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Olhar Olímpico

Grávida, Fabiana vira empresária de atletas e quer ajudar nova geração

Atletas em Movimento: Fabiana, do vôlei - J.R. Duran
Atletas em Movimento: Fabiana, do vôlei Imagem: J.R. Duran

28/12/2020 04h00

Dona de duas medalhas de ouro olímpicas, Fabiana Claudino vai completar 36 anos em janeiro afastada das quadras. Grávida do primeiro filho, um menino, a central ainda não sabe se irá retornar às quadras depois de se tornar mãe. Quer viver um dia de cada vez. Mesmo assim, já começou em uma nova profissão: empresária de atletas.

No vôlei, assim como no futebol, a pessoa responsável intermediar negociações entre clubes e atletas precisa ser licenciada pela federação internacional, no caso a FIVB. Fabiana ainda não tem essa licença, mas já começou a atuar no ramo. Quando ainda era uma jovem promessa do vôlei brasileiro, 18 anos, Fabi foi uma das primeiras atletas a assinar com Ana Flávia Sanglard, jogadora que recém tinha se aposentado e iniciava a carreira como empresária. A central agora replica essa experiência, trabalhando exatamente com Ana Flávia.

"Gosto muito dessa parte de estar próximo dessas meninas mais novas, dessa juventude, e quando recebi esse convite aceitei, porque consigo agregar de outra forma. Na base as meninas se perdem muito, esquecem do fundamental, cuidar do próprio corpo, cuidar do físico, jogar com coração, chegar onde tem que chegar. Meu papel é dividir essa experiência", explica.

"O papel que a gente tenta fazer é mostrar e conversar bastante, mostrando sempre o melhor caminho. Não vai nisso aqui não, que não vai dar certo. Vejo muitos empresários que tentam conquistar o atleta. 'Se fechar comigo eu vou te dar um par de tênis, vou te dar isso daqui'. Sua energia precisa estar dentro da quadra, precisa ser trabalhada dentro da quadra. Aí sim você vai ter resultado lá na frente, não resultado a curto tempo. Meu papel é falar: não vai por esse caminho, tenta ir por esse caminho", continua.

Voz cada vez mais atuante na luta antirracista, Fabiana também trata desse tema com as jovens jogadoras que acompanha. "Isso é uma ideia que a gente sempre troca, porque no esporte a gente sempre tem muito isso, de que não tem esse ato de racismo. Tem sim, e hoje está sendo falado. Hoje a menina já entra num restaurante com mais nome e já olha: não tem mais ninguém negro aqui. Ela começa a entender esse lado racial. É uma troca que a gente sempre tem. Com certeza com as meninas mais novas, eu estando ali, por ser preta, é uma cosia que eu falo para a gente ficar atenta, observa, a gente tem que se colocar, não deve guardar. O atleta foi preparado para isso, não pode se expor, não pode falar, e é o contrário."

Mesmo que ainda volte a jogar, Fabiana não quer se afastar desse trabalho que ela está iniciando. A central diz ter uma preocupação muito grande com as categorias de base que, no entender dela, estão "esquecidas". Os números falam por si: tetracampeão mundial sub-20 entre 2001 e 2007, e sempre no pódio entre 1999 e 2015, o Brasil não chegou nem à semifinal dos últimos dois mundiais dessa categoria. No Mundial Sub-18 já são cinco anos sem final. No último Mundial Sub-23 a equipe ficou num modesto quinto lugar.

"A base começou a pegar muitas meninas que eram momento. Quando eu comecei no vôlei, eu não sabia andar, mas tinha um técnico que tinha uma visão lá na frente. Hoje a gente não tem essa visão. É um erro muito grande. Pegas as jogadoras que são mais baixas, que estão em bom momento, achando que vão ganhar, sem pensar lá na frente. E não tem mais campeonato. Hoje, tirando São Paulo, nos outros estados têm poucos times. Aí chegam no adulto com fundamentos que não sabem fazer porque pularam várias etapas", analisa.

Para Fabiana, Ana Cristina, jovem revelação do Sesc-RJ/Flamengo de 16 anos, será uma das grandes jogadoras do vôlei mundial. Mas isso não significa que o Brasil, de forma geral, esteja bem assistido na base. "A primeira vez que joguei a Superliga, pelo MRV, eu tinha 16 anos. Só que naquele ano era eu, a Sheilla, era uma galera. Hoje em dia a gente só tem uma, a Ana Cristina. Veio uma geração, a nossa, veio Sheilla, Paula Pequeno, Jaque. Depois a Natália, depois a Gabizinha, e agora a Ana Cristina. A gente precisa de mais Anas Cristinas."