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Julio Gomes

OPINIÃO

Texto em que o autor apresenta e defende suas ideias e opiniões, a partir da interpretação de fatos e dados.

Torcida do Liverpool dá exemplo e deveria fazer muita gente passar vergonha

Torcedores do Liverpool prestam homenagem para Cristiano Ronaldo durante jogo contra Manchester United - Phil Noble/Reuters
Torcedores do Liverpool prestam homenagem para Cristiano Ronaldo durante jogo contra Manchester United Imagem: Phil Noble/Reuters

19/04/2022 17h14

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As tragédias dos anos 80 fazem com que até hoje os torcedores do Liverpool sejam chamados de "murderers" (assassinos) nas arquibancadas rivais. Nesta terça, no entanto, o Anfield Road deu um exemplo que deveria ser seguido no mundo todo.

Aos 7min do clássico contra o Manchester United, o maior jogo da Inglaterra, com uma rivalidade que extrapola o futebol e passa pela história das duas cidades, a torcida do Liverpool passou um minuto inteiro aplaudindo.

Para quem eram os aplausos? Para Cristiano Ronaldo, o camisa 7 do adversário, que ontem perdeu um bebê. A mulher do português, a argentina Georgina, deu à luz uma menina, mas tragicamente não foi possível salvar a vida do outro gêmeo. Não há mais detalhes sobre a perda. O fato é que CR7 não foi a campo hoje e a torcida rival se mobilizou para homenageá-lo no momento mais difícil.

Certamente Cristiano Ronaldo irá se emocionar quando vir as imagens, como se emocionaram os que estavam lá no campo e muitos dos milhões que viram o jogo pela TV mundo afora. Não há rivalidade que possa superar a solidariedade, a empatia, a capacidade de compreender a tristeza do outro.

Eu adoraria que o exemplo da torcida do Liverpool servisse para torcidas e pessoas que comandam o futebol brasileiro. Um futebol marcado por picuinhas, pela mediocridade de pensamento.

Nesta quarta, teremos o maior clássico do país (no momento), Flamengo x Palmeiras, disputado com torcida única. Por que? Porque o Flamengo considera que precisa devolver na mesma moeda algo que o Palmeiras fez em 2019. Este é apenas um exemplo. Esse tipo de pequenez acontece toda hora, cada vez protagonizada por um clube diferente. É o padrão, não a exceção.

No último domingo, estive no Canindé para assistir ao título da Série A2 do Paulista da minha Portuguesa, que venceu o São Bento por 2 a 0. Passados o calor do jogo e a cerimônia de premiação do vice-campeão, que também subiu, diga-se, os jogadores do São Bento passaram lentamente a se encaminhar para o vestiário. Deveriam ter ficado para ver a premiação do primeiro colocado. Não ficaram.

Ainda assim, enquanto entravam no vestiário eu e outras dezenas de pessoas resolvemos aplaudi-los. Isso se chama esportividade. O adversário não é inimigo, é só um adversário em busca do mesmo objetivo. Mas outras tantas dezenas de pessoas na torcida da Lusa não paravam de xingá-los. A troco de quê mesmo?

Precisamos avançar muito, mas muito mesmo. A cultura de estádio não precisa estar conectada a ofensas e fúria. Poderia muito bem estar ligada a alegria, emoção, também a frustração e a eventual raiva, claro, mas não ao ódio. Torcedores ingleses já protagonizaram algumas das cenas mais lamentáveis que o futebol mundial já viu. Hoje, em Liverpool, deram um show.