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Queridinho dos cabelos, óleo de patauá ajuda a manter Amazônia de pé no PA

José Maria de Souza Mendonça coa o óleo que é usado em cosméticos e alimentos. - Divulgação/L"Occitane au Brésil
José Maria de Souza Mendonça coa o óleo que é usado em cosméticos e alimentos. Imagem: Divulgação/L'Occitane au Brésil

Giacomo Vicenzo

De Ecoa em São Paulo (SP)

05/01/2023 06h00

Em Anajás, município da Ilha do Marajó (PA), o dia de Enizete dos Santos, 40, começa por volta das 6h da manhã em um trecho de floresta amazônica.

Ela trabalha catando os frutos do patauá, que após fervidos se transformarão no óleo de cor dourada que ganhou fama na área cosmética a partir de 2013, e é natural de uma palmeira do bioma amazônico.

Nos últimos anos, a busca pelo óleo de patauá, que hidrata pele e cabelos, também trouxe benefícios aos extratores, aumentando a renda e melhorando as condições de vida na região.

Mas, por outro lado, trouxe preocupações sobre condições de trabalho melhores e uma cadeia de produção mais sustentável.

Parte desse movimento mais sustentável se consolidou após uma união das marcas que usam o óleo de patauá em seus produtos: L'Occitane au Brésil, Beraca Ingredientes Naturais e Simple Organic, que fizeram uma parceria e reuniram um fundo de mais de R$ 150 mil para a reforma das Casas Óleos — unidades onde os extratores fazem a preparação do óleo, que envolve pilar os frutos e depois fervê-los.

"O óleo do patauá tem diversas funções, pode ser usado na indústria alimentícia substituindo azeite e óleo de cozinha e tem esse grande potencial para indústria de cosméticos", afirma Ana Carolina Vieira, diretora executiva do Instituto Beraca.

Patauá garante renda e ajuda manter filho na escola

Com a reforma desses locais de extração, Enizete Santos mais que dobrou a renda com o trabalho. "Antes o lucro era de R$ 1 mil, agora tenho até R$ 4 mil de lucro ao mês e contratei dois ajudantes, que trabalham coando e pilando o patauá. A fervura sou eu mesma quem faço", conta a extratora.

A renda vinda da atividade faz com que os cinco filhos de Santos, que estudou somente até a quarta série do fundamental, tenham uma oportunidade que ela não teve:

"Se não fosse o dinheiro do patauá, acho que eles [os filhos] nem estariam estudando. Sem esse trabalho e esse óleo, não conseguiria mantê-los na escola, pois eles teriam que estar trabalhando já", comenta.

Além da reforma nas casas, a ação das empresas também levou equipamentos que ajudam no armazenamento e ampliam a capacidade de processar o fruto.

O fruto do patauá é exclusivo do bioma amazônico. - Divulgação/L'Occitane au Brésil - Divulgação/L'Occitane au Brésil
O fruto do patauá é exclusivo do bioma amazônico.
Imagem: Divulgação/L'Occitane au Brésil

"A gente trabalhava na minha casinha e o piso era de madeira e ficava molhado e escorregadio. Agora, com a alvenaria, terminamos de trabalhar e fica tudo enxuto, não nos molhamos quando chove e os materiais como caixas-d'água e bacias deixaram o trabalho mais fácil. Estamos extraindo mais óleo", afirma Enizete.

Mas apesar da melhora, ela reclama que esse é um tipo de serviço bastante cansativo. "Trabalhamos de forma muito braçal, se conseguíssemos uma máquina seria melhor. Batemos com uma madeira dentro dos baldes de patauá até retirar todo o óleo, isso cansa muito. Seria melhor se tivéssemos um maquinário que fizesse isso".

De 'sem valor no mato' a criação de associação

Mas nem sempre foi assim, antes do boom do comércio esse fruto não chamava tanta a atenção para a comercialização.

"Desde 2014 que faço esse trabalho e esse comércio aumentou. Antes, ele nascia e se acabava no mato, ninguém tirava e não fazia nada", conta Enizete.

Antes de o patauá virar "moda", José Maria de Souza Mendonça, fundador e presidente da Associação dos Produtores Rurais do Rio Guajará Natureza é Vida (APRUNAV), começou a abrir caminho para o óleo no mercado contatando empresas que tinham interesse em comprá-lo.

Entre elas, a L'Occitane au Brésil, que agora acompanha as safras e os fornecimentos realizados pela comunidade e apoiou a construção da sede da associação.

"Também ajudamos na aquisição de equipamentos de proteção individual como luvas, capacetes, botas e o acompanhamento técnico constante da cadeia de fornecimento", diz Sérgio Tafner Martins dos Santos, especialista em cadeias de abastecimento da L'Occitane au Brésil.

Óleo é feito com a fervura do fruto que nasce em palmeira. - Divulgação/L'Occitane au Brésil - Divulgação/L'Occitane au Brésil
Óleo é feito com a fervura do fruto que nasce em palmeira.
Imagem: Divulgação/L'Occitane au Brésil

A associação de José Maria compra todo o óleo dos produtores locais e faz o atravessamento aos compradores, além de comprar o patauá de extratores que não têm interesse ou experiência para a fabricação de óleo.

Atuando na região desde 2007, ele enxerga que a chegada do patauá tornou o manejo da natureza mais sustentável.

"A economia do município é açaí e patauá, mas antes, cortavam as palmeiras de açaí para extrair o palmito. Hoje, cortamos apenas a parte alta da palmeira que não está mais dando frutos", diz José Maria.

O fundador da associação também trabalha com a extração de óleo e ganha o valor de R$ 60 por dia para fazer a pesagem e venda do produto para os atravessadores.

"Com a venda do óleo que produzo com meu filho ganhamos em média R$ 2 mil reais por mês", conta.

Patauá só existe mantendo a Amazônia em pé

Para a diretora executiva do instituto Beraca, olhar para a cadeia de valor do patauá é olhar para uma economia florestal de baixo carbono, que mantém a floresta em pé e valoriza o modo tradicional de produção extrativista da amazônia.

"A colheita do fruto acontece no período ideal, existe uma preocupação de manutenção de frutos. Além disso, o cuidado com frutos que podem ser coletados, frutos que devem permanecer no solo da floresta para reprodução da espécie, e frutos que vão servir de alimento para animais silvestres", comenta a diretora.

José Maria de Souza Mendonça coa o óleo que é usado em cosméticos e alimentos. - Divulgação/L'Occitane au Brésil - Divulgação/L'Occitane au Brésil
Extratores conseguem renda de até R$ 4 mil reais por mês com a atividade.
Imagem: Divulgação/L'Occitane au Brésil

Para além do aumento da renda, o patauá também mudou o ramo de diversas famílias da região - que migraram do palmito para a produção de óleo.

"Quando trabalhamos só tirando e não plantando estamos gerando fome. Com o trabalho da extração do óleo de patauá estamos garantindo o futuro das pessoas que ainda estão vindo e temos a certeza de que essa atividade ficará para sempre", acredita o presidente da APRUNAV.