnior, passou em teste no clube para atuar na categoria sub-15. Robinho encontrou acesso livre ao CT para acompanhar alguns treinamentos do garoto. Fotos em redes sociais registram um encontro com William, ex-jogador campeão brasileiro com o atacante pelo Santos em 2002, e ao lado de um garoto que joga na base santistas.

As portas abertas no Santos não se limitam ao centro de treinamento. O clube, recentemente, disponibilizou seu Memorial de Conquistas para que Robinho gravasse no local uma entrevista ao SBT — nela, falou sobre Rodrygo, do Real Madrid, que jogaria a final da Liga dos Campeões dias depois, e contou sobre a sua própria participação na Champions.

"O Robinho nos procurou perguntando se era possível gravar no Memorial, onde ele é um dos destaques, por seus feitos como atleta do Santos FC, e foi liberado por se tratar de um ídolo esportivo do Clube, um ex-atleta. A mesma medida seria adotada para qualquer ex-atleta do Santos FC que nos solicitasse. Entre os exemplos está do Juary, ex-jogador e ex-funcionário, que solicitou a gravação e prontamente foi liberada", respondeu o Santos quando questionado sobre a entrevista.

A esposa Vivian segue ao lado do ex-jogador, e tem tocado normalmente uma empresa especializada em produzir festas infantis. Dentre os clientes estão filhos de famosos e de ex-jogadores do Santos como Alex, Jobson e Vladimir.

Longe dos holofotes, Robinho passou a frequentar uma igreja evangélica encorajado pelo amigo Adiel Amorim, dono de um bar em Praia Grande. "Quando ele está com os amigos esquece um pouco da situação que está passando porque, graças a Deus, ele e a família também estão buscando mais a igreja. Fico feliz porque sou evangélico e ver meu amigo também na casa do senhor é a melhor coisa", diz Adiel, antes de completar.

"É chata a situação dele, mas ele está sendo forte. Deus tem dado força para ele. Todos que o conhecem nem entram nesse assunto, o que já ajuda muito".

+ sobre Robinho

Mike Hewitt - FIFA/FIFA via Getty Images

Caso Robinho: a longa luta por justiça de uma mulher anônima condena seu estuprador à prisão.

Ler mais
Reprodução/Goo Elétricos

Condenado por estupro, Robinho vai à Justiça para poder andar de patinete nas ruas do litoral.

Ler mais
Reprodução

Como Robinho, existe um torturador uruguaio condenado na Itália vivendo livre no Brasil.

Ler mais
Thomas Santos/AGIF

O que será de Robinho? Ex-atacante vive de renda e não terá problema financeiro pós-futebol.

Ler mais
Topo