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Allan Simon

OPINIÃO

Texto em que o autor apresenta e defende suas ideias e opiniões, a partir da interpretação de fatos e dados.

Por que a CazéTV é o mais próximo que temos de um "novo Esporte Interativo"

Casimiro Miguel durante transmissão de Brasil x Suíça na Copa do Mundo de 2022 - Reprodução/CazéTV
Casimiro Miguel durante transmissão de Brasil x Suíça na Copa do Mundo de 2022 Imagem: Reprodução/CazéTV

Colunista do UOL

13/02/2023 04h00

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Quando o streamer Casimiro Miguel conquistou o direito de transmitir 22 jogos ao vivo da Copa do Mundo de 2022, no Qatar, ainda pouco se imaginava sobre como aquela conquista mudaria a forma como o influenciador se posiciona no mercado dos esportes. Até então, Casimiro já era um "player" com transmissões importantes no currículo, como jogos do Athletico Paranaense no Brasileirão e partidas do Cariocão 2022, sempre na Twitch.

O acordo entre Fifa e LiveMode, que permitiu a transmissão da Copa, foi o estopim para o lançamento de uma nova marca nesse mercado de direitos esportivos. A parceira de Casimiro criou a CazéTV, um novo canal separado daqueles que já eram utilizados por Casimiro no YouTube para postar cortes de suas lives na Twitch.

Desde então, foram conquistados os direitos do Mundial de Clubes da Fifa, encerrado no último fim de semana no Marrocos, dos jogos de Botafogo e Vasco como mandantes no Cariocão 2023, da participação vascaína no tour da Flórida, exibido em janeiro, e já anunciada a transmissão do Prêmio Fifa The Best, que elege os melhores do mundo no futebol. Tudo isso com exibições gratuitas, ao vivo e com imagens, no YouTube e na Twitch.

Casimiro também fechou parceria com o Canal Olímpico, do COB (Comitê Olímpico do Brasil), para a produção de conteúdos e participação nos Jogos Pan-Americanos de Santiago-2023 e nas Olimpíadas de Paris-2024. O acordo pode viabilizar transmissões de eventos que já são exibidos atualmente pelo canal em plataforma operada pela NSports.

O acordo com o Athletico Paranaense pelos 19 jogos do clube como mandante no Brasileirão foi renovado para 2023. Como os direitos são de pay-per-view, é obrigatório cobrar pelo acesso, sob pena de interferir no contrato que a Globo tem de exclusividade com o Furacão em meios abertos. A solução: cobrar no YouTube o mínimo permitido pela plataforma, R$ 1,99 por mês. Um valor simbólico.

Com tanto acesso a diferentes jogos (e futuramente modalidades também, a partir do acordo com o COB), a CazéTV vai se tornando o mais próximo do que poderíamos considerar como um "novo Esporte Interativo", o canal que revolucionou as transmissões nas duas primeiras décadas deste século e democratizou eventos que antes eram restritos à TV paga. A marca onde o próprio Casimiro Miguel começou sua carreira e ficou conhecido na mídia.

É importante já destacar que não há similaridades quanto ao modelo de negócios. O Esporte Interativo surgiu como um parceiro da RedeTV! em 2004, depois operou suas transmissões em canais como Band, Gazeta, NGT e TV Cultura, até ganhar um canal próprio nas parabólicas. Depois migrou para a TV paga, onde fez história transmitindo a Copa do Nordeste e a Champions League. Na fase gratuita, apostou muito na monetização por meio de quizzes e games cuja participação dos usuários era cobrada por SMS enviado. Quem viveu as primeiras transmissões lembra a quantidade de inserções que os narradores faziam desse tipo de promoção.

A CazéTV vive em outra era. A monetização vem por meio de cotas de publicidade vendidas, assim como qualquer emissora comum (e o próprio Esporte Interativo usou), mas também das propagandas operadas pelas plataformas onde exibe seus conteúdos, YouTube e Twitch. Ainda não há certeza sobre o quanto isso tudo conseguirá pagar as contas do negócio, que envolve direitos de transmissão de eventos muito grandes.

Feitas as ressalvas sobre as diferenças de modelo de negócios, meu ponto principal é com relação ao que a CazéTV proporciona ao consumidor final. Se há quase 20 anos o Esporte Interativo chegou "chutando a porta" na TV aberta e oferecendo NBA e Champions League na RedeTV!, conteúdos que na época já estavam exclusivos da TV paga, agora é o canal de Casimiro que proporciona um Mundial de Clubes inteiro de graça, jogos do Cariocão da mesma forma após décadas de domínio dos meios pagos, e avança no sentido de dar oportunidades e espaços a modalidades que não recebem a devida atenção nos canais tradicionais.

Vale sempre a lembrança de que uma das maiores conquistas da história do esporte brasileiro, o título mundial feminino de handebol, em 2013, foi transmitida com exclusividade pelo Esporte Interativo. Uma modalidade que era menosprezada por outros canais acabou vivendo seu auge no país na tela do canal, que operava nas parabólicas.

Mas não é apenas com relação ao acesso gratuito a eventos antes restritos a meios pagos que a CazéTV lembra o Esporte Interativo. A própria empresa que produz o canal, a LiveMode, pertence aos antigos fundadores do EI, que venderam o canal para a então Turner (hoje WarnerBros Discovery) na década passada. Algumas políticas internas se tornam visíveis para o olhar do espectador mais atento, como o lançamento ou nacionalização de nomes em frente às câmeras.

Assim como um dia o Esporte Interativo mostrou a todo o país quem eram André Henning, Vitor Sérgio Rodrigues, Bruno Formiga, Jorge Iggor, Rafael Oliveira, Monique Danello, Rodrigo Fragoso, entre tantos outros nomes, a CazéTV vai sendo a oportunidade para profissionais aparecerem e serem conhecidos fora de suas regiões ou nichos originais, como os narradores Raony Pacheco, Bruno Cantarelli e Marcelo Ferrantini.

Agora, a CazéTV tem pela frente alguns desafios muito parecidos com aqueles enfrentados pelo Esporte Interativos: o incômodo de quem não gosta da mudança de paradigmas na linguagem das transmissões, e a desconfiança de quem acha que o modelo de negócios não poderá prosperar. As respostas para esses dois casos serão algumas das cenas dos próximos capítulos.